Num país político que tanto preza as meias palavras e os salamaleques, Marinho distingue-se pelo desassombro da oratória com que critica tudo e todos, afrontando poderes estabelecidos que merecem ser criticados; atacando, à esquerda e à direita, mas sem cortar pontes que possam vir a ser-lhe úteis no futuro, os concorrentes no 'mercado' dos votos, onde procura o seu lugar ao Sol; e denunciando, mas com o cuidado de evitar comprometer-se, todo o tipo de comportamentos condenáveis, começando pelo dos políticos que se aproveitam dessa condição para negociatas à sombra do Estado.
Vozes destas fazem falta. Mas apenas se forem coerentes e disserem a verdade, sustentada por factos irrefutáveis. De outro modo, apenas contribuem para envenenar um pouco mais as águas do pântano que se propõem limpar em nome da ética.
Marinho denuncia, mas, habitualmente, limita-se a acusações genéricas. Explica que não lhe compete identificar o quê e o quem quando fala de corrupção e práticas similares ,porque isso compete às polícias. Mas, na tal entrevista ao Público, quis pôr o nome às coisas, dando um exemplo. E acusou Almeida Santos de ser “um dos advogados que mais negócios fizeram à custa do que é público”, embora não tenha indicado nenhum, bem como de ter responsabilidades numa amnistia feita à medida dos interesses de advogados poderosos que “até se arranhavam uns aos outros” para que fossem incluídos crimes dos seus melhores clientes. A lei, disse, foi modificada ao sabor desses interesses entre a aprovação na AR e a promulgação pelo Presidente.
O Público foi ver o que se passou. E concluiu que houve uma única alteração significativa da lei, não para “meter crimes” na amnistia, mas para retirar um dos inicialmente previstos. Exactamente o oposto do que Marinho sugerira. Convidado a comentar, recuou em toda a linha e está agora desafiado por Almeida Santos a concretizar as suas acusações ou a responder por elas.
A opinião é livre, mas os factos, como o ex-jornalista António Marinho sabe, são sagrados. Enquanto líder partidário, convém assegurar-se deles para que as suas denúncias e críticas tenham credibilidade. Porque, se a política se resumisse a uma questão de fé na palavra moralista do chefe, mesmo que este não diga a verdade, pouco se distinguiria um partido de uma igreja. E, nesse caso, não faria grande diferença ser o PDR dirigido por Marinho e Pinto ou por um bispo da Igreja Maná.
Nunca mais!
O PS chama-lhes agenda, a coligação PSD/CDS chama-lhes carta e onde o primeiro oferece compromissos, a segunda fala de garantias. Mas as promessas eleitorais são o que são: intenções, umas mais fundamentadas do que outras. Portugal não voltará a depender de intervenções externas, diz a carta. Com a dívida no ponto em que se encontra, com a incerteza grega e a perspectiva de uma eventual saída do Reino Unido da UE, esta garantia solene é a que mais surpreende. A não ser que os cofres estejam de tal modo cheios que, daqui até 2019, Portugal não tenha de recorrer nunca aos incontroláveis e sensíveis mercados financeiros.
A IGF e a lista VIP
O inquérito que ilibou o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de qualquer responsabilidade ou conhecimento prévio da lista VIP foi, afinal, dirigido por uma ex-adjunta, até Novembro passado, de outro secretário de Estado do Ministério das Finanças. Parece que não se encontrou ninguém mais distanciado dos factos e da entidade a investigar. E parece, igualmente, que ninguém se importa com a preservação da boa imagem de instituições como a Inspecção-Geral das Finanças – nem a própria IGF que, por mais independente e isento que tenha sido o inquérito, fica agora sob suspeita. Lamentável.