2.Todavia, não é o estilo socrático de Costa que mais nos preocupa de imediato – o que nos inquieta é constatar que a Assembleia da República está António-Costando. Ou melhor: Portugal está António-Costando. António-Costar é o novo verbo da língua portuguesa que exprime a especial aptidão para distorcer a realidade, moldando os factos aos nossos desejos e conveniências. Estamos António-Costando quando preferimos desprezar o interesse público, a racionalidade e a objetividade – pela ambição pessoal, pela loucura partidária coletiva, pela volúpia de submeter o interesse dos portugueses às agendas pessoais e aos sonhos de infância de cada um. No fundo, um António-Costista é aquele que acredita que vale tudo na política para ter o poderzinho durante uns meses. Portugal vai sofrer? Vai. Portugueses vão ter uma surpresa muito desagradável quando, daqui a alguns meses, fizermos a reflexão sobre como foi possível a soberba de um homem prejudicar um país inteiro? Sem dúvida: o Zé-Povinho é quem mais vai sofrer com este António-Costar da classe política. São sempre os mesmos que pagam a fatura das imprudências e vaidades dos nossos políticos. E agora a fatura vai ser especialmente cara: ela virá detalhada com todos os registos das ocorrências do período do António-Costismo. Andarmos a António-Costar vai-nos custar muito caro. Ou melhor: o Costa vai-nos costar muito caro.
3.Há dois factos que surpreendem qualquer cidadão português, de esquerda ou de direita:
O descaramento – ou irrealismo crónico – de António Costa. Em determinado passo do debate, Costa vira-se para a bancada do CDS e questiona: “ não posso dizer que ganharam as eleições. Há tanto que o CDS não vai a eleições…já nem me lembro da última vez que foram a votos!”. Engraçado! O Costa é um humorista negro da pior espécie! É hilariante! É um maluco do riso! É que nós também já não nos lembramos da última vez que o PS ganhou eleições. Caro leitor, consegue ajudar-nos? Lembra-se da última vez que o PS ganhou eleições? Não? Como? Nas Europeias? Não: essa foi uma vitória por poucochinho…logo, segundo o nosso António Costa, não conta! Uma vitória por poucochinho é uma derrota, segundo o nosso Che Guevara lusitano. Quando é que foi a última vez que o PS ganhou eleições? Não me lembro…Ah! Como estão no Governo, talvez, tenham ganho as últimas eleições….Ai, não, não: o PS é Governo – mas perdeu as eleições…Quando é que o PS ganhou, pela última vez, eleições? Bem, temos o mesmo problema que António Costa tem em relação ao CDS: não nos lembramos da última vez que o PS teve a confiança da maioria dos portugueses…
António Costa desfez qualquer dúvida que pudesse restar: o PS virou definitivamente à esquerda. O tom adotado por Costa e a agressividade que emprestou à defesa da reversão dos transportes públicos para a titularidade pública fez lembrar Arménio Carlos! Costa já parece o novo líder da CGTP! Mais: António Costa conseguiu a proeza de ser bem mais radical do que Jerónimo de Sousa, no debate de ontem! O mundo está de pernas para o ar! António Costa é mesmo um artista… Registamos: Heloísa Apolónia, pela primeira vez, falou no Parlamento. Falou – e não gritou. Conseguiu manter os decibéis controlados. É um feito! Mais um mês e meio e – se o padrão se mantiver – vamos ver Heloísa como uma convicta “tia de Cascais”. Não temos nada contra: somos admiradores incondicionais da beleza de Cascais (já agora, que grande Presidente que tem sido Carlos Carreiras!) e até apreciamos (algumas) “tias de Cascais”…Portanto, Heloísa Apolónia pode vir a subir, alguns pontos, na nossa admiração…
4. Posto isto, avaliemos as principais intervenções da primeira parte do debate:
Luís Montenegro – Bem. Com um discurso coerente, eficaz, assertivo. Direto, sem rodeios, explorando as fragilidades da condição política de Costa. A melhor intervenção da tarde. Merece o 16;
Carlos César – Trauliteiro, como sempre (estará a disputar o lugar a Augusto Santos Silva?). Em tom de comício – e não em tom de debate parlamentar. Fez o discurso de conveniência para o PS. E, nessa medida, cumpriu o frete que Costa lhe encomendou. 12 valores;
Jerónimo de Sousa – Discurso inconsequente, vazio de conteúdo, péssimo na forma. Assim se vê, a atual fraqueza do PCP? Ou assim se vê, o frete do PCP? Merece nota negativa: 9 valores.
Catarina Martins – Uma sombra do que foi na campanha eleitoral. Só faltava mesmo pedir licença a António Costa para falar. Será apenas uma entrada de cordeiro para depois se tornar tigre contra Costa, daqui a uns meses? O BE não aguenta muito tempo neste registo sem chama de Catarina Martins…10 valores. Para já, ainda dá para a positiva.
Nuno Magalhães – Perdeu-se demasiado em questões prévias, perdendo força no seu argumento principal: a subserviência do PS em relação ao PCP na matéria dos transportes. Deveria ter sido mais duro, revelando com mais eficácia a situação política suis generis (e insustentável a médio prazo) de António Costa. … 13 valores.