Costa mete pressão e diz que só está ‘disponível’ para governo de legislatura

Falta o acordo político com o PCP para ficar fechado um acordo à esquerda e a menos de 24 horas de ter que o aprovar nos órgãos do partido, António Costa mete pressão nos comunistas: “Eu não estou disponível, o PS não está disponível para formar um Governo que não tenha condições reais e credíveis…

Costa mete pressão e diz que só está ‘disponível’ para governo de legislatura

Num discurso de 45 minutos perante a Comissão Nacional do PS, Costa admitiu que ainda estão em curso as negociações com o PCP e avisou uma vez mais que o PS só apresentará uma moção de rejeição ao Governo de Passos Coelho se alcançar “condições efetivas” de Governo. “Um governo de mudança não é um governo que não tenha condições de fazer a mudança que é necessária”, disse.

Contudo, o líder do PS mostrou-se confiante num desfecho favorável ao acordo com BE, PCP e PEV que, disse, sempre demonstraram nas negociações “um espírito construtivo”, frisando que o que está em causa não é a identidade do PS ou dos restantes partidos e isso é uma “prova de seriedade”. “Somos sérios e falamos com gente séria que não vende a sua identidade por qualquer acordo de Governo”. Costa precisou que o que está em cima da mesa não é “eliminar as diferenças que não são negociáveis”, mas o que é possível fazer “em conjunto” no contexto parlamentar e no “horizonte da atual legislatura” para ir ao encontro dos interesses do país e dos portugueses, através de medidas que “são consistentes com o conjunto do programa eleitoral do PS” e da sua estratégia de política económica e orçamental e “inteiramente compatível” com os compromissos internacionais, nomeadamente em matérias de Defesa, participação na União Europeia e no quadro da zona euro.  

Costa responde assim aos críticos que argumentam que BE e PCP têm divergências de fundo com os socialistas, nomeadamente no que diz respeito aos compromissos internacionais e ao quadro do euro. Aqui, o secretário-geral do PS aproveitou para dar uma alfinetada ao CDS que, em 2002, para “ganhar lugares” no governo passou de “campeão da luta anti-euro a um protótipo do euro-oportunismo”.  

O acordo de esquerda será, afinal tripartido: vão ser assinados três acordos – com BE, PCP e PEV- uma vez que cada partido estava disposto a aceitar “determinadas condições que outros não estavam”. Mas desvalorizou o facto de não haver um documento comum, referindo que a base que “dá consistência e assegura a ação governativa” é o programa do governo.

Aos críticos, com Francisco Assis à cabeça – que ontem, na Mealhada, disse que não iria “alimentar qualquer guerrilha – Costa deixou um duro recado. “Não podemos estar na vida política com uma visão cínica mas com a responsabilidade de assumir as funções políticas nas boras horas ou más horas, independentemente da facilidade ou dificuldade”, defendeu.

Os argumentos históricos de Costa

Costa, de resto, elencou argumentos para rebater as críticas dos opositores ao acordo de esquerda, socorrendo-se de acontecimentos históricos. Primeiro abordou a questão da legitimidade política: “A direita não está em minoria na Assembleia da República por qualquer golpe de Estado. Está em minoria porque tem menos deputados que as restantes bancadas e tem menos deputados porque teve menos votos”. Donde se concluí, segundo Costa, que a “inequívoca maioria dos portugueses não quer a continuação deste Governo” de Passos e Portas.

Aumentando a pressão sobre os críticos, o líder do PS recorda que esta é a primeira vez na História que “a direita só governaria se tivesse o apoio do PS”. Mesmo há 30 anos, quando ocorreu um resultado parecido com o que saiu das últimas legislativas, foi o PRD a viabilizar o governo. E aproveita para bipolarizar as alternativas: ou havia um governo de direita com o apoio do PS ou um governo alternativo.

Foi neste contexto que o líder do PS invocou a legitimidade política das coligações pós-eleitorais que se formaram entre PS e CDS e PS e PSD. “Onde está escrito, qual a norma da Constituição que diz que é legitimo um acordo entre PS, PSD ou CDS e não é legítimo os que envolvam outras forças partidárias?”, defendeu.  

Costa argumentou, ainda, que foi o PSD a formar governo após 4 de Outubro mas que “há uma diferença da maior importância” relativamente à anterior legislatura: é que PSD e CDS não conseguiram uma maioria no parlamento. E a aproximação ao PS revelou “um total desprezo” pelo “diálogo democrático”, revelando que não tinham vontade de “corrigir” a sua política. “Não é um sinal de aproximação ao PS inventarem um ministério da Cultura, Cidadania e Igualdade”, sublinhou.

A quem questiona a clivagem ideológica entre PS e a extrema-esquerda, Costa também não deixou sem resposta. Lembrou que o PPM (Partido Monárquico) entrou num governo, não obstante tratar-se de um Estado Republicano. “Por isso que sentido faz 40 anos depois do 25 de Novembro de 1975 e quase 25 anos depois da queda do muro de Berlim considerar que o que foi a grande fractura e combate que o PS travou nas urnas e na rua contra o PCP e durante o PREC continua a ser a clivagem fundamental que existe na sociedade portuguesa?”, questionou. Para logo responder: “Pelo contrário hoje é hora de pôr termo a esse último resquício do PREC, é hora de pôr termos ao que ainda resta do muro de Berlim”.

Além disso, o secretário-geral dos socialistas lembrou que foi a direita a derrubar governos PS quando havia um compromisso de coligação, invocando a altura da adesão de Portugal à União Europeia, com Mário Soares e Jaime Gama, e “a nova liderança do PSD não hesitou em derrubar o governo dado o novo ciclo económico”.

Duas das propostas mais criticadas do programa eleitoral socialista dentro do PS foram a TSU e o regime de despedimento conciliatório. A primeira foi fortemente mitigada depois das negociações com BE e PCP – passa a haver descida apenas para trabalhadores que ganhem até 600 euros, sem que isso implique redução nas reformas futuras – e o despedimento conciliatório cai. “Mas que ironia! Afinal a negociação com BE e PCP acaba por satisfazer mais o Abraão do que aquilo que eu pensava”, brincou Costa, arrancando gargalhadas aos socialistas presentes. José Abraão, membro do PS na UGT, tinha sido uma das vozes mais críticas destas propostas. ​

sonia.cerdeira@sol.pt