Debate PS: as dores de Costa, o derrotado!

Realizou-se ontem o primeiro debate dos candidatos às primárias socialistas. Este era um debate com um vencedor antecipado: em tese, António Costa reunia todas as condições para dar a machadada final em António José Seguro, depois de ter alcançado nas eleições para as estruturas locais do partido um resultado mais favorável do que o próprio…

Pois bem, iremos dividir a nossa análise do debate na apreciação da forma, da estratégia de cada candidato e, finalmente, na substância dos respectivos discursos. Comecemos então pela forma.

Forma:

Neste ponto, António José Seguro esteve melhor. Como já escrevemos, António Costa é mais telegénico e evidencia uma naturalidade e uma espontaneidade claramente superiores a Seguro – o actual líder do PS não é telegénico, ainda não conseguiu adoptar uma postura televisiva aceitável, parecendo demasiado esfíngico e de plástico. Seguro dá a sensação de ser uma daquelas figuras televisivas que treina o discurso durante longos minutos ao espelho antes de entrar no ar – e que depois, em plena transmissão do debate, não consegue sair de um “colete de forças”, estando em permanente (e penosa) aflição. Contudo, António Costa adoptou ontem uma postura letárgica, parada, nunca activa –sempre reactiva. Até no minuto final, António Costa – que deveria falar para os portugueses assertivamente, salvando a sua prestação no debate – engasgou-se, debitando uma série de palavras de forma mortiça. Costa parecia a senhora D.ª Olinda que faz o anúncio do “Viva Melhor!” (salvo a publicidade) ou o senhor do  “Euro Cash”, que proferem para a câmara um discurso memorizado, sem expressividade, de forma completamente amadora. O que aconteceu a Costa? Ao homem que todas as semanas está na “Quadratura do Círculo”? Outro pormenor: António Costa chegou à TVI pouco depois da abertura do “Jornal das 8” com a ulher e a filha. Ora, esta ideia de levar a família para um debate de primárias de partido é uma originalidade incompreensível! Os políticos fazem-se acompanhar da família quando são eleitos Primeiro-Ministro ou Presidente da República – ou quando estão a disputar eleições nacionais. Agora, família num debate partidário, com o assessor de António Costa a aparecer poucos minutos depois no corredor da TVI, dando “aquele abraço” a Costa – parece tudo muito ridículo. Objectivo: desvalorizar António José Seguro, dando um ar de Primeiro-Ministro – um ar de poder – a António Costa. É uma atitude arrogante de quem acha que tem a vitória nas primárias garantida! Arrogância, aliás, que pautou o desempenho costista no debate. Seguro, por seu lado, dentro da ssuas limitações, deu ar de mais empenho, mais vontade de vitória, mais convicção e agressividade. E muito certeiro nos seus retoques às afirmações de Costa. Vitória, portanto, de António José Seguro neste parâmetro avaliativo.

Estratégia dos candidatos:

No que respeita à estratégia, temos que  António Costa preferiu uma atitude passiva, de contenção, dando a iniciativa a António José Seguro – aguardando pelos erros e contradições do discurso do líder socialista. Por outro lado, Costa quis deliberadamente falar pouco. Porquê? Por uma razão muito simples: António Costa não tem discurso. É que, se repararmos bem, António Costa não pode (e não quer) falar muito da crise interna, das divisões internas do partido, porque está convencido de que irá vencer – e já pensa no dia seguinte da sua eleição, começando a sarar as feridas abertas pela luta fratricida que o PS vive. Quanto mais falar, mais difícil torna a reconciliação dos militantes socialistas dos dois lados. Já para não dizer que quanto mais António Costa falar da questão interna do PS, mais oportunidades dá a Seguro para se vitimizar. Por outra banda, Costa não queria falar do país: Costa ainda não faz ideia do que irá propor aos eleitores portugueses – e aquelas que já sabe, aproximam-se perigosamente das de Passos Coelho.  António José Seguro, por sua banda, jogou tudo no debate: um discurso assertivo, truculento em alguns momentos, pregando a moral e a sua doutrina a um António Costa que ouvia atentamente, com um rosto de consciência pesada (fazia lembrar um menino de 10 anos que sabe que fez uma diatribe – e ouve atentamente a repreensão da mãe). Em síntese: António Costa jogou para empatar o jogo – enquanto António José Seguro jogou para ganhar.

Análise de conteúdo

5.Passemos, finalmente, à análise do conteúdo do discurso dos dois contendores. António Costa, aqui, ainda conseguiu estar pior do que na forma ou na estratégia – foi um desastre. Costa não disse rigorosamente nada: limitou-se a repetir à exaustão a sua interpretação sobre as eleições europeias. E a sua visão insólita, para não dizer ridícula, de que um candidato a candidato a Primeiro-Ministro não tem de apresentar ideias sobre o futuro de Portugal – basta apresenta-las uns meses antes das eleições legislativas. Então, os simpatizantes do PS que votam em Costa, votam baseados em quê? Com que motivações? Pelos “lindos olhos” de Costa? Pelos seus óculos – que, aliás, são da mesma marca e têm a mesma armação dos de António José Seguro, segundo a SÁBADO? Ademais, António Costa faltou à verdade por duas vezes: a) quando afirmou que sempre manteve um distanciamento crítico face à governação de José Sócrates: ora,  Costa foi o n.º 2 de Sócrates no partido e, no primeiro mandato, nunca criticou os desvarios socráticos (pelo contrário, estimulou-os) – e no segundo Governo de Sócrates, Costa criticou Teixeira dos Santos, apoiando Sócrates; b) Seguro pôs a nu a duplicidade, os ziguezagues de António Costa: então, o homem conseguiu ter duas posições diferentes sobre o sentido de voto do partido sobre o Orçamento de Estado para 2012? E, pelo ar aflitivo de Costa, é mesmo verdade esta oscilação permanente e preocupante. Mas, admitindo que Costa não tem, nem teve, uma “vida dupla”, alguém compra a tese que este pretende vender, segundo a qual o grande erro estratégico de Seguro foi não ter votado contra o Orçamento em 2011? Então, Costa não gostou de uma decisão do líder do PS em 2011 – e só em 2014 é que se lembrou que isso foi tão grave que justifica avançar para a liderança do partido? António Costa deve achar que os portugueses são ingénuos: está enganado. Já António José Seguro, avançou uma série de propostas para Portugal,  sem novidades – pecando todas pelo seu irrealismo. Refira-se, ainda, que Seguro prometeu que, caso chegue a Primeiro-Ministro, se tiver de subir impostos, demite-se. Ora, esta afirmação indicia que Seguro sente que a sua derrota é cada vez mais uma realidade consumada: há, pois, que jogar todos os seus trunfos, aumentando a “parada”. Grande derrotado do debate: Portugal. A nossa Pátria merecia uma oposição melhor. Muito melhor. E a prova de que o debate foi muito fraco é que Judite Sousa entalou os dois candidatos por mais de uma vez…

Notas do debate:

António Costa – Uma desilusão. Esperemos que tenha tomado muitos chás de tília para o debate de hoje na SIC. Senão…Nota: 8 valores

António José Seguro: Esteve acima das expectativas mais positivas. Nota: 11 valores

Judite de Sousa: felizmente, apareceu em grande forma. Melhor do que Seguro e António Costa. Nota: 14 valores.