Mas António Costa e Alexis Tsipras, ambos no poder, parecem mais unidos do que nunca. O primeiro-ministro esteve na Grécia com Tsipras e assinou uma declaração conjunta com o primeiro-ministro grego em que são defendidas medidas alternativas à austeridade. António Costa deixou ainda nota de que a mudança não se faz pela «confrontação» mas por via do «diálogo» – e isso serviu para quem o quisesse ouvir dentro e fora de Portugal.
Bloco diz que a Grécia é exemplo negativo…
Do lado oposto, está agora o BE.Catarina Martins insiste que a reestruturação da dívida – a mesma que foi abandonada pelo Syriza, dadas as condições impostas por Bruxelas – «tem de ser conduzida pelo Governo português». Em entrevista esta semana ao DN, a porta-voz do BE apontou mesmo o exemplo da Grécia (pela negativa), afirmando que «ficar à espera de uma solução europeia» é algo que «destrói a economia».
E é por não querer ficar à espera que o BE exigiu ao PS, em troca do seu apoio para formar governo, a criação de um grupo de trabalho para o estudo da renegociação da dívida. Dos encontros pouco ou nada se sabe. Apenas que o Bloco de Esquerda não quer ser apanhado na curva e ver-se obrigado a engolir a acusação que fez ao Syriza relativamente ao processo do referendo. Tsipras depois, de conseguir do seu povo um ‘não’ à austeridade, acabou por aceitá-la em versão redobrada.
Mas se António Costa dá uma no cravo e outra na ferradura – ou seja, permite a criação de um grupo de trabalho que senta à mesa PS e BE ao mesmo tempo que dá um sinal político de que está com o Syriza –, Mário Centeno não cede um milímetro na posição oficial: o cumprimento rigoroso dos compromissos europeus. Esta segunda-feira, à saída de uma reunião extraordinária do Eurogrupo para discutir o resgate da Grécia, o ministro das Finanças recusou colocar o país à boleia da Grécia. «Não. É altura de nos concentrarmos nas nossas obrigações. (…) O Governo português sabe bem o rigor e a exigência que tem de pôr na sua ação. É esse caminho que devemos trilhar», frisou o governante.
… e procura nova esperança à esquerda
As declarações de Centeno – que mais não fez do que reiterar o que já havia dito em fevereiro durante o debate na generalidade do Orçamento do Estado – não são bem recebidas pelo BE.Na moção de agregação entre as principais correntes do partido e que será votada na Convenção de junho, o BE insiste na necessidade de ser Portugal a conduzir o processo de renegociação.
E no dia a dia já se fala em novas esperanças para a esquerda europeia, depois de Fernando Rosas, por exemplo, ter admitido em fevereiro ao jornal i que «o Syriza foi uma derrota séria da esquerda europeia». Marisa Matias ensaiou uma aproximação ao Movimento para a Democracia na Europa 2025 (DiEM25), lançado no início do ano por Yanis Varoufakis, o ex-ministro das Finanças do Governo de Tsipras que bateu com a porta depois do aumento do IVA e do corte nas pensões mesmo depois do ‘Não à austeridade’ ter ganho o referendo popular.
Em abril, Zoe Konstantopoulou, ex-presidente doParlamento helénico, apresentou o seu novo partido político: Viagem para a Liberdade. O partido assenta nestes pilares: Democracia, Justiça, Transparência, Direitos, Redução da Dívida e Pagamento da Dívida Alemã da II Guerra. Em Lisboa, o novo projeto grego que se junta à esquerda europeia foi recebido com agrado e com esperança.
PCP aponta erro do Syriza: alimentou falsas esperanças
Numa semana em que a Grécia voltou a ser falada, depois dos confrontos na rua (ver texto ao lado), também Jerónimo de Sousa saiu a terreiro para marcar posição. «Há quem diga que não aprendemos com a Grécia. Mas isso é virar o bico ao prego. (…) O grande erro do governo grego foi não querer sair do euro, ao contrário, foi ter alimentado a ilusão de que era possível eliminar a política de exploração (…) dentro do euro», defendeu o líder dos comunistas.
OPCP sempre recusou entrar no coro de esperança que invadiu a esquerda com a vitória do Syriza, não obstante o partido ter reconhecido então que a vitória do partido de esquerda radical na Grécia representava também a «derrota dos partidos» que governaram até então a Grécia. E que são, «com a União Europeia, os responsáveis pelo desastre económico e social», reagiu então João Ferreira.