PS entre arrumar a casa, os acordos e as presidenciais

Todos os olhos estão postos na reunião da Comissão Política do PS de logo à noite. O tema principal será o futuro interno do partido, mas os passos no Parlamento – com acordos à direita ou à esquerda – e a (in)viabilização de políticas do Governo, bem como as presidenciais também deverão constar do cardápio…

“Manifestamente não me vou demitir”, disse António Costa na noite da derrota eleitoral. Palavras que não caíram bem na oposição interna que depressa se juntou e criticou a céu aberto a opção do líder do PS. Álvaro Beleza, que foi o rosto do pós-segurismo, já disse que avança, caso mais ninguém o faça, leia-se, Francisco Assis.

“Serei candidato se não houver outro candidato que tenha mais condições do que eu”, disse Beleza, em declarações ao Observador. Os seguristas têm pressionado o eurodeputado Francisco Assis para avançar para a disputa da liderança, mas o socialista, que apoiou António José Seguro nas primárias, não parece disponível. “Não, não, não. Não estou. Estou completamente fora disso”, garantiu Assis, em entrevista ao i, quando questionado se estaria disponível para se candidatar à liderança, ainda antes das eleições a 4 de Outubro.

Logo na noite de domingo, Costa quis dar um sinal à oposição interna. "Nunca sou nem nunca serei um problema para o PS. Nunca faltarei quando for preciso e nunca estarei quando estiver a mais”, disse. Um dos históricos do partido, Manuel Alegre, já veio dizer que Costa deverá manter-se como secretário-geral. Mas vários seguristas pediram imediatamente a sua cabeça, intenções que deverão renovar frente a Costa esta noite. Os críticos deverão apontar o dedo aos erros cometidos na campanha, elencando a falta de demarcação face ao Governo de José Sócrates e a ‘esquerdização’ do discurso, que perdeu ao centro. 

Esta noite serão marcadas eleições diretas e um Congresso nacional para esclarecer a questão da liderança. Caso ninguém avance ou o candidato da oposição interna não consiga ultrapassar Costa, o líder do PS sairá legitimado. Resta saber se o Congresso será marcado para antes ou depois das presidenciais. Segundo as contas de algumas cabeças socialistas, se o PS tiver nova derrota nas presidenciais poderá ser mais difícil para Costa segurar-se.    

Acordos à direita ou à esquerda?

O discurso de António Costa após os resultados eleitorais colocou pressão no Governo e nos partidos à esquerda do PS. “O PS não contribuirá para maiorias negativas que criem obstáculos e que não sejam susceptíveis de criar alternativas credíveis de governo”, garantiu o líder do PS. Se por um lado Costa disse que não alinhava com PCP e BE para derrubar o Governo da direita, também lhes lançou o repto de que não poderá haver uma maioria de esquerda, sem que todos assumam responsabilidades.

PCP e BE, logo na noite eleitoral, tentaram encostar o PS à parede ao dizer que avançariam com uma moção de censura ao Governo. Mas Costa recusou: “O PS sempre foi defensor de moções de censura construtivas. Não inviabilizaremos um governo sem ter um governo para viabilizar”.

Os socialistas não estão disponíveis para fazer cair uma maioria que obteve, como sublinhou Costa, mais votos e mais deputados. Até porque duvidam das verdadeiras intenções da esquerda à sua esquerda: PCP e BE querem derrubar a direita mas não estarão disponíveis para integrar um Governo em conjunto com os socialistas.

Na mente de muitos socialistas está, aliás, o ano de 1987, ano da primeira maioria absoluta de Cavaco Silva. A 3 de Abril de 1987, a moção de censura aprovada pelo PS em conjunto com os deputados do PRD e da APU deram impulso ao PSD que se manteve no Governo com Cavaco por dez anos. Uma história que o PS não quer ver repetida. É o que nota o membro do Secretariado Nacional do PS Sérgio Sousa Pinto. “Aparentemente o BE e o PCP estão dispostos a viabilizar um governo do PS, um governo com menos deputados socialistas no Parlamento que a coligação de direita. Mas não estão disponíveis para integrar o governo e partilhar a responsabilidade de governar. O que se seguiria seria fácil de imaginar. Uns a pensar no país, outros a pensar na sua plateia, outros ainda a pensar em eleições e na maioria absoluta”, escreve Sousa Pinto na sua página de Facebook.

“A esta barafunda suicidária, sem programa nem destino certo, chamar-se-ia "governo de esquerda" – coisa que nem os eleitores do bloco desejaram, optando pelo partido do protesto histriónico (e agora fanfarrão). Um penoso caos que entregaria Portugal à direita por muitos anos. Mas talvez permitisse ao BE suplantar o PS. E não é essa a verdadeira agenda, velha de 40 anos, de quem se reclama ‘da verdadeira esquerda’? Talvez me engane”, conclui o dirigente socialista.

O programa de Governo não carece de votação no Parlamento – apenas se houver moções de censura e aí o PS, ao que tudo indica, não quererá derrubar o Governo – portanto a grande prova de fogo será o Orçamento do Estado. A coligação não tem maioria no Parlamento e Passos Coelho já mostrou disponibilidade para negociar com o PS. Os socialistas vão impor condições, linhas vermelhas das quais não abdicam, de modo a dar “estabilidade” ao país, uma das palavras mais usadas por Costa, em campanha. Um exercício de negociação que terá em conta o peso do PS mas com Passos e Portas a liderar.

À esquerda, o PS poderá aliar-se a PCP e BE para outras questões, nomeadamente de valores e costumes. Por exemplo, uma das primeiras a chegar ao Parlamento deverá ser a revogação das taxas moderadoras no aborto, que o Governo aprovou no final dos trabalhos parlamentares.

Presidenciais, o desafio que se segue

Não é líquido que na reunião de hoje haja espaço para debater presidenciais, tendo em conta que a vida interna do partido deverá ocupar grande parte do tempo dos socialistas. Mas o tema era uma das pontas soltas que aguardava desenlace após 4 de Outubro.

Se numa primeira fase o apoio do PS parecia praticamente garantido ao ex-reitor da Universidade de Lisboa Sampaio da Nóvoa, o aparecimento da socialista Maria de Belém, apoiada pelo sector segurista, veio baralhar as contas.

O Presidente do PS, Carlos César, impulsionador da candidatura de Nóvoa, acabou por admitir, pouco antes do arranque da campanha eleitoral, que o partido poderá optar por não apoiar qualquer candidato à Presidência da República.

A decisão ficou para depois das legislativas e com a derrota de Costa a margem para impor um candidato presidencial ao partido fica agora reduzida. 

sonia.cerdeira@sol.pt