Congresso PS: António Costa já está à espera de eleições legislativas

António Costa é um líder que tem conseguido feitos históricos para o Partido Socialista. O congresso que decorreu este fim de semana na FIL, em Lisboa, não foi excepção – o facto do congresso foi um dos hinos escolhidos para intercalar as intervenções dos militantes no sábado e na manhã de domingo. 

Nada mais, nada menos que a música da série “CSI – Investigação Criminal” – “ Out Here in The Field”. Ora, considerando as investigações criminais que recaiem sobre ex-dirigentes de topo do PS, a escolha da música que retrata a investigação criminal da unidade das polícias de Nova Iorque, Las Vegas ou Miami só pode ter sido uma piada marota dos animadores de serviço do PS e da JS. 

Quanto ao resto, o que dizer? Confirma-se que António Costa é um político muito habilidoso: conseguiu perorar durante uma hora e mais alguns minutos adicionais sem colocar em risco o acordo com as forças políticas da extrema-esquerda que dirigem a geringonça, que é dizer, sem irritar comunistas e bloquistas. Como? António Costa – que tem fama de político corajoso – seguiu o caminho mais fácil: abordar apenas temas pouco controversos, expondo matérias em que o acordo já foi obtido ou é dispensável. Sobre questões estruturantes para o futuro do país, que exigem uma ampla discussão na economia portuguesa e cuja execução plena não prescindem de um acordo com os partidos moderados e de poder (PSD e CDS) – António Costa não pronunciou uma palavra. Uma letra sequer. 

Isto remete-nos para a análise do discurso de encerramento do congresso do PS. Foi um discurso sem novidades, nem notas dignas de registo. Apenas cumpre salientar quatro aspectos essenciais, até porque revelam a estratégia e o pensamento de António Costa, que condicionarão a sua actividade nos tempos mais próximos: 

i)    António Costa falou muito de passado – e pouco ou nada de futuro. Explicamos: o líder do extremo-PS apresentou aos militantes (e aos portugueses) o seu relatório de contas dos últimos meses de Governo (o que fez nos vários sectores de actividade governativa) e o que está a preparar para entrar em vigor nas próximas semanas. Quanto a uma visão para o futuro de Portugal, absolutamente nada. Um vazio autêntico. Como sabemos, quando um Primeiro-Ministro em exercício de funções se limita a justificar o que fez e a puxar pelos méritos da sua governação – já está em plena campanha eleitoral. Os próximos meses da geringonça não passarão de pura e elementar campanha. Dúvida: Portugal, com a conjuntura política e económica gravosa, aguentará meses de campanha eleitoral? Costa sabe – ao contrário do que sugere a propaganda oficial – que vai a eleições brevemente; 

ii)    António Costa quer limitar à actividade do Partido Socialista ao mínimo. Como já se viu no Congresso: apenas a tarde de sábado foi reservada à intervenção dos militantes, tendo a discussão das moções sectoriais ocorrido durante a manhã num hotel lisboeta! E o ponto alto foi um debate com Ana Drago e Pacheco Pereira! Percebe-se: Ana Drago foi para “charmar” a extrema-esquerda, mostrando abertura a grupúsculos de esquerda não democrática; Pacheco Pereira serviu como manobra de diversão para evidenciar que o PS mantém a sua vocação de partido moderado. Aliás, foram vários os militantes que, ao longo dos trabalhos do Congresso, evocaram precisamente a participação de Pacheco Pereira para refutar a viragem do PS de António Costa à extrema-esquerda; 

iii)    António Costa – adjuvado pelo líder da JS e pela sua dama de honor Ana Catarina Mendes – colou, ao longo de todo o congresso, a etiqueta de neo-liberal a Passos Coelho. Percebe-se porquê: primeiro, permite acantonar o PSD à direita, escondendo que o Governo que lidera é apoiado por dois partidos extremistas, como são o PCP e o BE; segundo, permite criticar, dando a aparência de que não se critica, Francisco Assis com método e virulência;

iv)    António Costa encontrou o ponto de convergência máximo com as forças de extrema-esquerda e com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa: a crítica às instituições da União Europeia – e às forças políticas e aos países – que persistem em manter a discussão sobre a possível aplicação de sanções a Portugal por incumprimento das metas orçamentais. Este foi o ponto mais forte do discurso de Costa – e não temos qualquer problema em subscrever as declarações de António Costa sobre o estado actual da União Europeia. Juncker ao responder que “França é a França” expôs-se ao ridículo – e António Costa explorou esse ridículo com mestria política.

Tudo dito e somado, eis a conclusão: a geringonça vai cair – mas António Costa vai aguentar. Pelo menos, será um adversário político duro para a direita, sobretudo para um líder como Passos Coelho, que (independentemente da justiça relativa deste juízo) está associado a um passado muito duro para os portugueses; e que não tem revelado capacidade para ir além desse passado. 

Nota discurso de António Costa: 13 valores

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