Terrorismo em África – o Boko Haram

As atenções da luta antiterrorista estão hoje concentradas no fenómeno do Estado Islâmico, no Médio Oriente. A organização sunita radical conseguiu, em poucos meses, sair da relativa obscuridade, vencer com aparente facilidade as forças do Exército iraquiano regular e dos curdos e ocupar e aterrorizar um considerável número de quilómetros quadrados e de pessoas.

Esta característica de supraterritorialidade do movimento islâmico passou a ser, também, propriedade de outros movimentos: em África, o famoso grupo Boko Haram, originário da Nigéria, actua também nos Camarões, no Níger e no Chade; o al-Shabaab, nascido na Somália, tem-se estendido ao Quénia e ao Uganda; e na longa região que separa a África do Norte da África Subsaariana, no Sul da Líbia e Norte do Chade, do Níger e do Mali, operam grupos armados de diversas obediências e facções.

O Boko Haram é um dos casos mais impressionantes destas redes terroristas. O seu inspirador, Mohammed Marwa (nascido em 1927), adoptou uma linha de fundamentalismo radical: para ele, a única leitura permitida a um bom muçulmano era o Alcorão; nem sequer os comentários do Livro Sagrado, os Hadith, deviam ser permitidos.

Marwa, que pelo seu fanatismo recebeu o cognome de Maitatsine, 'o Amaldiçoador', lançou-se numa violenta campanha antigovernamental, na cidade e estado de Kano. Em 1980, perante a insurreição dos seus partidários, o Governo de Lagos actuou em força. Destes combates resultaram cerca de 10 mil mortos, entre os quais o próprio Maitatsine. 

A Nigéria tem um grave problema étnico-religioso: o Norte é predominantemente muçulmano, habitado pelas etnias hausa e fulani; enquanto no Sul vivem os ibo e yoruba, cristãos. A guerra civil pela cisão do Biafra foi a mais grave consequência dessa diferença e durou três anos, entre 1967 e 1970. A paz conseguiu-se, mas a partir do novo século, já no período pós-ditadura, verificou-se um movimento de 'purificação', defendendo a implantação da sharia (lei islâmica) nos estados do Norte.

Em 2002, em Borno, um grupo de religiosos islâmicos, liderados por Mohamed Yusuf, um fundamentalista próximo dos ensinamentos dos wahabitas, fundou o Boko Haram (um nome que traduz o horror ao Ocidente e a tudo o que é não islâmico). De início era não violento, mas os seus membros passaram à desobediência civil em 2009, com recontros com a polícia que causaram centenas de mortos. Yusuf foi depois preso e liquidado pela polícia.

O sucessor de Yusuf, Abubakar Shekau, juntou-se à al-Qaeda e iniciou uma estratégia de terror, emboscando e decapitando camionistas nas estradas do Norte, roubando bancos e depósitos de armas, e mesmo atacando navios nas zonas costeiras. O rapto de mais de duas centenas de raparigas foi a última das suas malfeitorias e aquela que chamou a atenção do mundo para este perigoso movimento que, entretanto, parece estar para ficar.