Acordo ou rendição?

Um referendo é um acto legítimo em democracia e há democracias insuspeitas, como a suíça, que fazem dele o pão nosso de cada dia, chamando os eleitores a pronunciarem-se regularmente sobre os mais variados temas da governação. Serve para esclarecer dúvidas sobre questões que dividem profundamente a sociedade, e habilitar o poder político a decidir…

Que a União Europeia receie e, em regra, se oponha aos referendos, diz muito sobre o modo artificial e alheio à vontade dos povos como tem sido construída. O exemplo da Suíça não vale, dir-se-á, porque não pertence à UE, cujos parceiros abdicaram de alguma soberania, ao subscreverem os tratados. Mas a França pertence à União e rejeitou em referendo o tratado constitucional. A Dinamarca também pertence e recusou em referendo a integração na zona euro. O mesmo acontece com a Irlanda, que chumbou em referendo o tratado de Lisboa. 

O que serviu para a França, para a Irlanda ou para a Dinamarca, que, por sinal, vai referendar ainda este ano certas regras da Justiça em vigor na União, pelos vistos não serve para a Grécia. A soberania dos Estados tornou-se, para Bruxelas, um conceito vazio. Pelo menos para os endividados, embora se duvide que a UE recorresse aos mesmos métodos de pressão sobre a Itália ou a Espanha, para falarmos só dos 'periféricos'. Virá o tempo em que as próprias eleições serão mal vistas em Bruxelas e, logo que possível, talvez proibidas nos países mais pobres e frágeis do euroclube. 

Em 2011, um Governo grego propôs um referendo sobre o segundo programa de resgate. Foi forçado a meter a viola no saco, cavando a própria sepultura. Essa humilhação reduziu a nada o pouco que lhe restava de credibilidade interna. Cairia pouco depois. Passaram quatro anos e outro Governo acossado ensaia o mesmo expediente político. A primeira reacção da Europa foi semelhante à de 2011, mas, perante a insistência de Atenas – ou por considerar que as urnas podem derrotar o impertinente Syriza -, o próprio presidente da Comissão apareceu a fazer campanha, pedindo um 'sim' aos eleitores. Com o mesmo paternalismo arrogante com que anunciou o desastre e o caos se decidirem em contrário. 
Angela Merkel, a bruxa má noutras situações, apresenta-se hoje como a voz mais serena e equilibrada numa Europa sem norte onde todos gritam e já ninguém tem razão.

Tsipras prometeu o que não podia cumprir e esticou a corda irresponsavelmente até quase a partir. Talvez fosse esse o seu projecto original. Mas as cedências de última hora, depois de anunciado o referendo, mostram um Syriza aflito por sair do imbróglio onde se meteu e uma UE implacável, à procura, não já de um acordo, mas de uma rendição. Uma UE decidida a apear Tsipras, humilhando uma vez mais os gregos que, há apenas seis meses, puseram o Governo nas suas mãos.
Qualquer entendimento que evitasse esta nova consulta teria menos custos do que a sua realização. Não sendo possível, o referendo é uma saída justa, ainda que – ganhe o 'sim' ou o 'não', – seja fácil antecipar um desastre como desfecho: mais miséria para os gregos e mais descrédito para uma UE onde já faltavam os políticos dignos desse nome e onde, na verdade, também começa a faltar gente crescida.

Acabou a crise

A Porsche aumentou em 35% as suas vendas em Portugal, comparando o primeiro semestre de 2014 com o de 2015. É verdade que a maioria dos grandes fabricantes registou um forte aumento das vendas, por esta ordem: Renault, Volkswagen, Peugeot, BMW e Mercedes-Benz. Mas o caso da Porsche é especial. Segundo o Expresso, trata-se do melhor arranque de ano desde que a marca se instalou no nosso país. A preferência dos portugueses vai para os automóveis alemães, com três marcas nos cinco primeiros lugares. São, geralmente, os mais caros, o que parece confirmar o fim da crise no país dos cofres cheios. Para os que nunca a sentiram, está bom de ver. E para os que ganharam com ela.

O 'califado' avança

Da Tunísia ao Iraque, poucos são já os países do norte de África e do Médio Oriente onde o autoproclamado Estado Islâmico não exerce influência ou não organizou já atentados com grande impacto e número de mortos, como os que ocorreram esta semana numa praia tunisina, em França e no Kuwait. O mapa dessa presença e/ou actividade terrorista corresponde, em apenas um ano, a quase metade do território que os loucos do 'califado' se propõem 'reconquistar'. Comparada com esta ameaça que cerca a Europa por dentro e por fora, a crise grega é uma brincadeira de crianças. Estranhamente – e à parte uns votos piedosos nos funerais das vítimas europeias – ninguém parece preocupar-se.