Eurico Brilhante Dias: ‘Serei sempre um segurista’

Aos 44 anos, vindo do segurismo, Eurico Brilhante Dias é um dos novos membros do Secretariado nacional do PS. Seguro, afirma, estava mais à esquerda do que Assis e Sócrates

Eurico Brilhante Dias: ‘Serei sempre um segurista’

Esteve nos secretariados de António José Seguro, está no Secretariado saído do último Congresso. Agora, é o novo símbolo da unidade do PS. Está contente com isso?

Ser o símbolo da unidade do PS agrada a qualquer militante. Antes de mais é uma leitura da ação do secretário-geral que entendeu convidar alguém que, como toda a gente sabe, não só apoiou outro candidato nas primárias, como discordou da solução proposta depois das eleições de outubro de 2015. É algo que fica a crédito do secretário-geral. O facto de eu aceitar também tem uma leitura política. Independentemente das posições políticas que cada um assumiu ao longo do tempo, os militantes do PS têm a obrigação de contribuir para que a solução política maioritária possa ter condições de se concretizar com êxito. Curiosamente, a inclusão na Comissão Política nacional de Maria de Belém Roseira é que para mim foi uma das surpresas.

Foi a sua candidata presidencial. Nunca pensou que fosse para a Comissão Política?

Não pensei. Se calhar mal. É uma demonstração da disponibilidade e humildade que lhe fica muito bem a ela. E também fica muito bem ao secretário-geral convidá-la para a Comissão Política Nacional (CPN). Mas há inúmeros camaradas que apoiaram António José Seguro que neste momento estão na Comissão Política.

Não está Francisco Assis, que disse que não queria. E não estão dois seus antigos colegas e amigos íntimos de Seguro, como António Galamba e Miguel Laranjeiro. António Galamba tem sido muito crítico do Governo.

O António Galamba e o Miguel Laranjeiro são meus amigos e partilharam comigo momentos muito importantes do partido. Foram peças importantes na vitória que o PS teve nas autárquicas de 2013. Acho que o partido lhes deve muito, pelo seu trabalho e tenacidade. António Galamba decidiu-se por uma aproximação a esta fase da vida política que eu sempre achei que tornaria difícil a sua participação nos órgãos. O confronto é evidente e penso que ele próprio não tinha essa expectativa. O caso do Miguel Laranjeiro surpreendeu-me mais, mas não conheço as razões por que não está na CPN.

Na imprensa continua a ser designado como o segurista Eurico Brilhante Dias. Chegou a altura de retirar o adjetivo?

É curioso que nas notícias escrevam ‘segurista’ e ‘ex-segurista’. Fiquei ali sem saber se era segurista ou ex-segurista (risos).

Então o que é?

É evidente que a minha notoriedade pública e política surge quando entrei para o Secretariado liderado por António José Seguro em 2011. É normal que, até pela minha forte participação na campanha das primárias, me associem ao segurismo. Agora, o partido tem mais vida para além do debate das primárias e hoje tem uma incumbência fundamental que é governar o país. Essa é a nossa primeira prioridade. Mas devo ser sincero: na lógica de que apoiei António José Seguro e tenho por ele não só amizade como elevada admiração. Nessa dimensão serei sempre segurista.

Há qualquer coisa de paradoxal nesta coisa toda. Assis foi o candidato contra Seguro na sucessão de Sócrates. António Costa e quem estava com ele apoiavam Assis. E agora muitos apoiantes de Seguro estão mais próximos de Assis do que de Costa… Como vê isto?

É uma belíssima pergunta e levar-nos-ia a uma leitura mais profunda sobre a natureza do partido e sobre as posições que se vão assumindo. O António José Seguro, como candidato em 2011, até pela personalidade e pelo trajeto político que tinha era um candidato bastante mais central, ou à esquerda, do que seria o Francisco Assis. Isso parece-me evidente. O António José Seguro que eu conheço é mais à esquerda que José Sócrates. O António José Seguro tem na altura consigo muita gente que pensa que o PS tem que ter um posicionamento claramente mais à esquerda que Sócrates.

No Congresso, Marcos Perestrello, secretário de Estado da Defesa, disse que o PS precisava de ter cuidado com os resultados governativos, porque no dia em que o eleitorado perceber que se está a sobrevalorizar o taticismo em detrimento do interesses do país, as coisas vão correr mal.

Foi um bom discurso. Acho que Marcos Perestrello alertou para o facto de o PS ser um partido central. É um partido de esquerda, mas é um partido central no espetro político português. E essa centralidade não deve ser alienada. Em várias áreas de natureza setorial, o PS deve continuar a discutir com o PSD e o CDS.

Imagine que aquilo que o Eurico e alguns dos seus camaradas defenderam na noite de 4 de outubro, o PS ir para a oposição, se tinha concretizado.

Nunca ninguém defendeu uma coligação com PSD/CDS.

Alguém teria de aprovar o Orçamento do Estado…

Isso é um facto. Como Manuela Ferreira Leite e Marcelo Rebelo de Sousa aprovaram orçamentos de governos PS.

Há tanto socialista contente com Marcelo que daqui a bocado chegamos à conclusão que a estratégia da direção do PS de abstenção face às presidenciais parece que estava certa…

Houve tomada de posição do PS.

Mas nunca soubemos quem o secretário-geral apoiava.

Em democracia ganha quem tem mais votos, não necessariamente quem tem mais razão. Considerei e considero que era útil para o país ter um Presidente da República de centro-esquerda. Maria de Belém Roseira poderia ter sido a personalidade que encarnava esse espírito.

Faça-me o seu autorretrato. Quem é o Eurico Brilhante Dias? É do Sporting, casado, tem filhos…

Sou do Sporting, casado, tenho três filhos…

Pequeninos?

A Maria fez 16 anos, o Miguel tem 13 e a Inês tem nove. Sou professor de Gestão no ISCTE desde  2000. Tive ali um interregno de cinco anos em que estive na API, que hoje se chama AICEP. Sou católico.

Praticante?

Sim. Mas menos do que devia, se calhar. Ser católico faz parte de uma das minhas dimensões.

Como é que um católico vê isto das barrigas de aluguer?

Com naturalidade. Nas duas vezes votei a favor da interrupção voluntária da gravidez. O catolicismo é uma questão de fé e também é uma questão cultural e familiar. Os meus avós eram católicos praticantes, a minha família é católica, a família da minha mulher é católica. Os meus filhos fizeram a catequese. As minhas duas filhas são escuteiras. A dimensão social e comunitária da Igreja sempre me atraiu. Mas nas questões de natureza comportamental sempre me senti livre para votar favoravelmente as barrigas de aluguer, a IVG, a procriação medicamente assistida, os direitos LGBT… Como cristão, nunca me senti compelido a ter posições mais conservadoras. Aliás, o progresso era o que me aproximava mais da doutrina social da Igreja do que propriamente uma posição conservadora.