“O povo é quem mais ordena”, diz Marcelo

A vitória foi de Marcelo. Em nome próprio. Sem dirigentes do PSD ou do CDS por perto para reclamar os louros, com o seu nome gritado vezes sem conta à medida que se aproximava do palco para o discurso que mais parecia de tomada de posse, ficou claro que o candidato chega a Belém com…

“O povo é quem mais ordena”, diz Marcelo

Pelo meio, alguém lançou até um "viva o rei". O entusiasmo monárquico será descabido numa eleição para a Presidência da República e até fará sorrir os adversários de Marcelo que o acusaram de não fazer campanha por achar que seria coroado pela sua popularidade, mas à sua maneira Marcelo foi o rei da noite eleitoral.

O Programa para Belém

De cima do palco, o candidato enunciou o seu programa para os próximos cinco anos e apresentou -se como o Presidente de todos e uma referência de esquerda. "É o povo quem mais ordena e foi o povo que me quis dar a honra de me eleger Presidente de Portugal", disse, no discurso, no estilo que usou ao longo de uma campanha cheia de locais e expressões muito mais à esquerda do que a "esquerda da direita" que o candidato identificou como a sua área política natural.
"Todos fazemos parte da pátria que somos. Não há portugueses vencedores nem vencidos nestas eleições presidenciais", anunciou Marcelo, sublinhando que será "a partir de agora o Presidente de todas as portuguesas e todos os portugueses porque a Constituição o consagra" e porque a sua consciência "o dita". A declaração é a já habitual para quem chega ao Palácio de Belém e Rebelo de Sousa evoca mesmo o legado de todos os que antes de si ocuparam o cargo, mas garante que não abdicará de ter o seu "próprio estilo".
E o estilo de Marcelo é direto. Sem rodeios e logo na noite das eleições, desenha o seu programa em cinco pontos. Fomentar a unidade nacional, reforçar a coesão social, promover as convergências políticas, incentivar o "frutuoso relacionamento entre órgãos de soberania e agentes políticos, económicos e sociais" e conciliar justiça social com crescimento económico. Na primeira noite do resto da sua vida como Presidente, Marcelo diz ao que vem e o que pretende fazer, definindo os próximo cinco anos como um tempo crucial para o país.

"Eu acredito que os próximos cinco anos não serão um tempo perdido. Serão um tempo de recuperação e de futuro", lançou Rebelo de Sousa, que quer ver o país a valorizar o passado e a memória, mas a olhar para o futuro. "É hora de refazer Portugal", declarou para enfatizar a importância dos tempos que aí vêm.

Para já, Rebelo de Sousa que "virar a página " da crise política e das crispaçōes. A palavra de ordem para os primeiros tempos em Belém é "desdramatização e pacificação económica, social e política ".

Uma noite diferente

Com uma vitória esmagadora, ganhando todos os distritos do país, contra nove outros candidatos, Marcelo Rebelo de Sousa teve uma noite eleitoral diferente de tudo o que é habitual.     Desde logo, pelo cenário: a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, onde Marcelo passou 50 anos da sua vida como aluno e professor. "Não foi uma opção política. Foi uma escolha de natureza afectiva", haveria de explicar logo no arranque do discurso, dois dias depois de ser notícia o mal-estar de alguns docentes da Faculdade pela utilização do espaço para uma noite eleitoral.
Depois, nos cumprimentos particularmente afetuosos dedicados aos seus "oponentes " nesta corrida para Belém, que recusou descrever como adversários. "Todos merecem o mesmo respeito".

Sem barões

Diferente foi também a ausência de grandes figuras dos partidos na plateia que se juntou no átrio da Faculdade. Contavam-se pelos dedos das duas mãos as figuras de PSD e CDS que se juntaram à festa da vitória. Telmo Correia, Duarte Pacheco, Leitão Amaro, Teresa Morais, Filipe Lobo D'Ávila e Rui Machete foram os que vieram até à sede improvisada do candidato vitorioso. Na primeira fila, esteve Sofia, a filha mais nova do candidato.

Entre os que foram comemorar a noite, estavam sobretudo os que fizeram o trabalho invisível de preparação da campanha é de recolha de assinaturas, com uma muito empenhada Virgínia Estorninho a comandar um conjunto de apoiantes que passaram a noite a contar as vitórias, freguesia a freguesia, distrito a distrito. "Até Beja ganhámos", ouvia-se na sala, onde o entusiasmo só foi completo quando os resultados se tornaram firmes e se percebeu que a eleição estava ganha à primeira volta. Até essa altura, notava-se que entre os apoiantes de Marcelo a vitória com sabor a derrota da PàF não está esquecida. "Da outra vez também comemorei e depois fiquei a chuchar no dedo", comentava uma das apoiantes de Rebelo de Sousa. Desta vez, não foi assim. "Agora não há cá coligações para dar a volta ao resultado ", ironizava ao fim da noite outro dos que estiveram com Marcelo na campanha.

margarida.davim@sol.pt