A sua candidatura gerou algum entusiasmo no PS, mas, como seria de esperar, sem reunir unanimidade. António Costa deu o mote: primeiro vamos lutar pelas legislativas, e só depois pelas presidenciais. Mas a ala segurista do partido não concordou. E, para marcar posição, Maria de Belém anunciou que ia entrar na corrida. Com isso, “desobedeceu” às instruções do secretário-geral, o que não lhe deve facilitar a vida no futuro.
No sistema constitucional português, o presidente da república é bem mais do que um “corta-fitas”. Tem o poder de veto sobre os decretos-lei e as leis emanadas do governo e da assembleia da república; em alguns casos estes vetos podem ser derrubados, mas noutros casos são absolutos. Tem o poder da palavra, o que com o poder de veto é o suficiente para fazer a vida de qualquer governo num inferno, como Soares fez com Cavaco. E, last but not least, o presidente da República tem o poder conhecido como a “bomba atómica”: dissolver a assembleia da República, fazendo assim cair o governo, e convocar eleições legislativas antecipadas.
Claro que os presidentes têm de ter muito cuidado para usar este poder. Precisam de um pretexto plausível, que a oposição ganhe as eleições (porque não iriam demitir o governo para que depois este ganhasse as legislativas antecipadas; se isso acontecesse, o presidente ficaria muito enfraquecido politicamente e provavelmente teria de se demitir). Em média, a dissolução da assembleia é feita de dez em dez anos. Todos os presidentes, até hoje, a fizeram pelo menos uma vez, excepto Eanes, que a fez duas, mas a Constituição desse tempo era diferente da actual: o presidente da República tinha muito mais poderes, podendo designar os seus próprios governos (foram três), e não existia Tribunal Constitucional.
Os presidentes da República são eleitos por cinco anos, sendo que podem ser reeleitos após esses cinco anos, e até hoje foram sempre. Portanto, na prática, esta eleição é para dez anos. E é um período em que os presidentes tendem a facilitar a vida ao bloco político a que pertencem. Todos sabem isso muito bem.
E foi aqui que Maria de Belém, e a ala segurista do PS, falharam. Se não tivessem apresentado qualquer candidatura, o PS podia apoiar oficialmente, e unir-se, em torno de Sampaio da Nóvoa. Mas, desde a madrugada de hoje, isso é impossível, o que só irá facilitar a vida à direita, quiçá por vários anos.