Notícia de última hora: Passos Coelho quer começar a governar

1.    No início da presente semana, Passos Coelho revelou aos portugueses algo deveras surpreendente: a reforma do Estado, finalmente, vai começar a ser implementada. O Primeiro-Ministro conta executar, muito brevemente, um plano de redução da despesa do Estado, mudando de paradigma no que respeita à separação entre o que é público e o que é…

2.    Dito isto, o que não deixa de impressionar é que, no fundo, Passos Coelho vem assumir que agora é pretende começar a governar o país. Sim, porque declarar que agora é que vai pensar e executar um plano para reformar o Estado – é o mesmo que dizer que, a partir de agora, é que vai começar a fazer aquilo para que foi eleito. Ora, tal deixa-nos perplexos e altamente preocupados: primeiro, porque Passos Coelho vem confessar que esteve três anos a fazer rigorosamente nada, literalmente a “apanhar bonés”; segundo, porque Passos Coelho vem dar razão aos mais cépticos: de facto, o Primeiro-Ministro confessou que Portugal perdeu quatro anos para fazer as reformas que são inevitáveis. Foi tempo perdido! Dir-se-á que Portugal, aplicando o programa da troika, recuperou a sua credibilidade internacional e a estabilidade financeira: mas, se tal basta para governar Portugal, então, e vez de um Governo e de uma maioria eleita, bastaria ter um funcionário do Ministério das Finanças ou um administrador da troika para gerir o país durante três anos e, depois, logo se resolveria a questão! Governar é mais (muito mais) do que aplicar um programa concebido por uma organização internacional ! 

3.    Por outro lado, foi tempo perdido. Porquê? Porque, neste momento, é uma impossibilidade política lógica aplicar um programa de reforma do Estado. Por três razões essenciais: 

1)    Passos Coelho sabe que estamos a um das eleições legislativas. A partir de Fevereiro/Março, estaremos em período de pré-campanha eleitoral, com o PS a aumentar o tom e a violência contra o Governo – e o PSD em período de balanço do que fez (e a falar da herança socrática) e a não querer saber do futuro. Ora, a reforma do Estado – para ser minimamente sustentável, equilibrada e viável – implica reflexão, diálogo, ponderação, execução rigorosa e avaliação. Precisa de tempo. Tempo que Passos Coelho não tem: não se faz uma reforma do Estado em  ou seis meses; 

2)    Passos Coelho sabe que é impossível chegar a um entendimento sólido com Paulo Portas sobre a reforma do Estado. Todos nos lembramos da rábulo do guião da reforma do Estado protagonizada por Paulo Portas e Passos Coelho: um cardápio de dezenas de ideias feitas, juntas sem coerência, soltas, demorou um ano a ser apresentado (foi sendo sucessivamente adiado o seu anúncio!). Num momento em que Passos Coelho e Portas estão a negociar o acordo de coligação – com enormes dificuldades -, alguém acredita que Passos vai criar um novo sarilho com o líder do CDS, a meses de começar a pré-campanha eleitoral?

3)    Por último, Passos Coelho sabe que a reforma de sectores chave depende ou poderão implicar uma concertação prévia com o PS. O qual, pelo menos até às legislativas, é impossível. E o curioso é que o próprio Passos Coelho já admitiu a sua incapacidade de aplicar medidas estruturais até ao fim desta legislatura: recorde-se que Passos afirmou no Pontal que não apresentará qualquer reforma da segurança social até às eleições – e convidou o PS para uma reforma deste sector essencial da nossa vida colectiva. Então, uma reforma da segurança social é impossível – mas já será possível uma reforma da Educação ou Saúde? Porquê? Claro que não. Passos Coelho sabe que muito pouco fará até 2015.

Em suma, a resolução interior de Passos Coelho de que quer mesmo governar Portugal é uma excelente notícia. Mas surge tarde. Demasiado tarde. Três anos mais tarde. Infelizmente para Portugal. 

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