Contudo, tal como o SOL constatou junto de políticos, empresários e responsáveis pelas relações externas de empresas, a economia portuguesa está recheada de tentativas de burla. Há sempre quem diga, abusivamente, ser próximo de alguém influente ou os que apregoam ter mais poder ou do que realmente têm.
Por exemplo, Luís Mira Amaral, ex-ministro, não esquece a história de «um indivíduo que convidou outro para ministro imitando a voz de Cavaco Silva». Era mentira, mas o convidado iludido aceitou – até que a realidade se impôs. Afinal não estava na lista de Cavaco.
«No meu tempo de governante, a situação mais frequente era indivíduos dizerem que tomavam o pequeno-almoço ou almoçavam comigo quase todos os dias, e eu mal os conhecia. Ou dizerem que estavam quase todos os dias com o primeiro-ministro para me pressionarem ou impressionarem», continua.
O que pretendiam era simples: mostrar influência nos meios políticos ou nos meios de decisão, que na verdade não tinham. «Uns era para tentar ‘sacar algum’. Outros era por pura vaidade ou tontice».
O agora presidente do banco BIC também chegou a ser contactado por um português que se identificava como «representante de um ex-presidente brasileiro que queria depositar um balúrdio no banco». Mas ligava sempre de um número de telefone nacional e «cheirava a esturro». «Viemos a detectar que era um falsário», recorda.
João Cravinho, também ex-ministro, descreve tentativas idênticas: «Havia pessoas que se apresentavam como próximas, mas não tendo qualquer relação, ou pessoas que tinham alguma intervenção institucional mas estendiam ou representavam pontos de vista para os quais não estavam autorizadas».
A barreira das secretárias
Mas geralmente é fácil detectar estes comportamentos abusivos. Sendo pessoas externas aos meios políticos e empresariais, «não têm consciência que se auto-denunciam e se comportam de um modo estranho ao que é normal nesses ambientes», acrescenta.
Tanto as empresas como os governantes têm meios de prevenção. A nível pessoal, as secretárias e assistentes fazem uma selecção dos contactos. «A minha secretária é minha amiga de infância. Sabe quem são os meus amigos e os que não conheço de lado nenhum, mas que estão a evocar que me conhecem. Faz logo a triagem», relata Mira Amaral.
As grandes empresas têm gabinetes para as relações externas e o tamanho do país ajuda a não cair no conto do vigário. Os empresários cruzam-se quase todos os dias com os membros do Governo. «A proximidade acaba por jogar contra este tipo de procedimentos. É muito diferente estar em organizações muito complexas e inacessíveis como a Comissão Europeia, a Casa Branca ou a ONU, ou estar num mercado como o nacional», compara Armandino Geraldes, presidente da consultora de comunicação BA&N.
ana.serafim@sol.pt e joao.madeira@sol.pt