Nas previsões desta semana, Bruxelas expressa dúvidas sobre o crescimento económico e as contas públicas em Portugal. O Programa de Estabilidade prevê que o défice orçamental atinja 2,2% do PIB, mas Bruxelas espera que este indicador fique nos 2,7%.
Portugal pode ser alvode sanções
No défice estrutural deste ano – um indicador cada vez mais relevante em termos europeus porque define o esforço de austeridade necessário para cumprir o Pacto de Estabilidade e Crescimento –, as contas de Bruxelas e de Lisboa também não batem certo.
O Governo prevê uma descida deste indicador em 0,3 pontos pontos percentuais, mas a Comissão vê um agravamento de 0,2 pontos. Esta diferença representa cerca de 900 milhões de euros. E como Bruxelas indica que há um «volume limitado de medidas de consolidação orçamental», é quase certo que exigirá mais medidas nas recomendações ao país que emitirá dentro de alguns dias, ao abrigo do chamado semestre europeu.
Segue-se depois um período de discussão política das contas públicas portuguesas, no Eurogrupo e no Conselho Europeu. Os ministros das Finanças e os chefes do Governo da UE tendem a seguir as opiniões da Comissão, pelo que deve haver recomendações para Portugal corrigir as contas públicas – e pode até haver sanções a Portugal pela derrapagem do défice do ano passado, que ficou em 4,4% devido ao Banif.
Será com base nas recomendações do Conselho Europeu que o Governo terá de elaborar o Orçamento do Estado para 2017 – o que fecha este ciclo do semestre europeu, que visa assegurar o cumprimento do Pacto de Estabilidade. Com as regras em vigor, Portugal terá de enviar a Bruxelas, até 15 de outubro, um esboço do orçamento.
E se nessa altura as divergências entre Bruxelas e Portugal ainda forem visíveis, sobe a probabilidade de se repetir o cenário que se viveu em fevereiro, quando António Costa e Mário Centeno foram forçados pela Comissão a somar medidas de mil milhões de euros ao Orçamento do Estado para 2016, para que tivesse luz verde de Bruxelas.
OE com visto prévio
Enquanto os Programas de Estabilidade beneficiam de uma certa complacência na avaliação por serem documentos de médio prazo, o Orçamento doEstado a executar em cada ano é o alvo prioritário da pressão de Bruxelas, no que diz respeito ao cumprimento do Pacto de Estabilidade.
Com novas regras desde 2013, o Orçamento precisa de um visto prévio de Bruxelas, que pode exigir nessa altura medidas adicionais. «Nos casos excecionais em que a Comissão, após consulta do Estado-membro em causa, identifique no projeto de plano orçamental qualquer incumprimento particularmente grave das obrigações de política orçamental estabelecidas no PEC, deverá, no seu parecer sobre o projeto de plano orçamental, requerer um projeto de plano orçamental revisto» – lê-se na legislação europeia.
Caso o orçamento português venha a merecer reparos de Bruxelas, as novas medidas teriam de ser definidas «o mais rapidamente possível, no máximo até ao final de novembro», a fim de «assegurar a correta integração das orientações políticas da União para o domínio orçamental na preparação do orçamento nacional».
Costa quer ‘mutualização progressiva da dívida’
Para já, o Governo continua, porém, a mostrar-se confiante de que haverá margem para negociar e evitar mais austeridade. Isso mesmo fica patente na moção de estratégia que António Costa vai levar ao Congresso do PS, em junho.
O líder socialista defende «uma parcial e progressiva mutualização europeia das dívidas» soberanas e explica que a estratégia do PS passará sempre por participar nas negociações e não por rasgar tratados. «Não se trata, evidentemente, de perfilhar uma atitude de confronto com as instituições europeias: há bastante mais por onde escolher entre a obediência e a subserviência. Do que se trata é de participar mais ativamente, e com espírito construtivo, no projeto europeu», lê-se na moção de António Costa.
Isso mesmo já tinha também sido dito esta semana pelo secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Pedro Nuno Santos. Em entrevista à RTP, defendeu que a «dívida tem que ser negociada, reestruturada para reduzir os encargos anuais», mas sublinhou que isso deve acontecer «sempre no quadro europeu».
Costa tem acompanhado com interesse a discussão que está a ser feita no seio do Eurogrupo sobre a revisão de conceitos técnicos, como o de défice estrutural ou o de PIB potencial. No Governo acredita-se que há a possibilidade de Portugal conseguir beneficiar de regras mais vantajosas associando-se a outros países como a Itália, a Grécia e a França.