À falta de melhor, apoie-se Sampaio da Nóvoa

O insustentável silêncio de António Guterres persiste como uma sombra quase hitchcockiana, com traços fortes de intriga e suspense, a pairar nesta novela das presidenciais à esquerda. Porque de duas uma.

Se Guterres quer ser candidato – e há ainda alguns crentes, como Augusto Santos Silva ou António Vitorino – e está a dar a ideia contrária, abrindo espaço e encorajando candidaturas como as de Henrique Neto e Sampaio da Nóvoa, então a sua atitude é, no mínimo, civicamente censurável e hipocritamente dissimulada.

Se, ao invés, Guterres já decidiu mesmo não ser candidato, o que explica o seu interminável silêncio? Porque mantém a sua incómoda sombra a complicar a vida e a campanha de outros candidatos? Não sendo ele um promotor de sarilhos nem um masoquista vaidoso, só resta uma explicação plausível: António Costa ter-lhe-á pedido, em Novembro, que não revelasse publicamente a sua indisponibilidade, para dar tempo à nova direcção do PS de encontrar uma alternativa presidenciável e para não abrir a porta a uma correria fratricida de múltiplos candidatos na área socialista. E, à falta de melhor, avançou agora Nóvoa.

Sampaio da Nóvoa, com a frescura de quem parece só ter acordado para a vida política já depois dos 50 anos, afirma que “com políticos antigos não haverá políticas novas” e que o mal de Portugal é “escolher sempre os mesmos”, mas diz, em simultâneo, ter “orgulho de pertencer a um país” com referências em Belém como “o general Eanes, Mário Soares e Jorge Sampaio”. Coerente.

O ex-reitor é, pois, um 'político novo'. Que está ao lado do Bloco de Esquerda a pedir a renegociação da dívida ou a demissão do Governo antes do final do mandato. É, também, especialista numa oratória grandiloquente mas balofa – “Não quero nada, mas estou disposto a dar tudo” – que se esgota na forma por ausência de conteúdo – “Não quero perder Portugal, nem por silêncio nem por omissão”. Profundo.

Como diz Vital Moreira, Nóvoa em Belém seria “um possível troublemaker institucional”, uma potencial “fonte de conflitos e de instabilidade política”. Sem esquecer que ameaça radicalizar prematuramente à esquerda a campanha do PS para as legislativas. Mas esse problema não é dele, é de António Costa.

jal@sol.pt