Governo contesta providência cautelar contra ‘aplicação’ do Acordo Ortográfico

O Governo contestou a providência cautelar que solicita a suspensão da aplicação obrigatória do Acordo Ortográfico de 1990 aos exames do 6.º ano, numa resolução fundamentada, assinada pelo primeiro-ministro, enviada segunda-feira ao Supremo Tribunal Administrativo.

Governo contesta providência cautelar contra ‘aplicação’ do Acordo Ortográfico

"Entende o Governo que o deferimento da 'aplicação’ das regras ortográficas convencionadas no Acordo Ortográfico de 1990, aos exames nacionais do 6.º ano (…), causa graves prejuízos para o interesse público", lê-se no despacho assinado por Pedro Passos Coelho.

A providência cautelar que pede a suspensão de eficácia da aplicação obrigatória do Acordo Ortográfico de 1990 aos exames do 6.º ano foi intentada por Manuel Alegre, Miguel Sousa Tavares e mais quatro dezenas de pessoas e entregue no Supremo Tribunal Administrativo no início de Maio.

Ivo Miguel Barroso, docente da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, e autor dos pareceres sobre a mesma, disse à Agência Lusa que, ao invocar o interesse público, o Governo inviabiliza a iniciativa.

"Com isso, o Governo inviabiliza a providência cautelar, pois, caso o Governo não se opusesse, a providência cautelar seria automática", sublinhou Ivo Miguel Barroso.

O docente refutou os alegados "prejuízos para o interesse público", considerando que "o argumento manifestamente improcede, pois o pedido é para serem aceites as duas grafias: a do Acordo Ortográfico de 1990 e a ortografia pré-Acordo Ortográfico de 1990, com as quais os alunos contactam, dentro e fora da escola, uma vez que estamos no prazo de transição".

"Trata-se, pois, de uma situação idêntica àquela que acontece em todos os restantes exames, internos e externos, até ao momento: aceitação da ortografia do Português europeu e do Acordo Ortográfico de 1990", acrescenta.

Por outro lado, observou, "o Acordo Ortográfico de 1990 está tecnicamente mal feito; a execução da reforma por parte do Estado é ainda pior, pois o conversor Lince e o Vocabulário Ortográfico do Português violam o próprio Tratado do Acordo Ortográfico de 1990 e nem sequer há real unificação ao nível da ortografia".

"Muitas vezes — prosseguiu -, sucede o contrário: por exemplo, 'receção' é uma palavra inventada, que não existe nem no Brasil nem existia em Portugal".

O Supremo Tribunal Administrativo deverá pronunciar-se nos próximos dias se realiza ou não uma audiência antes de tomar uma decisão.

"O Governo está politicamente comprometido com o Acordo Ortográfico de 1990 e com a tomada de posição do Governo anterior, à qual deu seguimento, que antecipou o final do prazo de transição em cinco anos no sistema de ensino; isto enquanto, nos restantes Estados, o Acordo Ortográfico de 1990 não está em fase adiantada de ?aplicação'", observou Ivo Miguel Barroso.

Lusa/SOL