Estratégia eleitoral ou líder errático?

António Costa tem repetido que a meta é a maioria absoluta e para isso precisa de seduzir o eleitorado do centro à esquerda. Se há discursos em que a viragem à esquerda é mais clara, logo a seguir o líder do PS modera o tom. O que para uns é tacticismo ou estratégia, para outros…

Estratégia eleitoral ou líder errático?

No Congresso do PS, em Novembro, António Costa excluiu alianças à direita num discurso considerado de viragem à esquerda. Mas poucos dias depois, o secretário-geral dos socialistas recusava essa 'esquerdização', dizendo antes que tinha feito um discurso “humanista”. Foi só o começo.

No jantar de Natal do grupo parlamentar, Costa elogiou a liderança de Mário Soares no Bloco Central e depois de notícias darem conta de que esse podia ser um sinal para 2015, o líder do PS apressou-se a desmentir que tenha recuperado essa fórmula política, “muito menos a pensar em 2015”. Mas quanto a coligações mantém tudo em aberto.

Já após as eleições na Grécia, Costa elogiou a vitória do Syriza, não referindo o seu partido irmão, o derrotado PASOK. Facto que foi aproveitado pelos seus adversários à direita para o colarem a uma ala mais radical. No fim-de-semana seguinte, Costa fez o contraponto, notando que “não é uma questão de ser radical ou não ser radical” reconhecer que a austeridade tem que ser travada.

Os adversários à direita acusam Costa de tacticismo, enquanto alguns socialistas mais críticos apontam a falta de orientação. “Não sei se é táctico mas há uma falta de linha de orientação clara que dá ideia que é uma navegação à vista. Ser líder da oposição é mais difícil do que imaginava”, afirma ao SOL um dirigente nacional do PS.

Críticas que os seus apoiantes recusam. “Pensar que o PS tem uma lógica táctica à procura da bissectriz entre a esquerda e a direita que permita procurar votos ao centro não existe”, defende ao SOL Sérgio Sousa Pinto, membro do Secretariado Nacional. A separação esquerda/direita é feita por “comodidade”, diz o socialista, que lembra que “essa distinção não faz justiça à complexidade das pessoas”.

Contudo, afina a estratégia: o PS procura recuperar os grupos da sociedade que “foram as maiores vítimas da austeridade deste Governo, desde logo a classe média”. “E na classe média há pessoas de esquerda, do centro, também de direita”, sublinha.

Uma abrangência característica de um catch-all party (definição inglesa para os partidos que tentam abarcar diferentes sensibilidades). “PS e PSD são os dois maiores partidos em Portugal, ambos catch-all parties, e por isso não têm outra hipótese senão ter algumas pequenas contradições”, explica o politólogo António Costa Pinto.

Essas aparentes contradições do líder do PS são vistas como naturais. “António Costa nos próximos meses tem um duplo objectivo a cumprir: captar o espaço político à esquerda, mantendo no fundamental o espaço político ao centro”, refere o especialista.

Após o recuo na viragem à esquerda depois do Congresso, um socialista próximo de Costa fazia notar ao SOL que “ninguém marca o rumo ao secretário-geral” e que Costa estaria “sempre no sítio oposto ao que as pessoas pensam”. Ou seja, quando há vozes no PS a puxar à esquerda, o líder dos socialistas modera o discurso e vice-versa. Algo que deverá manter no Governo.

sonia.cerdeira@sol.pt