Numa relação, pessoal ou profissional, as pessoas tentam superar as divergências iniciais e procuram encontrar um modo de vida que seja confortável para ambas as partes. Entre avanços e recuos há de chegar-se a algum lugar. Quem vai, por exemplo, para uma empresa e leva os seus vícios passados terá de os arrumar numa prateleira se não quiser entrar em conflito com a filosofia praticada na nova casa. O problema surge quando os casamentos, pessoais ou profissionais, acontecem quase por uma imposição superior ou porque ambas as partes acreditam que vão conseguir superar as divergências de fundo e que serão felizes para sempre.
É óbvio que as primeiras divergências são superadas com maior ou menor dificuldade, até porque está tudo muito fresco. As coisas ainda não estão bem encarriladas mas hão de entrar nos carris, acredita-se.
Depois do deslumbramento inicial – os trabalhadores quando entram cheios de gás acabam por não revelar bem a sua essência e não se apercebem da nova realidade – as pequenas divergências começam a ganhar outros contornos e outra dimensão. Se os trabalhadores e os novos patrões – ou os novos casais – comungam dos mesmos princípios e o sucesso de uns é o sucesso dos outros tudo se ultrapassa.
Mas quando os objetivos e as estratégias de vida são diferentes é apenas uma questão de tempo até tudo se desmoronar. Vem esta conversa toda a propósito da relação do BE e do PCP com o governo de António Costa.
Era natural que o Orçamento colocasse a nu as divergências mais profundas – e o que dizer dos dois partidos terem de aceitar os ordenados milionários dos administradores da CGD, quando fazem uma caça aos impostos dos mais ricos? Catarina Martins, líder do BE, que gosta de vestir a pele de justiceira do povo e se gaba de enfrentar os poderes de Bruxelas é agora confrontada com a traição do seu “namorado”.
O líder do Governo Costa – ou Centeno – bem pode dizer que este Orçamento é de esquerda, mas se fosse à medida do BE Bruxelas nunca o deixaria passar. E a questão é precisamente essa. Até quando Catarina aguentará os “affairs” de Costa com a rapaziada da União Europeia? As divergências em privado ainda não são muito visíveis na rua – daqui a uns meses logo se verá se o amor resiste a tudo, até a um Orçamento feito de retalhos.