Pedro Guerra: “O Benfica tem sido o mais prejudicado pela arbitragem”

Jornalista, passou para a política e atualmente é uma das caras mais conhecidas do clube da Luz… fora de campo. Fala em nome próprio, mas considera ‘um privilégio servir o SLB’.

Como é que uma criança a viver em Angola e filho de pai sportinguista se torna adepto do Benfica?

A culpa foi de Eusébio! Cresci a ouvir os relatos do Benfica e os golos de Eusébio. Para mim, foi o melhor jogador de sempre.

O jornalismo foi uma das áreas onde se destacou [jornal O Independente]. O que recorda desses tempos?

O Independente foi, sobretudo, um espaço de liberdade e de denúncia de muitas situações que eram escamoteadas e escondidas. Orgulho-me de ter participado no jornalismo de investigação e quando isso acontece coleciona-se alguns inimigos para o resto da vida. São ossos do ofício! 

Mais tarde foi convidado para ser assessor no Ministério da Defesa no Governo de Durão Barroso [2002]. Alguma vez pensou que o seu futuro iria passar pelo futebol?

Nessa altura não, apesar de gostar muito de futebol e do meu amor ao Benfica ser conhecido. No Governo aprendi muito. Quando se serve o país a nossa visão das coisas muda muito.

Como recebeu o convite para a Direção da Benfica TV?

Foi algo natural. Tratou-se de um desafio que, confesso, temi que pudesse não correr bem. Quando nós fazemos algo onde a paixão, por vezes, se sobrepõe à razão, é sempre complicado.

Considera que voltou a uma ‘zona de conforto’?

Não. Diria que se trata de uma ‘zona de prazer’. Servir o Sport Lisboa e Benfica é um privilégio.

Como é a sua relação com Luís Filipe Vieira?

É uma relação de imenso respeito. Admiro muito Luís Filipe Vieira, que considero o melhor e mais importante presidente da história do clube. Sob a sua liderança, o Benfica resgatou e recuperou a sua credibilidade, a sua idoneidade e a sua reputação. Sabemos bem que isso é algo que leva muito tempo a conquistar, mais tempo ainda a recuperar e resgatar, mas que, por vezes, se perde em segundos ou nunca se chega a alcançar.

Tornou-se num dos rostos mais conhecidos do Benfica também pelos programas em que entrou. Sente que as pessoas têm uma imagem retorcida da sua personalidade?

As pessoas dizem-me isso quando me conhecem. Quem lida comigo, diariamente, sabe bem que aquela minha faceta mais dura, mais truculenta é apenas fruto do debate acalorado. Quando se discute futebol, quem é que não o faz de uma forma mais acesa? Futebol é paixão, emoção e quando isso acontece…

Como é que se define?

Sou uma pessoa de bem com a vida. Não tenho ódios de estimação. Encaro a vida com otimismo, sobretudo em relação ao Benfica. Acho que o melhor está para vir!

Chegou a frequentar o curso de direito [embora não tenha concluído]. Sente que tirou dessa aprendizagem lições que o ajudam no momento de defender o clube?

Claramente. Não concluí, mas estou a pensar fazê-lo. Os anos no jornalismo ajudaram-me muito na capacidade de argumentação para defender o clube.

Quanto tempo precisa em média para preparar um programa como o Prolongamento [entre recortes de jornais/estudo de lances…]?

Não sei dizer. Mas asseguro que são horas. Acho que quem participa num programa de um canal que é líder em Portugal deve preparar-se muito bem. Falo com muita gente entendida nas várias matérias, leio muito e tento documentar-me para sustentar tudo aquilo que digo, que é meramente a minha opinião pessoal.

O Benfica acaba de falhar um dos objetivos da época ao ser eliminado nas meias-finais da Taça da Liga?

Objetivamente, um dos objetivos para esta época falhou. Já conquistámos a Supertaça e ainda temos a Taça de Portugal e o Campeonato, o principal objetivo desta época. E na Liga dos Campeões acredito que poderemos melhorar o feito da época passada.

O que falhou no jogo contra o Moreirense?

Falhou muita coisa. À cabeça, falhou a arbitragem, pois dois golos do Moreirense foram irregulares. Também houve falta de eficácia, pois o Benfica criou muitas oportunidades. Eu contei uma dúzia!

Faltou sorte?

A falta de sorte foi evidente, pois só o Jonas, que considero o melhor jogador a atuar em Portugal, atirou duas bolas aos postes. Mas o Moreirense bateu-se muito bem, o seu guarda-redes brilhou e a equipa não tem culpa dos erros de arbitragem. No segundo golo houve uma falta evidente sobre Eliseu, que foi claramente impedido de disputar a bola. Estranho muito que o árbitro assistente e o árbitro de baliza nada tenham assinalado. No terceiro golo, o marcador parte de posição de fora de jogo e o árbitro assistente voltou a falhar. Verdade se diga que não aconteceu nada de novo, pois o Benfica tem sido a equipa mais prejudicada, esta época, pela arbitragem. A diferença é que os responsáveis do Benfica não se têm desculpado com os erros de arbitragem, contrariamente ao que acontece com o FC Porto e com o Sporting.

Carrillo continua em baixo de forma. A titularidade concedida ao jogador no lugar de Cervi foi um erro?

Depois do jogo, é fácil falar. Carrillo está num processo gradual de subida de forma. A maneira inacreditável como foi tratado pelo Sporting, quando recusou renovar o contrato, é a principal razão de ainda não estar na forma exigida. O Carrillo vai dar muitas alegrias aos benfiquistas.

O Benfica foi bicampeão com Jorge Jesus e Rui Vitória parece, até agora, estar no caminho certo. Tendo convivido com Jesus no passado e agora com Rui Vitória quais são as principais diferenças entre os dois?

São várias. Jorge Jesus é um treinador da velha guarda, com valor mas com métodos que considero ultrapassados. Rui Vitória, sendo mais jovem, é um treinador moderno, que é mestre na gestão de balneário. Jorge Jesus tem graves lacunas neste capítulo. Qualquer jogador, ao fim de uma época, está farto de Jesus. Rui Vitória é bem diferente. Jesus pensa apenas no ‘eu’ enquanto Rui Vitória dá primazia ao ‘nós’.

Dá-lhe gozo ver a atual situação de Jorge Jesus?

Não me dá gozo nenhum! O que eu lamentei e critiquei foi a forma como ele saiu do Benfica. Acho que ele traiu o clube que o projetou, o clube que fez dele um treinador vencedor. Ele nunca tinha ganho nada antes de chegar ao maior clube português. Abomino a falta de gratidão.

O Benfica quebrou a hegemonia do FC Porto no futebol português. Quais são os pilares para um clube se fixar no topo durante anos?

São muitos. Ter uma organização profissional, ter estabilidade, ter uma política traçada sem desviar esse rumo e, sobretudo, respeitar sempre o adversário. Estes são os pilares fundamentais. O Benfica tem tudo isso e, por isso mesmo, tem ganho mais nos últimos anos, quer no plano desportivo, quer no plano económico e financeiro. O Benfica não é apenas tricampeão desportivo, é também tricampeão nos lucros. E creio que continuará na senda do êxito nos próximos anos. Hoje, quem treina o Benfica arrisca-se a ser campeão. Esta era uma máxima do ‘Velho Capitão’ Mário Wilson, que se aplica ao Benfica de hoje.

Um dos maiores problemas com que o Benfica se tem deparado ao longo desta época são as lesões. As opções de Rui Vitória e a aposta noutros jogadores fazem com que o Benfica tenha hoje uma equipa tão forte em campo como no banco?

Creio que sim. O Real Madrid tem tido o mesmo problema. Curiosamente, ambos os clubes lideram os respetivos campeonatos, ambos passaram a Fase de Grupos da Liga dos Campeões e ambos foram eliminados, na mesma semana, (o Benfica) na Taça da Liga e (o Real Madrid) na Taça do Rei. O plantel do Benfica é, claramente, o mais rico, com várias soluções, com jogadores com capacidade para ocuparem várias zonas do terreno e sem que o rendimento da equipa quebre. Decorridas que estão 18 jornadas da Liga, o Benfica lidera há 14 jornadas. Ora isto não acontece por acaso… Tem havido muito mérito da equipa e dos seus sócios e adeptos!

Gonçalo Guedes valeu ao Benfica, até agora, 30 milhões de euros. Na época passada era impensável colocar este cenário em campo. Defende que Rui Vitória é o principal responsável por este tipo de transferências [visto que Guedes nunca jogou tantos minutos como nesta época]. Acredita que Guedes jogaria tanto se não fossem as lesões que afastaram Jonas e Mitroglou dos relvados?

Rui Vitória não é apenas um treinador de futebol. É um grande gestor de ativos. A transferência de Gonçalo Guedes para o PSG prova a qualidade da academia do clube, onde são formados jogadores de elite, todos eles com destino aos clubes do primeiro mercado internacional. Basta ver os minutos que Jorge Jesus deu a Gonçalo Guedes e que Rui Vitória deu para perceber que o Benfica tinha que dar este passo. Quando me lembro de André Gomes, Bernardo Silva, João Cancelo, Ivan Cavaleiro e Hélder Costa, só para dar alguns exemplos, fico arrepiado com o desperdício desportivo. Jorge Jesus prejudicou muito o Benfica por não acreditar na formação.

Há mais algum clube que seja candidato ao título sem ser Benfica ou FC Porto?

Acho que está tudo em aberto. O SC Braga está a fazer uma grande prova. Os três grandes vão ter que jogar em Braga, onde só ganha quem estiver num dia perfeito. O Sporting, apesar do atraso, continua na luta. E o V. Guimarães pode fazer um brilharete. 

As arbitragens são sempre um tema forte. Os programas sobre futebol [no geral] condicionam a arbitragem?

Não acredito que os programas condicionem a arbitragem! Felizmente, temos uma nova geração de árbitros, muitos deles com imenso talento e tal como acontece com os jovens jogadores, têm de ser ajudados e temos de ser pacientes. É muito fácil culpar os árbitros pelos inêxitos! Quem assim procede, comete um erro. Normalmente, quando se perde, a culpa é nossa. Sei que o FC Porto parece querer voltar aos tempos do ‘Apito Dourado’. Todos sabemos como as coisas eram cozinhadas na fase mais negra do futebol português. Quanto ao Sporting, trata-se de um caso doentio. O Sporting acha que todos os árbitros são incompetentes. Mais grave do que isso – o seu presidente acha que todos os árbitros, árbitros assistentes, observadores e delegados se venderam ao Benfica a troco de um almoço ou de um jantar. O que eu lamento é que estas pessoas não sejam severamente punidas. Em Inglaterra, só para dar um bom exemplo, os presidentes do FC Porto e do Sporting já teriam sido irradiados.

 É crente?

 Já fui mais!  

Diz-se que à mesa não se discute política, futebol e religião. Tendo em conta os cargos que desempenhou até agora, é um ditado popular impossível de cumprir?

Acho que é um daqueles ditados que não fazem sentido. À mesa discute-se tudo!

Tem um lema próprio, enquanto adepto do Benfica?

‘Juntos somos mais fortes’! Acho que os êxitos do Benfica têm passado sobretudo pela união da família benfiquista.

Se pudesse escolher um jogador para vestir a camisola do Benfica qual é o nome que lhe ocorre?

Obviamente, André Horta! Não conheço mais nenhum jogador que tenha a paixão que ele tem pelo clube.

Com eleições à porta, na sua perspetiva qual seria o presidente ideal para o Sporting?

Eu gostava que o atual ganhasse! Bruno de Carvalho é uma das maiores garantias que o Benfica pode continuar a ganhar!

Madeira Rodrigues afirmou que no caso de ser eleito Jorge Jesus deixaria de ser treinador do Sporting. Isso seria benéfico para o clube de Alvalade?

Acho quem sim. Os jogadores do Sporting estão fartos do treinador e do presidente! Por isso mesmo, espero que Madeira Rodrigues perca as eleições!

Num cenário hipotético, se Sporting e FC Porto disputassem uma final da Liga dos Campeões, por qual dos clubes torcia?

Ficaria contente por duas equipas portuguesas chegarem à final da prova europeia mais importante de clubes. Nas competições europeias, sou cem por cento nacionalista! Torço sempre pelas equipas portuguesas, claro! É Portugal que está em campo. Numa final dessas, que considero improvável, que ganhasse a melhor equipa em campo.

De volta à realidade. Se o Benfica for tetra vai ao Marquês?

Não devo conseguir ir. Aconteceu isso mesmo com o tricampeonato, pois as funções na BTV impediram-me de ir festejar. Fizemos uma emissão notável e creio que provámos que a BTV é um verdadeiro case study no mercado televisivo. Hoje, vejo muitas televisões imitarem a BTV. Aliás, somos o canal que utiliza mais câmaras nos jogos e não escondemos imagens nas transmissões dos jogos.