Compatibilizar a consolidação orçamental com o crescimento económico é um dos grandes desafios do próximo governo. Até junho, o défice estava em 4,7% do produto interno bruto, mas Maria Luís Albuquerque acredita que a meta do défice de 2,7% seja atingida este ano. Já em 2016, poucos acreditam que o objetivo de 1,8% seja alcançado. «Sem consolidação orçamental, aumenta a dependência face ao exterior e a necessidade de cobrança de impostos, diminuindo a autonomia do país e dos agentes económicos como um todo, tornando a economia mais rígida e menos competitiva», refere Filipe Garcia, economista da IMF em declarações ao SOL.
O professor e economista João César das Neves deixa o alerta: «Se o próximo governo, seja ele qual for, não estiver atento às condicionantes, que ainda são muitas, e abandonar uma linha de parcimónia e rigor económico-financeiro, Portugal está em grande risco de perder tudo o que conseguiu nos últimos anos». O Conselho de Finanças Públicas (CFP) já avisou que 2016 é «o ano mais exigente» para cumprir os objetivos orçamentais anuais até 2019.
Do lado do crescimento económico, o CFP não tem dúvidas de que o regresso ao modelo do passado – baseado no consumo interno e nos estímulos orçamentais – pode abrir a porta a uma nova crise. «Se Portugal for apercebido como um país que não está a caminhar no sentido da consolidação, poderá ir recebendo menos apoio institucional, o que traria dificuldades de financiamento que contaminariam o sistema financeiro», acrescenta Filipe Garcia.
A dívida pública e privada, o desemprego, a promessa de um crédito fiscal da sobretaxa no IRS relativo a este ano ou o descongelamento das reformas antecipadas são exemplos de outras áreas que podem afetar as contas do próximo executivo.
As incógnitas do sistema bancário
Na banca, o futuro do Banif e do Montepio e a pressão sobre a Caixa Geral de Depósitos são temas que transitam para a XII legislatura. No entanto, o maior risco é a necessidade de capitalizar e vender o Novo Banco.
Depois do fracasso da primeira tentativa de alienação do banco de resolução, o Banco de Portugal lançará um novo concurso em diferentes moldes, ainda este ano. Sérgio Monteiro, até agora secretário de Estado, vai liderar a venda do Novo Banco no Fundo de Resolução. O novo executivo terá de renegociar o prazo-limite para a venda, mas não deverá ser chamado a injetar mais dinheiro. Até porque, uma eventual capitalização terá um impacto significativo no défice. A litigância também vai exigir novas decisões ao governo.
A posição de 60% do Estado no capital do Banif (ver página 54) e o reembolso ao erário público da ajuda concedida à CGD podem representar novos riscos. «Não está ao alcance do governo, mas há outro problema que se poderá colocar que é o facto de o Banco Central Europeu continuar a exigir aos bancos mais capital nos próximos anos», acrescenta o gestor de ativos do Banco Carregosa, Rui Bárbara. Os resultados dos testes de stresse à banca serão divulgados em novembro. E, em 2016, entra em vigor a diretiva europeia para a resolução bancária, cujas características de capitalização interna podem trazer alguma instabilidade ao sistema bancário doméstico.
Transportes em reestruturação
A reestruturação das empresas públicas de transportes será outros dos dossiês em aberto que transitará para o próximo executivo. Em curso estão os processos de subconcessão das transportadoras de Lisboa e Porto que têm gerado muita contestação. A norte, os contratos da Metro do Porto com a Transdev e a da STCP com a Alsa já foram assinados, mas ainda carecem do visto prévio do Tribunal de Contas. Na capital, foi pedida mais informação à Carris e ao Metro, cuja subconcessão foi entregue à espanhola Avanza. Na aviação, e ao contrário do que o anterior Governo de Passos Coelho pretendia, a conclusão da privatização da TAP também resvala. Mas a debilidade financeira da companhia e a sua urgente necessidade de capital exigem que haja ‘dinheiro fresco’ com rapidez.
Nomeações em aberto
A cor política do executivo será decisiva na escolha do perfil de presidentes de várias entidades. José de Matos deverá ser substituído no final do ano, altura em que termina o mandato na Caixa Geral de Depósitos. O governo terá ainda de nomear o presidente da CMVM e do Tribunal de Contas. Carlos Tavares já terminou o seu mandato e Guilherme d’Oliveira Martins trocou a fiscalização das contas públicas pela Fundação Calouste Gulbenkian.