O tamanho não é tudo

As eleições legislativas mais concorridas de sempre, com 20 candidaturas envolvendo 23 partidos, dos quais sete se apresentam pela primeira vez, deviam ser também as mais disputadas de sempre, aquelas em que o confronto de ideias e de propostas tomaria conta do espaço público, concentrando a atenção do país e mobilizando os eleitores para um…

O que existe de mais provável, todavia, é que, sendo as circunstâncias excepcionais, após quatro anos de total dependência externa e de empobrecimento acelerado, esta seja uma campanha como as outras.

A par dos cartazes inúteis que poluem e desfeiam a paisagem urbana, não faltará a gritaria do costume sobre os pequenos casos, a frenética actividade dos snipers disfarçados de fontes na imprensa ou emboscados nas redes sociais, nem os chamados sound bytes debitados em jantares de fiéis e as arruadas com distribuição de presentes e muitas bandeiras para as câmaras de TV. É nisto que os dois maiores partidos se propõem gastar 5,4 milhões, sabendo-se que, como sempre acontece, a conta final será ainda mais choruda e a proveniência do dinheiro, neste caso como nos restantes, talvez incerta ou mal explicada.

Quanto à tal discussão séria acerca da situação do país e das formas de assegurar algum progresso que não dê em retrocesso será limitada ao estritamente inevitável. Vê-se pelas complexas negociações sobre os debates na TV, as quais produziram, por junto, um só frente-a-frente entre os ‘candidatos a primeiro-ministro’. Isto mostra bem que a sua preocupação não é tanto a de confrontar propostas, mas antes a de evitar correr riscos.

Não será pela falta dos frente-a-frente, de eficácia duvidosa, que os outros deixarão de se fazer ouvir. Mas tudo indica que o poder, porventura ainda mais enfraquecido pela abstenção e pelos votos de protesto, se discutirá entre os do costume, com o PCP firme no seu reduto e um BE que, podendo crescer também, parece ter perdido a oportunidade de alguma vez se tornar um Syriza.

À distância de um mês, nenhum abalo estrutural se prevê no velho sistema partidário comparável aos que têm vindo a ocorrer nos países do Sul da Europa, o que é, ao mesmo tempo, uma notícia má e boa. Má, porque dificulta a necessária regeneração dos partidos, em especial dos que têm alternado no poder; boa, porque o risco da ingovernabilidade, que já vai dando sinais de existir, aumentaria de modo significativo, como se tem visto na Grécia.

Basta olhar para o enorme boletim de voto divulgado pelo Expresso. São 20,3cmx35,2cm de partidos, muitos dos quais só aparecem nas eleições, outros que são defensores de apenas uma causa – pensionistas, anti-aborto, animais – e outros ainda que, resultando de dissidências do BE, mal se distinguem dele.

Há lugar, também, para o ‘caudilhismo’, bem como para um ou dois genuínos movimentos de cidadãos, mas, deste universo de disputas e ambições mais ou menos pessoais não é certo que resulte sequer uma bengala para o PS semelhante à que o PSD encontrou no CDS. O boletim de voto é grande, mas, neste caso, o tamanho não é tudo.

O exemplo do deputado

Martin Patzelt, um deputado alemão pertencente ao partido de Angela Merkel, acolheu em sua casa dois jovens refugiados dos cerca de 800 mil que a Alemanha se prepara para receber. Com o seu gesto, Patzelt resolve apenas o problema dos dois felizardos eritreus. Mas, num momento em que ninguém sabe bem o que fazer, a sua iniciativa humanitária tem um valor político inestimável: é uma resposta frontal aos movimentos que crescem em número e violência contra os imigrantes, assim como aos Estados que os recebem com cães polícias e arame farpado.

Palmira

Desde Maio que a ameaça existia e está agora concretizada perante a passividade da comunidade internacional: um templo com mais de dois mil anos foi destruído à bomba pelos terroristas do chamado Estado Islâmico. Antes, decapitaram Khaled al-Assaad, de 82 anos, guardião, nos últimos 50 anos, do complexo arqueológico de Palmira, o precioso património da humanidade que se ergue no deserto sírio. Custa a crer que tudo isto suceda e fique impune. Mas é o que acontece. Talvez até ao dia em que vierem destruir as catedrais. E será demasiado tarde.