O PS deve admitir que António Guterres não está fora da corrida a Belém?
O PS deve admitir que ainda não está fora da corrida. Até porque nas eleições primárias emergiu, consensualmente, como o candidato com o perfil ideal.
O PS pode esperar até quando? Será razoável chegar às legislativas sem ter um nome para Belém?
Se houver uma profusão de candidatos de centro-esquerda, como a discussão desta semana dá a entender, será mais difícil Guterres aparecer depois das legislativas. Mas não impossível.
Por que é que a candidatura de Sampaio da Nóvoa não o entusiasma?
Quando assumimos que Guterres era 'O candidato' definimos não só um nome como um perfil: alguém com experiência política, que conhece a fundo a Administração Pública e o sistema partidário português, com contactos na União Europeia e no mundo. Nóvoa não tem este perfil.
A falta de experiência política é um grande problema?
O PR terá de ter uma grande capacidade para criar pontes e consensos entre os partidos. Sampaio da Nóvoa não tem esse conhecimento intenso da realidade partidária, nem notoriedade na população portuguesa que lhe dê a influência para ser esse árbitro.
António Costa não se deve precipitar num apoio a Nóvoa, comprometendo o partido?
Seria injusto se dissesse que António Costa lhe manifestou apoio nalgum momento. Agora, retirámos do centro do debate a avaliação do desempenho do Governo. É péssimo para o PS. Pede-se ao secretário-geral e a todos os socialistas que voltem a centrar-se na preparação das legislativas. Este ruído só dá vantagem à direita.
Jaime Gama é apontado em vários sectores do PS como um bom candidato. Foi um dos que referiram o seu nome. Por que que o recomenda?
É um profundo conhecedor da realidade política e partidária e da Constituição. Exerceu cargos de grande responsabilidade, tem serenidade e capacidade de tomada de decisão. Mas citei outros nomes: Maria de Belém, António Vitorino, Luís Amado e Oliveira Martins. Todos têm mais semelhanças com o perfil de Guterres. E não é por serem militantes do PS, eu não defendo o monopólio de candidaturas partidárias.
Espera que algum deles avance?
Espero que sintam a responsabilidade de dar o passo em frente.
Defende primárias para o PS escolher o candidato. A primeira volta das presidenciais não são já essas primárias?
Temos de unir o partido e abrir à sociedade portuguesa. A manifestação de apoio a um candidato não precisa de resultar de uma decisão da direcção partidária, pode ser uma decisão de todos, incluindo dos simpatizantes.
Esteve no LIPP, a estrutura de António José Seguro para preparar o programa eleitoral, e passou para o Gabinete de Estudos, a estrutura de Costa. Há uma continuidade ou um rasgar de propostas eleitorais?
Não há, de todo, um rasgar de propostas! Há uma continuidade programática.
Costa disse que eram apenas 'seis propostas e meia' originais de Seguro, o resto vinha de trás…
(Risos) Essa expressão mostrou o paradoxo de acusar Seguro de não assumir o passado do PS.
Qual é o maior trunfo de Costa como líder do PS?
O maior trunfo de Costa está ainda por conseguir: é a capacidade de unir todos os socialistas. A unidade do PS está por conseguir. Da minha parte, aceitando o convite da direcção do partido [para o Gabinete de Estudos], procurei dar um contributo para o processo.
O que falta para unir o PS?
Falta construir uma maior aproximação de gente que esteve separada no confronto das primárias. O meu partido não pode prescindir – e isso não vai acontecer – do Álvaro Beleza, do João Proença, do Miguel Laranjeiro, do Óscar Gaspar, do Miguel Ginestal ou dos presidentes de metade das federações. A capacidade de unir de António Costa tem de produzir resultados nos próximos tempos.
Falou de João Proença, que é dado como candidato a presidente do CES. É um erro Costa não o apoiar?
É sobretudo um erro se cheirar a veto ou a saneamento. Seria um péssimo sinal, que o secretário-geral do PS não quererá dar. João Proença tem uma experiência única no mundo sindical.
Espera que o secretário-geral dê à minoria que apoiou Seguro um terço dos lugares de deputados, como fez em órgãos nacionais do PS?
Não falo em percentagens, a lista de deputados é um processo bem mais complexo. Mas é evidente que na construção da unidade se inclui a representação do partido nos órgãos da República. Estou certo que António Costa verá essa evidência. Chegámos até aqui juntos e vamos fazer campanha eleitoral juntos. Eu assumo, como militante, o compromisso de participar, quem dirige tem a responsabilidade de unir.
O maior erro de Seguro foi não ter aceitado a proposta de Cavaco Silva, que podia ter encurtado a legislatura?
Há aí um equívoco. O que não foi possível foi aceitar os termos do acordo: uma das medidas era o corte permanente das pensões, que nós considerávamos inconstitucional, como o Tribunal Constitucional confirmou. Como poderia haver acordo?
O que tem em comum a ala segurista?
Não há segurismo sem António José Seguro. O que há é um conjunto de militantes com afinidades que continua a reunir, que tem uma agenda onde a ética e a separação entre a política e os negócios são fundamentais. E que procurou – honra seja feita a Álvaro Beleza – que a unidade do partido pudesse avançar de forma mais célere.
É possível separar o sucesso do PS nas eleições de qualquer evolução do processo contra José Sócrates?
Até agora foi possível e não tenho dados que me permitam dizer que não continuará a ser assim. António Costa geriu muito bem o processo e não houve falta de solidariedade pessoal dos socialistas com Sócrates. Agora, o partido deve focar-se em ganhar as legislativas, e com maioria absoluta. Se olharmos para as sondagens vemos que o PS tem uma percentagem idêntica à que tinha antes das primárias. Um partido com 36% a 38% nesta altura é capaz de se bater pela maioria absoluta. Eu já defendia isso com Seguro, mesmo quando era criticado por 'não descolar'. Não se vê uma maioria absoluta a um ano das legislativas.
Quando Seguro tinha as sondagens que Costa tem agora era criticado. Dá-lhe vontade de rir?
Vontade de rir não é a expressão certa. Penso que a maioria dos militantes socialistas, pelo menos hoje, faz uma avaliação mais justa do trabalho de António José Seguro como secretário-geral e dos seus dirigentes. E isso não encerra uma crítica à actual direcção.
manuel.a.magalhaes@sol.pt