António Costa virou à esquerda no Congresso. E três dias depois recuou na «esquerdização». Na terça-feira lembrou o Bloco Central, mas no dia a seguir advertiu que «não estava a pensar em 2015». António Costa não quer fechar portas, nem à esquerda, nem à direita, precavendo-se caso não consiga maioria absoluta.
Sérgio Sousa Pinto, membro do Secretariado do PS e considerado da ala mais à esquerda, não exclui uma aliança à direita, mas com condições. «O PS nunca poderá ter um acordo com a direita que representa estas políticas. Se for outra é diferente. Mas não haverá entendimentos com a direita que representa a continuação da política dos últimos três anos. Seria frustrar as aspirações dos eleitores», explica ao SOL.
No jantar de Natal do grupo parlamentar socialista, Costa lembrou o Bloco Central, e elogiou a liderança de Mário Soares, para defender um projecto que devolva a confiança aos portugueses. No dia seguinte, após algumas notícias terem questionado se este seria um sinal para 2015, Costa sentiu a necessidade de precisar que não recuperou a «fórmula política do Bloco Central, muito menos a pensar em 2015».
Apesar de Sérgio Sousa Pinto não excluir o cenário de Bloco Central, com ressalvas, o líder parlamentar do PS, Ferro Rodrigues, coloca travões. «Só anos mais tarde se veio a perceber a função importante do Bloco Central. Os custos foram a quase implosão do PS e do PSD e o surgimento do PRD e Cavaco Silva», afirma ao SOL.
‘Ninguém lhe marca o rumo’
Um socialista próximo de António Costa explica que «ninguém marca o rumo ao secretário-geral» alegando que estas aparentes oscilações de rumo não são mais que mostrar isso mesmo ao partido. «Há um rumo que é estar sempre no sítio oposto àquele que as pessoas pensam», diz a mesma fonte. Ou seja, se os jovens turcos falam mais à esquerda, Costa vai posicionar-se mais ao centro, e se figuras como Francisco Assis puxarem pelo centro, então o secretário-geral apelará à esquerda. «E vai ser assim no governo», adverte.
No Congresso, há três semanas, Costa recusou os partidos da direita, referindo que não era um «problema de nomes» de ser «Pedro [Passos Coelho] ou ser Rui [Rio]».
Francisco Assis, a face mais visível da defesa do Bloco Central, bateu com a porta e criticou a «esquerdização» de alguns discursos, nomeadamente de Ferro Rodrigues que, juntamente com Manuel Alegre, puxaram pela esquerda e tiveram maior destaque.
Três dias depois, tal como o SOL noticiou, Costa recusava, numa declaração citada por Porfírio Silva, membro do Secretariado, no Facebook, que tivesse feito um discurso «esquerdista», mas sim «humanista». Vários dirigentes do PS alinharam na estratégia.
Esta terça-feira à noite, Costa lembrou os tempos difíceis vividos no Bloco Central, ultrapassados graças à liderança de Soares, depois de definir o rumo de «confiança» para 2015. Houve quem não achasse inocente que Costa, num discurso de cinco minutos e depois da viragem à esquerda no Congresso, se tenha referido ao Bloco Central. Mas na manhã seguinte, Costa emendou a mão e à tarde, após a reunião com Cavaco Silva, precisou que o próximo Governo deve ser «uma escolha directa dos portugueses» e não resultar de um «jogo partidário». Uma maioria absoluta.
Mas se o PS não conseguir esse objectivo, Costa não pode, para já, fechar portas. Até porque, PCP e BE não se mostram disponíveis. «Seria desejável à esquerda mas infelizmente sabemos que os partidos têm uma cultura de subpoder e não querem acordos com o PS», lamenta Sérgio Sousa Pinto. E ainda é cedo para medir o pulso à força do Livre e outras plataformas emergentes.
sonia.cerdeira@sol.pt com Manuel A. Magalhães