Há uma aparente falta de interesse nas europeias. Como é que se convencem os portugueses a ir votar?
Não tenho sentido falta de interesse nos assuntos europeus. Em sessões de esclarecimento em que tenho estado nunca tive, comparando com campanhas anteriores e em particular com a de 2009, tantas perguntas, tão pertinentes e tão substantivas sobre a Europa. Mas há uma faixa de abstenção que é quase estrutural, que tem que ver com uma certa desmobilização política.
Em geral em relação à política?
Em geral. Há um certo desencanto sobre o aspecto mais partidário da política.
As arruadas têm mostrado ruas vazias. Nas sessões de esclarecimento quem lá está já está à partida interessado nos temas…
Mas eu digo em geral. As pessoas hoje estão muito mais a par dos assuntos europeus do que estavam há cinco anos. E isso também não é estranho porque nestes cinco anos também se falou muito mais sobre a Europa, nomeadamente por causa da crise e da intervenção da troika.
Nas últimas europeias, a abstenção foi de 64%. Está à espera de um valor em linha com estes números?
Penso que sim. Até pelo retrato que nós já temos do terreno, penso que isso acontecerá.
A Europa teve no caso de Portugal o papel que se esperava na crise?
Eu acho que a Europa, quando a crise surgiu em 2009/2010, não tinha instituições preparadas para responder. E por isso é que a solução foi uma solução um pouco difícil, que foi a solução das troikas. Nestes anos que se seguiram, nós construímos um esquema de resposta às crises e um esquema muito robusto.
Se se repetisse o que aconteceu em Portugal, seria diferente?
A capacidade de resposta europeia não tem qualquer comparação com a que existia.
Como vê o trabalho de Durão Barroso na Comissão Europeia?
Vejo como um trabalho francamente bom e positivo.
Portugal ganhou por ter um português à frente da Comissão?
Portugal ganha sempre, evidentemente. Claro que não é um ganho directo, no sentido em que o presidente da Comissão é neutral. Mas há dois ou três exemplos interessantes. Por exemplo, todos os comissários tinham um assessor português. Dou outro exemplo: os embaixadores da União Europeia nos Estados Unidos, no Brasil e na Índia são portugueses. Isto nunca aconteceria se o presidente da Comissão Europeia não fosse português.
Durão Barroso seria um bom candidato a Presidente da República?
Tem todas as condições para o ser. Mas como ele já disse que não queria ser, é uma questão que não se levanta.
Esta campanha tem sido mais contaminada por questões nacionais do que gostaria?
Eu sempre disse, já tinha dito em 2009 e hoje isso ainda é mais verdadeiro, que não é fácil separar os assuntos europeus dos nacionais. Falamos sobre o resgate e sobre as responsabilidades de quem criou a bancarrota e há uma conexão natural entre assuntos europeus e nacionais. O que acho é que a campanha tem estado contaminada por pequenos casos como a reunião do BCE ou a do Conselho de Ministros. Trata-se de uma estratégia de distracção, que especialmente o PS está muito interessado em alimentar.
Tem sido muito confrontado com as políticas deste Governo na rua?
Temos feito alguma pedagogia, sem dúvida. O acolhimento em geral é positivo, é bastante cordial. Apesar de haver uma rarefacção de pessoas na rua, quando se está com as pessoas há um acolhimento cordial. Há pessoas que aplaudem muito o esforço que foi feito e, embora dizendo que tiveram de fazer sacrifícios, compreendem. Há outras que querem perceber melhor quais são os sacrifícios e outras que dizem que são contra. Temos encontrado um pouco de tudo.
Não sente as pessoas zangadas?
A atitude face às medidas difíceis varia. Nenhuma pessoa está contente, mas umas acham que eram necessárias, outras acham que talvez não devessem ter sido tão duras. Há um pouco de tudo.
Dá para tomar o pulso ao que vai acontecer nestas eleições?
A nossa expectativa é ganhar as eleições. É ganhar por um voto. Achamos que isso é alcançável porque confiamos no bom senso dos portugueses. Tenho ouvido muita gente a dizer que compreende aquilo que aconteceu a Portugal e o esforço que está a ser feito. Acho que essa pode perfeitamente ser a posição vencedora.
A saída limpa veio ajudar?
A saída limpa é positiva.
Isso vai influenciar o voto?
As pessoas entendem a saída limpa como uma coisa positiva. Isso não quer dizer que algumas delas não sintam que houve de facto dificuldades para chegar a este ponto. Esse balanço só elas é que o vão fazer.
Devem ser retiradas conclusões destas eleições sobre a coligação?
Não. Sinceramente. Não há que tirar nenhuma ilação política directa destas eleições para a governabilidade do país.
Mas pode ajudar a aferir se vale a pena PSD e CDS irem juntos a votos nas legislativas?
Isso não vai ser uma questão decisiva aqui. Não sei se haverá coligação de futuro ou não em termos pré-eleitorais.
Acha que ainda é cedo?
É. A coligação europeia era natural, porque não só estamos em coligação no país como pertencemos ao mesmo grupo político no Parlamento Europeu.
Nada garante que haja coligação nas legislativas?
Isso é uma coisa que só pode ser aferida mais tarde. Eu não tenho nada contra. Também não tenho nada a favor à partida. É preciso estar a uns meses antes das eleições pensar o que será melhor.
Nas últimas europeias, ganhou quase contra todas as expectativas. Agora, seja qual for o resultado, quem será o responsável?
Com certeza que quem é candidato tem sempre responsabilidades grandes. Sem dúvida.
O que é que o separa de Assis?
O facto de o PS não ter uma agenda europeia. O PS está a encarar estas eleições como uma espécie de pré-legislativas. Não existe qualquer ideia para o crescimento e para o emprego na Europa e nós consideramos que isso é decisivo para Portugal alavancar o seu crescimento nos próximos anos.
O PS tem dado essencialmente duas ideias: a mutualização da dívida e a criação de um subsídio de desemprego europeu. São propostas que não fazem sentido?
As duas únicas ideias europeias que até agora trouxeram não são viáveis. Em primeiro lugar, a mutualização da dívida, que o próprio candidato do PS à Comissão Europeia, Martin Schulz, veio dizer que está totalmente fora da agenda. E no caso do subsídio de desemprego europeu, não só Schulz até puxou as orelhas a Seguro, dizendo que não se deviam fazer propostas que não se podiam cumprir, como o próprio Francisco Assis desistiu da ideia e ela acabou por ser corrida do manifesto socialista. O PS não tem uma agenda europeia, como aliás se compreende, porque está isolado no plano europeu.
O PS está sozinho na Europa?
O que nós verificamos é que Holande, que era o grande aliado, hoje já ninguém fala dele. Querem esconder o Holande. O ministro das Finanças holandês é socialista e presidente do Eurogrupo, a ministra das Finanças holandesa é líder dos socialistas finlandeses, o chanceler austríaco é socialista e o vice-chanceler alemão, que é socialista, estão todos contra a mutualização da dívida. O PS está totalmente isolado.
Não aceita ver nestas eleições uma primeira volta das legislativas?
Não. Estas eleições terão sempre uma leitura política, delas não se retiram é consequências directas.
Está a falar da antecipação das legislativas?
Dizer que o Governo perdeu ou que o Governo ganhou não é o que está em discussão.
O Governo não perderá nem ganhará consoante o resultado?
Não. Não há uma leitura directa. Depois, há uma análise política, que cada partido fará e retirará as suas consequências e definirá a sua estratégia em função disso. Se houver consequências desse tipo, mais depressa elas serão no PS do que na maioria.
Porquê?
Porque o PS é que está a encarar isto como um teste à sua liderança.
Depois das eleições, faz sentido uma remodelação?
Penso que não. As remodelações são uma competência exclusiva do primeiro-ministro, nunca ninguém me ouviu falar sobre isso. Não há nenhuma ligação directa entre as eleições europeias e a governabilidade.
Entrevista publicada na edição em papel de 16 de Maio