Maria Luís em campanha pelo Barreiro. Veja como foi

Ninguém ainda deu por ela, mas Maria Luís Albuquerque anda pelas ruas, feiras, associações e hospitais do distrito de Setúbal desde meados de agosto. Sem câmaras atrás e com uma comitiva pequena, a ministra das Finanças quase passa despercebida em pleno bastião comunista. Mas um tema persegue Maria Luís: o das pensões. «As pessoas falam…

O assunto das pensões foi alvo de uma discussão interna acesa no seio da coligação: seria possível passar uma campanha inteira sem apresentar uma solução concreta para o problema? Ganhou a perspetiva intermédia, com a Portugal à Frente a propor um plafonamento horizontal, mas sem entrar em detalhes concretos como o valor a partir do qual será possível optar por descontar para um regime privado. Agora, Maria Luís Albuquerque sente nas ruas o impacto político do ruído que se gerou em volta das pensões.

A ministra das duas placas

A ministra inscreveu no Programa de Estabilidade que enviou para Bruxelas a necessidade de cortar 600 milhões de euros para tornar sustentável a Segurança Social. A cabeça de lista da coligação tem de explicar às pessoas que isso não se vai traduzir num corte de pensões. «Não há ainda uma solução fechada», responde ao SOL. Nas ruas, não lhe perguntam pelos 600 milhões ou pelo Programa de Estabilidade: «Ainda ninguém me perguntou isso. Só me dizem ‘veja lá as nossas pensões’».

O tema é sensível e está à espreita onde menos se espera. Numa visita à empresa da Baia do Tejo – que gere o arco ribeirinho sul e é tutelada pelas Finanças – um funcionário deixa escapar um desabafo mais amargo. «Vou para a reforma também por vossa causa. Se não, talvez ainda esperasse um ano ou dois». O medo de mais cortes acelerou a decisão. Maria Luís aconselha-o a esperar. «Vamos ver, vamos ver». A resposta é em tom suave, com um sorriso nos lábios e saída pronta para o departamento financeiro da empresa, onde se sente entre os seus. «É cá dos nossos, um aliado das Finanças», brinca com um dos responsáveis, a quem faz questão de dizer que o trabalho que faz no Terreiro do Paço é em tudo idêntico ao que aquele administrativo tem entre as mãos. «Só quando as coisas correm mal é que dão por nós, os financeiros», atira Maria Luís.

Quem a vê pela primeira vez ao vivo surpreende-se com o à vontade e o sentido de humor com que brinca a propósito de uma placa com o seu nome que encontra num dos corredores do Business Center do Barreiro. «Só tenho duas no país inteiro. De vez em quando venho cá ver se está a ser bem tratada, se está polida. Os ministros das Finanças não têm direito a muitas placas».

Maria Luís sabe que o seu humor pode ser desconcertante e é uma arma que usa com mestria. «O facto de ser senhora também ajuda, as pessoas contêm-se mais», confidencia uma fonte da campanha, explicando que até agora «só por uma vez houve insultos atirados à caravana» apesar de Setúbal ser um distrito tradicionalmente de esquerda e um dos que mais sofreram com a crise.

Perante a candidata sorridente que vai entrando nas start ups que crescem no Business Center, não há críticas a fazer. O jovem empreendedor que lançou uma empresa de software conta que acabou de «fechar uma parceria em França» para ter mercados alternativos a Angola. Na empresa de transportes, o empresário de meia idade diz que «não tem razões de queixa» e há até quem aproveite para dar à ministra o cartão de visita de uma empresa de design de comunicação. Ninguém fala na carga fiscal, ninguém se queixa da crise.

À mesma hora, os lesados do BES manifestavam-se à porta do Ministério das Finanças, no Terreiro do Paço, num dia em que os ânimos voltaram a subir de tom e a polícia usou gás lacrimogéneo para dispersar os manifestantes. Mas Maria Luís, mesmo no coração das antigas instalações da Quimigal no Barreiro, movia-se claramente em terreno amigo, enquanto o administrador da Baia do Tejo lhe servia de cicerone.

‘Conheço-a de onde?’

Esperava-se que o cenário fosse diferente numa pastelaria do centro do Barreiro, mas também aí é difícil medir o pulso à campanha da PàF em Setúbal. 

A candidata entra no café quase vazio e é efusivamente cumprimentada por uma idosa que lhe gaba o bom aspeto, para, depois de uma hesitação, perguntar. «Eu conheço-a de onde?». Maria Luís não perde a pose. Sai da mesa onde já a espera uma bola de manteiga, a especialidade barreirense, e vai ter com a eleitora. «Conhece-me da televisão. Sou a ministra das Finanças». A senhora afinal sabe quem é. «É tão bonita», vai repetindo, enquanto lhe fala nas pensões. Sempre as pensões.

Quem entra a seguir no café já sabe ao que vem. Um grupo de militantes do PSD viu na agenda que Maria Luís ia estar na Pastelaria Moderna e veio cumprimentá-la. Também aqui não há     reclamações, só saudações simpáticas. «Até agora tem sido assim», resume a candidata. Resta saber como isso se traduzirá em votos.

margarida.davim@sol.pt