André Silva: ‘Não sou mais amigo dos cães do que das pessoas’

Em geral, só ao final da noite de domingo os portugueses perceberam que o PAN ia ter um deputado na Assembleia da República. Mas André Silva tinha antecipado há meses que iria sair do anonimato. E logo no Dia Mundial do Animal.

“Estava à espera de ser eleito”, diz com segurança, referindo os indícios dos 58 mil votos obtidos nas autárquicas de 2013 e repetidos nas europeias de 2014: “Dava para eleger um deputado em Lisboa e com folga”. O seu partido teve agora mais de 74 mil votos.

Este engenheiro civil de 39 anos que trabalha na recuperação de património e é porta-voz do PAN, não ficou sentado à espera das legislativas. A sua prioridade foi ser eficaz a passar a mensagem e resolveu usar parte do dinheiro da subvenção pública para contratar uma agência de comunicação. “Foi uma aposta estratégica. Tínhamos a noção que os media não iam dar-nos atenção e iam preferir os líderes mediáticos dos partidos emergentes. Acertámos”. O trabalho do PAN não teve o impacto que gostaria nas televisões e jornais, mas foi dado a conhecer nas redes sociais. Em larga escala.

É que se não estava escrito nas estrelas que o partido dos animais ia ter sucesso, estava à vista no Facebook, onde é seguido por 80 mil ‘amigos’ – deixando a léguas do PS, o segundo classificado na rede, com 36 mil seguidores. E em maio houve outros sinal da força “em crescendo” do PAN, que conseguiu recolher 60 mil assinaturas em 60 dias para entregar na AR uma iniciativa de cidadãos. O país político andou, portanto, bem distraído.

André não tinha filiação partidária anterior e entrou no PAN há quatro anos, depois de ter visto um documentário chocante sobre animais torturados – que o fez chorar e mudar de vida. “Deu-se um clique”, conta. Tornou-se vegetariano, “por razões éticas, mas também ambientais e de saúde”, leu depois o manifesto do partido dos animais e prometeu a si próprio “contribuir para que o partido fosse o mais longe possível”. Agora, ri-se: “Estava longe de imaginar o que iria acontecer comigo”.

Leva a sua missão de ativista a sério, mas garante que não teremos um “fundamentalista” no Parlamento. É capaz de brincar com os estereótipos da causa – “já respondi que não vamos baixar o IVA da Whiskas”, diz com uma gargalhada – e jura ser tolerante. Talvez até seja um pouco mais do que isso.

O teste do leitão na Mealhada

Vamos então a um teste. Seria capaz de entrar num restaurante da Mealhada? “Iria com um amigo à Mealhada, ele comia leitão e eu outra coisa qualquer. Ele pagava o leitão dele e eu pagava o meu prato. Não deixaria de ir”. A seguir, explica-se: “Quando mudo o meu comportamento já ‘estou a mudar o mundo’”. Mas há mais uma razão para a tolerância: “É que já comi muito leitão na minha vida e não gostava de ter sido discriminado. Por isso não discrimino ninguém”.

Comeu animais, mas apesar de ter ajudado os avós, agricultores de Tondela, a desenvolver um aviário intensivo, não se lembra de ter matado um animal na sua vida. E se alguém esmagar um escaravelho? Não seria indiferente. O PAN, contudo, evitará atuações radicais. Não quer fechar explorações pecuárias, mas tentar que os animais “vivam com condições mínimas”, sejam tratados com respeito e sem sofrimento evitável.

André Silva quer tentar acabar com os abates nos canis e dá prioridade aos excessos da indústria pecuária. As porcas parideiras devem ter espaço para se moverem, não ficando como até agora confinadas ao espaço que ocupa o seu próprio corpo. E as vacas leiteiras não podem ser afastadas de imediato das suas crias, defende.

As marisqueiras, estão para já fora do seu radar. “É fácil medir a dor de um camarão ou lagosta que entram vivos em água a ferver. Mas a empatia das pessoas é muito maior com um bovino do que com um crustáceo. Vamos primeiro ao animal com que as pessoas têm mais empatia. Há que despertar consciências”, afirma, pragmático.

Polémica com os copos menstruais

O PAN (já agora, a sigla significa Pessoas, Animais, Natureza) defende “o fim do antropocentrismo”. Significa isto que o André Silva põe os animais acima das pessoas? “Não gosto mais de animais do que de pessoas. Não sou mais amigo dos cães do que de pessoas”, sublinha. E logo de seguida explica, sério, o que pode ser a medida da atuação do partido: “As pessoas já têm direitos, os animais estão no fim da linha. Queremos o mínimo dos mínimos para eles”.

O partido que é dos animais tem mais de metade do programa dedicado às pessoas. Mas até agora só o copo menstrual – que serve para substituir tampões e pensos e tem recebido comentários jocosos – é discutido nos media e nas redes sociais. André ri-se. Quer despertar a consciência ambiental e aceita que a rejeição seja a primeira reação, motivada pela falta de conhecimento.

Não diminui o IVA de rações para animais de companhia, mas defende a baixa do IRS para as despesas com eles, já que o Estado sairia beneficiado indiretamente: gastará menos em médicos e enfermeiros, pois “quem tem um cão ou um gato tem mais alegria e saúde”, explica André.

Conta: 8,60 euros