“O modelo está esgotado”, admite Luís Montenegro, explicando que o facto de ser só o primeiro-ministro a responder faz com que os temas não mudem muito de debate para debate. “Acaba por se ir dar sempre à questão da dívida. O que muda são as expressões que se usam. Mais mexilhão, menos lagosta”, ironiza o líder da bancada do PSD, que admite que o modelo espanhol teria melhores resultados. “Em Espanha, há perguntas semanais ao Governo, mas aos ministros”. As questões são entregues previamente aos membros do executivo e “os debates acabam por ser sectoriais”.
António Costa foi o primeiro a criticar o modelo de interpelação ao primeiro-ministro. Em 2013, o actual líder do PS dizia que é uma das “ideias mais estúpidas de que há memória”.
Hoje, o vice-presidente da bancada Vieira da Silva admite ao SOL que se possa alterar o modelo no futuro. “Teria mais interesse se os debates com o Governo fossem centrados em políticas concretas”, comenta o socialista que vê virtudes e defeitos no modelo. “É melhor haver debates que não haver”, refere, lembrando os anos 80 e 90, quando o Governo praticamente só ia ao Parlamento para discutir o Orçamento do Estado ou no Debate sobre o Estado da Nação.
Ferro 'confortável'
A solução para Vieira da Silva seria dar mais tempo a debates sectoriais, uma vez que estes são marcados apenas por iniciativa dos grupos parlamentares. O vice da bancada do PS admite que uma revisão do regimento da Assembleia da República possa introduzir alterações. Mas não antes das legislativas.
O vice-presidente da Assembleia Miranda Calha tem mais pressa. “Eu, se pudesse, abolia isto imediatamente”, disse ao Observador. À semelhança do Presidente da República, também o socialista nota que estes debates contribuem para a crispação. “Mais parece um duelo ao pôr-do-sol, daqueles que se vê nos filmes de cowboys”.
Apesar destas críticas, o líder parlamentar socialista, Ferro Rodrigues, não tem objecções. “Estou confortável com este formato”, diz ao SOL.
Mais à esquerda, o PCP gostava de mexer no modelo. “Em 2007, o que apresentámos foi uma proposta de alteração do regime do debate mensal, acabando com a intervenção inicial do primeiro-ministro e procurando transformar o debate numa sessão de perguntas”, recorda João Oliveira.
O líder da bancada comunista acredita que estes debates “são um instrumento indispensável para a fiscalização da actuação do Governo”, mas defende que a forma como estão desenhados não é a melhor. Ao arrancar com uma intervenção do primeiro-ministro o debate acaba por ser “mais um confronto com a propaganda do Governo do que um acção de fiscalização da actividade do Governo”, afirma o líder parlamentar do PCP, que se diz disponível para voltar a debater as regras dos debates.
Pedro Filipe Soares concorda com a necessidade de mudar a organização das intervenções. “Temos preferência pelo modelo em que são os partidos a interpelar inicialmente o Governo, no lugar da exposição do Governo. Mas não me choca que haja esta alternância sobre quem abre o debate”, diz o líder da bancada do BE, que não vê, contudo, necessidade de mudar a periodicidade dos debates.
CDS não reclama mudanças
O líder parlamentar do CDS também não vê vantagem em alterar o actual modelo. Nuno Magalhães reconhece que “há uma crispação excessiva” na linguagem. “Eu ainda sou do tempo em que o presidente Almeida Santos não admitia que se usasse a palavra 'mentira' no hemiciclo. Os deputados só podiam dizer 'isso não corresponde à verdade' ou 'isso é uma inverdade'“, lembra o centrista.
Apesar de a ideia dos debates quinzenais ter surgido num grupo de trabalho liderado por António José Seguro, em 2007, Magalhães reclama louros para Paulo Portas. O centrista lembra que foi o actual número dois do Governo quem, como deputado, lançou o desafio a Sócrates para, “em nome da democracia”, ir mais vezes ao Parlamento e não apenas a um debate mensal, como sucedia na altura.
*com Sónia Cerdeira, Ricardo Rego e Sofia Rainho