Portas resignado após a batalha de Albuquerque

Paulo Portas desesperou com a polémica da pensão de sobrevivência e quis falar ao país no sábado. Foi convencido a não o fazer. Lutou por uma descida do IVA da restauração e por um Orçamento menos doloroso. Não ganhou o que queria, mas enterrou o machado. “Um défice de 4% é diferente de um défice…

do final da maratona orçamental, ficou a declaração pública de pires de lima, resignado com o iva da restauração nos 23%. “sou um soldado leal e disciplinado”. mas também o protagonismo de joão almeida, porta-voz do cds, na defesa do documento na assembleia. com a coligação “está tudo ok”, garante-se entre os centristas, apesar da desilusão com que o resultado final foi recebido nos bastidores (ver página 8). a diferença é mais significativa se posta em comparação com 2012. era a época da tsu, do grande aumento de impostos, das declarações de joão almeida no facebook, irritado com vítor gaspar. e agora, com maria luís? “foi francamente melhor”, reitera um ministro. claro que há outra diferença: portas é agora vice-pm. e até a troika está a seu cargo.

quinta-feira inconclusiva

mas a batalha foi longa e duríssima no conselho. às nove da manhã dessa quinta-feira, o esboço do orçamento distribuído por todos estava cheio de buracos por preencher. todos os principais problemas ficaram para a última hora – o já habitual método passos de pôr pressão sobre todos.

o primeiro ponto da ordem de trabalhos foi o das tabelas salariais da função pública. maria luís albuquerque levou hélder rosalino, secretário de estado da administração pública para explicar a proposta: um corte de 10% para todos os vencimentos acima dos 600 euros. bastou uma ronda pela mesa para se perceber que jamais haveria consenso. os alertas para a inconstitucionalidade foram vários, do psd ao cds, e fizeram com que rosalino voltasse ao terreiro do paço para testar outra solução.

depois, os dois elefantes na sala: a ameaça do tc sobre algumas medidas – da caixa geral de aposentações à contribuição extraordinária de solidariedade, por exemplo – e os polémicos cortes nas pensões de sobrevivência.

sem um dos constitucionalistas à mesa (marques guedes estava ausente, por razões de saúde), coube a poiares maduro apresentar o primeiro caso. a tese: era preciso limpar algumas possíveis inconstitucionalidades. o problema: isso implicava mais medidas.

na verdade, os problemas seguiam-se em catadupa, porque faltava concretizar os 200 milhões de cortes adicionais nos ministérios, que tinham sido pedidos uma semana antes – deixando quase todos os ministros em desespero. à medida que falavam ministros, desfiavam-se as impossibilidades de cumprir o quadro. maria luís albuquerque, na sua estreia orçamental, punha pressão total. mas isso colocava outro problema ainda. quanto mais medidas fossem precisas, mais difícil seria a discussão do outro elefante na sala: a pretensão do cds_de reduzir o iva_da restauração.

a meio da discussão, a ministra das finanças encostou os centristas à parede com uma sugestão: criar uma taxa sobre as entradas de turistas (por avião). a pasta é de pires de lima e o secretário de estado é adolfo mesquita nunes, do cds, que não a aceitaria nunca. o turismo, aliás, é das poucas boas notícias que o governo tem para dar. a medida não passou.

por esta altura, quando o cansaço começou a aparecer e a discussão se complicou, passos coelho já tinha saído para a reunião com o presidente. o conselho, porém, continuou até atingir o pico de tensão, com maria luís albuquerque a replicar a cada passo. até que portas pôs fim à conversa. a reunião estava num impasse em matérias decisivas e caberia aos líderes da coligação decidir o que fazer. sem passos na sala, o melhor seria continuar os trabalhos depois, se necessário no sábado.

foi neste ambiente que a reunião foi suspensa. deixando os ministérios em polvorosa nos dias seguintes. havia ordens para testar outra proposta para as tabelas de remuneração, também para procurar todas as soluções alternativas possíveis. a parte do orçamento sobre questões fiscais foi enviada pela equipa das finanças a todos os ministérios às quatro e meia da madrugada de sábado.

17 horas, outra vez

no domingo começou tudo de novo. maria luís albuquerque tinha voltado de washington (da reunião anual do fmi) durante a noite, dormindo no avião. no dia seguinte teria novo teste no eurogrupo e tinha a missão de mostrar firmeza. em lisboa resistiu a várias soluções, até à de paulo macedo de, secundando paula teixeira da cruz, aumentar a contribuição especial sobre a banca – uma discussão que foi dura e testou ao limite a autoridade da mulher que substituiu vítor gaspar nas finanças. macedo, que na última avaliação da troika ficou tranquilo sobre as suas metas, foi obrigado a um corte de 259 milhões – mais do que o ministério estava a contar fazer em dois anos.

mas, passo a passo, maria luís albuquerque foi incorporando alterações: os cortes ficaram progressivos; a ces com várias excepções; a banca acabou a pagar um pouco mais; as receitas por subidas de impostos vários (tabaco, álcool e gasóleo) chegaram aos mil milhões; a taxa sobre o turismo não avançou. adoptou a sugestão de pires de lima de cortar mais 100 milhões das ppp do sector da economia.

mas houve linhas vermelhas que passos e a ministra das finanças não deixaram passar. o iva da restauração ficou como está, apesar das longas horas de discussão; o subsídio de natal volta a ser pago em duodécimos – para disfarçar uma redução abrupta do rendimento disponível de funcionários e reformados do estado. e o objectivo, claro, de 4% de défice, que levou no avião para bruxelas às seis da manhã de segunda-feira, três horas depois de a reunião acabar na pcm. para trás, deixou em vários colegas a impressão de ser mais inflexível que o antecessor.

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