Depois da onda de contestação gerada entre professores de norte a sul do país, “as câmaras estão a entrar com pezinhos de lã neste processo, sem querer afrontar as escolas”, considera Filinto Lima, vice-presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos de Escolas Públicas. O diretor diz ao SOL que os 15 municípios que integram o projeto piloto estão a ser cautelosos e isso tem “aliviado a tensão e angústia que estava a ser sentida pelos professores”. Mas Filinto Lima considera que o processo de descentralização de competências para o poder local é um “movimento sem retorno”.
Os sindicatos querem acreditar que não. “Estamos esperançados que a nova maioria parlamentar venha suspender este processo”, afirma ao SOL Mário Nogueira, secretário geral da Fenprof, defendendo um debate profundo sobre o que se entende por descentralização. “Se implica entrar por aspetos programáticos e curriculares e for vista com um caráter economicista somos contra”, diz. Contudo, o sindicalista congratula-se por ter sido abandonada a questão mais polémica: a contratação dos professores pelas câmaras.
Fenprof: está tudo parado porque não há dinheiro
Por enquanto, e neste ano letivo, só a contratação do pessoal não docente passou para a gestão camarária, confirmou o SOL junto de várias autarquias que assinaram o contrato interadministrativo com o Governo. Em alguns casos – como a lei aumentou recentemente o número de alunos por funcionário – as autarquias foram até obrigadas a contratar mais pessoal. Foi o caso de Oeiras e Cascais. Noutras câmaras está também em curso o levantamento das obras a fazer nas escolas.
A questão pedagógica, que abre a possibilidade de as escolas definirem 25% do currículo, só avançará no futuro. A Câmara Municipal de Águeda, uma das que foi mais contestada pelos docentes, defende que o processo seja “gradual e adaptado à realidade local”, cabendo à escola “definir se existem ou não alterações a efetuar”. Quando isso acontecer, estima Mário Nogueira, começarão os problemas: “Haverá novos currículos, começarão a ser procurados novos professores, os do quadro ficarão com horário zero ou serão dispensados”.
Em Vila Nova de Famalicão ainda não se avançou com a definição curricular, mas a câmara e a escola já têm uma ideia do que querem alterar. Por exemplo, reforçar a presença do famalicense Camilo Castelo Branco no ensino e da indústria têxtil.
Na Mealhada, o vice-presidente da autarquia também garante que a nível pedagógico e curricular tudo se manterá como antigamente. Guilherme Duarte admite, contudo, que a “comunidade educativa está dividida” e, apesar de os pais e alunos não colocarem obstáculos a este processo, “os professores têm sido os grandes contestatários”.
Além da conjuntura política atual, e de a delegação de competências só ter sido oficialmente feita em agosto, um mês antes do arranque das aulas, Mário Nogueira tem outra explicação para o facto de “não estar a acontecer nada” nesta área: “os fundos comunitários ainda não foram disponibilizados. Não há interesse nisto porque ainda não há dinheiro”.