PCP e BE em difícil convivência

A relação entre o PCP e o BE é descrita como inexistente, no quadro do relacionamento da maioria de esquerda que suporta o Governo. “Eles simplesmente não se falam”, diz fonte governamental ao SOL. Como na assinatura dos acordos à esquerda, em que PCP e BE estiveram em momentos diferentes a assinar papéis diferentes com…

A rivalidade entre os partidos não é alheia a este modus operandi. Oficialmente, essa relação difícil é  negada. Mas desde a entrada em cena do Bloco, em 1999, pondo em causa a hegemonia dos comunistas na esquerda, que as picardias são mútuas. E as últimas eleições presidenciais, dando a segunda vitória do BE sobre o PCP, logo após as legislativas, elevaram o nível de acusações para um patamar inédito.

O choque presidencial

Desde 2001 que BE e PCP medem forças nas presidenciais, e até agora sempre os comunistas tinham ficado por cima. Em 2001, António Abreu teve o pior resultado de sempre (até 2016) de um comunista, mas ainda ficou 100 mil votos acima do bloquista Fernando Rosas. Cinco anos depois, houve um ‘combate de chefes’ entre Jerónimo de Sousa e Francisco Louçã. O líder comunista ganhou facilmente, com uma vantagem de 180 mil votos.

Depois de, em 2011, o candidato do BE e do PS serem o mesmo – Manuel Alegre – o Bloco tirou  agora a desforra com Marisa Matias. O dirigente João Semedo foi pouco diplomático na análise eleitoral: “O candidato do PCP esteve em risco de ficar atrás de ‘Tino’ de Rans e acabou a noite com uma vantagem de apenas 30 mil votos, o que dá bem ideia da dimensão do descalabro”.

A ‘ferroada’ não era gratuita. _Na noite eleitoral, Jerónimo de Sousa, agastado em explicar o pior resultado de sempre de um candidato presidencial comunista, saiu-se com a célebre referência à “candidata assim mais engraçadinha” – que foi lida como uma referência machista a Marisa Matias. O líder pediu desculpa e negou que fosse um ataque à candidata, mas o mal estava feito. Na mesma noite, o bloquista Jorge Costa exultava com a vitória de Marisa: “(Teve) mais votos que Maria de Belém e Edgar Silva juntos, quase metade da votação de Sampaio da Nóvoa. Quem pensou que o resultado do Bloco nas legislativas era mero fruto de uma campanha eficiente, pense outra vez”. Costa não atacou diretamente o PCP, mas disse que “será interessante acompanhar a leitura dos resultados pela parte do PCP”.  Comunistas e bloquistas estavam já nesta altura irritados.

Seguiu-se João Semedo que acusou o PCP_de “infelizes expressões de sectarismo e arrogância”. O deputado do PCP António Filipe lamentou, por seu turno, a “virulenta cruzada anti-PCP” e a “atitude de ‘anticomunismo de esquerda’” por causa do episódio da ‘engraçadinha’. E, recuperando anteriores derrotas do BE, António Filipe marcava a diferença: “Não vi ninguém do PCP referir-se depreciativamente ou desconsiderar o BE por esses factos. Depois os sectários somos nós?”, escreveu no Facebook.

Comité Central critica Marisa

A nível oficial, a linguagem dos partidos acompanhou o registo crispado. “Assinala-se a opção  populista assumida pela candidatura de Marisa Matias, apoiada pelo BE, de em vários momentos fazer da candidatura de Edgar Silva a sua adversária, recorrer à falta de rigor e de respeito pela verdade, bem como à exploração demagógica de temas de ocasião”. Este não foi um desabafo no Facebook, mas uma das conclusões políticas do Comité Central do PCP sobre as presidenciais.

Nas bancadas parlamentares dos dois partidos desvaloriza-se a polémica e sugere-se que ambos até tendem a normalizar as relações. Mas ainda esta semana, no Avante!, Carlos Gonçalves, dirigente da Comissão Política do PCP, apagou o BE da ‘fotografia’ sobre a construção de um governo apoiado pela esquerda. Para Gonçalves, o afastamento da direita do poder foi feita “na base da iniciativa do PCP e da posição conjunta PS-PCP”.