António Filipe: ‘Não posso excluir que Durão Barroso seja chamado à comissão’

A experiência com o BPN e o BES_colocam «pressão positiva» nos deputados da comissão do Banif. O deputado do PCP entende que «seria desejável» ter a colaboração da UE.

A PGR informou que não existem inquéritos criminais abertos relativos ao Banif. É uma boa notícia para que os trabalhos da comissão parlamentar de inquérito (CPI) decorram sem restrições de segredo de justiça?

O que foi dito é que não há nada que obstaculize a que o inquérito parlamentar possa prosseguir. Será proposto, na reunião da próxima quinta-feira, que até à discussão na generalidade do Orçamento do Estado a comissão proceda às formalidades prévias, incluindo aprovar o seu regulamento e elabore já a lista de audições a realizar. As audições deverão ser realizadas logo a seguir à aprovação do OE na votação final global.

Não havendo segredo de justiça, o segredo bancário continuará a ser um obstáculo?

Existe um parecer da PGR (que foi comunicado à AR na parte final do inquérito parlamentar ao caso BES), do qual decorre a doutrina de que o segredo bancário e outros segredos profissionais não podem ser invocados na comissão de inquérito – a não ser que esteja em causa a salvaguarda de direitos fundamentais. Iniciamos os trabalhos da CPI na convicção de que não serão opostos legitimamente a esta comissão segredos que possam obstaculizar o cabal esclarecimento da verdade.

Depois das comissões de inquérito ao BPN e ao BES, há hoje melhores condições para investigar um banco?

Sim. Há uma experiência que a AR adquiriu e há uma armadura jurídica que nos facilita relativamente a inquéritos anteriores, em que foram invocadas confidencialidades que entravaram os trabalhos. Esta comissão estará em melhores condições de conduzir os seus trabalhos de forma mais assertiva para cumprir o seu objeto, que é obter todo o esclarecimento possível sobre as circunstâncias que levaram a mais um descalabro bancário com consequências profundamente negativas para os contribuintes.

Que responsabilidades vão ser apuradas?

Desde logo ao nível da administração do banco – como foi possível chegar a esta situação, em que teve de recorrer a fundos públicos. Há depois responsabilidades a nível governamental, sendo que se o Estado investiu dinheiro na capitalização do banco, tinha a obrigação de acompanhar a forma como esse dinheiro era utilizado. E há as responsabilidades da supervisão bancária, que mais uma vez se mostrou ineficaz e incapaz de evitar o descalabro de um banco. Existem ainda esclarecimentos a obter sobre se o desfecho foi inevitável ou se havia outras soluções.

A Comissão Europeia pode vir a ser chamada a esclarecer a venda ao Santander?

Seguramente. Eu creio que a intervenção que a Comissão Europeia teve neste processo é algo que também deve ser objeto de atenção por parte da comissão de inquérito.

Não há nenhuma limitação constitucional ou legal?

A CPI poderá solicitar a colaboração de entidades da União Europeia, sem obrigatoriedade. Mas, do nosso ponto de vista, seria desejável que essa colaboração existisse.

Durão Barroso é português e já não está em funções como presidente da Comissão Europeia. São circunstâncias que pressupõem uma maior exigência na colaboração com a comissão?

Os cidadãos nacionais são obrigados a dar colaboração e obrigados a depor. Nenhum cidadão está isento, havendo pessoas que, pelos cargos desempenhados, têm a prerrogativa de depor por escrito. Mas é a única diferença.

Juntando o que diz, há a possibilidade de Durão Barroso ser chamado pela comissão de inquérito.

Não o posso excluir.

A comissão ao BES foi considerada exemplar. Há uma pressão para manter esse nível no Banif?

Há e essa pressão é positiva. Espero que esta comissão seja exemplar – não no sentido de que todos tenham de estar de acordo no final – mas que nada fique por esclarecer. Esse é o objetivo fundamental da comissão.

O resultado das comissões de inquérito aos bancos reforçam a sua convicção de maior controlo público da banca e até da vantagem da sua nacionalização?

O que temos assistidos reforça a minha convicção de que a banca desempenha um papel demasiado importante para ser deixada nas mãos dos banqueiros. E portanto impõe-se que haja efetivamente um controlo popular, nacional, sobre a atividade bancária. Aquilo que se tem passado – e não me refiro apenas às comissões de inquérito mas a uma realidade que todos como cidadãos podemos verificar – reforça a necessidade de um controlo público sobre a atividade bancária. Mas essa minha convicção não vai interferir na forma como vou conduzir os trabalhos da comissão.