Como Passos Coelho virou a mesa em cinco passos

Há um ano, uma vitória nas legislativas parecia quase impossível para a coligação. Agora, a poucos dias das eleições, PSD e CDS acreditam cada vez mais nesse resultado. Mas, afinal, como é que Passos virou a mesa?

Uma das estratégias da Portugal à Frente (PàF) tem sido a de fazer das fraquezas forças.

Virar o bico ao prego na Segurança Social

A Segurança Social é um bom exemplo disso. O Programa de Estabilidade enviado pelo Governo para Bruxelas em Abril revelou uma intenção de cortar 600 milhões de euros que serviu para a oposição acenar com o perigo de novos cortes em pensões.

O tema começou por ser uma grande dor de cabeça para a comunicação de Passos e Portas, porque não havia uma resposta clara sobre como seria feita esta poupança, remetendo-se apenas para um acordo com o PS, que os socialistas recusaram à partida.

A viragem veio com o debate radiofónico. Graças à ajuda do vice-presidente e ex-secretário de Estado da Segurança Social, Marco António Costa, Passos Coelho passou a pente fino o programa do PS sobre o tema e descobriu um buraco de seis mil milhões provocado pela descida da TSU proposta por António Costa e um corte de 1.020 milhões que ninguém ainda soube explicar de forma clara no PS.

O assunto que parecia ser incómodo para a coligação passou a ser um trunfo explorado quase à exaustão por Passos e Portas, que o usaram para demonstrar que as contas que o líder do PS apresentou não são de confiança.

Humildade

Passos Coelho é muitas vezes acusado de ser demasiado “palavroso”, mesmo pelos seus colaboradores mais próximos. Esta característica do primeiro-ministro já o levou por diversas vezes durante a campanha a ficar enredado em longas conversas com populares que o interpelam nem sempre de forma simpática, como um lesado do BES em Braga ou a ‘senhora de cor de rosa’ em Oeiras.

Mas o estilo explicativo está a funcionar a favor de Passos por contraste com António Costa, que a coligação tenta sempre apresentar como mais radical.

De resto, apresentar Passos Coelho como moderado e disponível para o diálogo – algo que está sempre tanto nos seus discursos como nos de Portas – é essencial numa eleição que pode resultar num governo minoritário. A ideia é que o eleitorado veja no líder da coligação alguém mais capaz de gerar consensos e conseguir estabilidade governativa do que António Costa.

Por isso mesmo, a palavra “humildade” tem aparecido recorrentemente nos discursos e vai continuar a aparecer.

Também por isso, os dirigentes da coligação estão apostados em não mostrar euforia, apesar dos resultados animadores das sondagens.

Na reta final da campanha, haverá demonstrações de apoio popular, mas a campanha irá evitar um clima de festa antecipada.

“Aandamos de alma cheia, mas não andamos com o rei na barriga”, dizia Passos esta manhã num mini comício improvisado em Guimarães.

Prometer sem fazer promessas

Que os bons indicadores económicos iam ser usados à saciedade na campanha não é novidade para ninguém. Eles são repetidos em todos os discursos e usados como a prova de que a fórmula do Governo para o país estava certa.

O que é mais surpreendente é a forma como a reposição dos cortes em pensões e salários, que decorre de uma sentença do Tribunal Constitucional (TC), acabou por ser uma espécie de trunfo eleitoral.

Ainda hoje, num almoço em Mesão Frio, Passos Coelho lembrou que “já hoje não temos qualquer medida de retenção das pensões” e que “já estamos a remover” as medidas de redução dos salários da Função Pública.

Passos explica este fim da austeridado – faseado de acordo com o que está no Programa de Estabilidade – com o facto de que “já não estarmos na emergência financeira”. Mas as medidas decorrem do que foi declarado inconstitucional pelo TC.

O medo de mudar

O fantasma da instabilidade política é um dos maiores trunfos de Passos Coelho nesta eleição. Mas não é só. A estratégia passa por apresentar o “trabalho feito”, exibindo os bons indicadores económicos”, ao mesmo tempo que se recorda a herança do passado.

Depois de lembrar “quem chamou a troika”, a coligação tem-se concentrado em apresentar-se como a força política que mais “confiança” oferece.

Foi, de resto, por isso que no programa da PàF se substituiu a palavra “promessas” por “garantias”.

Passos tem colado Costa à “velha política” das promessas e à “demagogia”.

Portas tem tentado demonstrar que, com António Costa, o PS seguiu o caminho da “radicalização”.

“Confiem no que é confiável”, tem repetido Paulo Portas que, logo no anúncio da coligação em Abril, aconselhava “cautelas e caldos de galinha” aos eleitores na hora de decidir.

Segurança máxima e campanha bem orquestrada

Sabendo que hoje a campanha é sobretudo feita para as televisões, a coligação preocupa-se com que as imagens mostrem uma forte moldura de apoio a Passos e Portas. Para isso, as estruturas locais têm feito um trabalho precioso, convocando os militantes para estar presentes e garantindo a mobilização.

Outra preocupação é evitar erros e confrontos. A campanha começou por decorrer dentro da bolha do “Portugal positivo”, com visitas programadas a empresas de sucesso.

Nas ruas, a JSD – com uma comitiva que acompanha a volta nacional dos líderes – garante uma espécie de cordão de segurança que torna difícil chegar muito perto de Passos.

Mas há ainda o cuidado de evitar cenas como a de Espinho, quando um popular exaltado se envolveu numa troca de insultos que descambou em agressões com apoiantes da coligação. Agora, a ordem – que veio da direção nacional, mas está a ser replicada pelas estruturas locais – é a de manter a contenção e não responder a provocações.

margarida.davim@sol.pt