Há uma guerra em curso entre UGT e CGTP. As relações históricas sempre foram más, mas agora o clima azedou ao ponto de um dirigente da UGT garantir ao i que será impensável nos próximos tempos haver uma greve geral que junte as duas centrais sindicais. O protagonismo dado à CGTP pelo governo de António Costa e a proximidade do congresso da UGT – marcado para 25 e 26 de março – são o pano de fundo para um escalar no tom de Carlos Silva contra a central liderada por Arménio Carlos.
É preciso lembrar que, sendo Carlos Silva socialista, está longe de ser próximo de António Costa e foi sempre um opositor à solução de governação à esquerda, ao passo que Arménio Carlos é visto no governo como uma peça fulcral para a paz social que o primeiro-ministro quer ostentar como trunfo.
o primeiro episódio
O primeiro episódio deste mal-estar aconteceu logo no dia em que o desconto na taxa social única (TSU) para os patrões foi chumbado no parlamento. Costa chamou os parceiros sociais a São Bento e Carlos Silva não gostou de chegar à residência oficial do primeiro-ministro e encontrar lá uma delegação da CGTP.
“Eles não tinham estado no acordo de concertação social, não fazia sentido serem os primeiros a ser chamados”, nota uma fonte da UGT. Carlos Silva sempre quis ficar na fotografia do acordo de concertação social para vincar uma das marcas da central que dirige: a UGT é a única que lutou contra todos os governos e assinou acordos com todos. O dirigente sindical queria, por isso, assegurar que haveria uma cerimónia conjunta de assinatura do acordo de concertação social. Isso acabou, porém, por ser impossível dada a urgência imposta pelo governo, que fez com que o documento andasse a circular pelas sedes dos parceiros sociais, transportado por um motorista com a missão de recolher todas as assinaturas. A CGTP sempre teve outra atitude: esteve contra o desconto na TSU, mas quis fazer parte da solução alternativa de redução do pagamento especial por conta e estará hoje no encontro de concertação social. “A CGTP não abdica de estar na discussão”, justificava ontem Arménio Carlos, depois de Carlos Silva ter voltado a repetir não entender a presença da central rival.
UGT AO ATAQUE
Ontem houve, aliás, mais um episódio ilustrativo desta picardia em torno da apreciação parlamentar do decreto-lei que municipaliza a Carris: o SITRA, um sindicato afeto à UGT, recusou participar numa reunião com o PCP onde estavam sindicalistas da FECTRANS afetos à CGTP. O i sabe que os comunistas tinham deixado claro por email que a reunião seria conjunta e que rapidamente propuseram um encontro em separado para o SITRA e a comissão de trabalhadores da Carris, mas a forma como os sindicalistas do SITRA abandonaram a sala é sintomática do mal-estar entre UGT e CGTP. Ontem mesmo, Carlos Silva voltou a atacar de forma particularmente dura a organização liderada por Arménio Carlos, acusando-a, em entrevista ao “Público”, de não ter cultura de compromisso.
“O Outubro de 1917 já foi há quase 100 anos. Há ideias que não se perderam, mas temos de evoluir”, disse, afirmando que não lhe “passa pela cabeça” que a CGTP possa assinar a adenda a um acordo de concertação social que não subscreveu. Arménio Carlos é que não quer alimentar polémicas. “Já não nos merece nenhum comentário”, disse sobre as declarações de Carlos Silva, vincando que está à frente da maior central sindical. “Qual é a organização mais representativa dos trabalhadores em Portugal? Não é a CGTP? Mas isso não é o nosso problema. O nosso problema é encontrar soluções para os trabalhadores”, insistiu.
O SINAL DE COSTA
Com acordos de tendência que lhe garantem a continuidade na liderança, Carlos Silva não deixa de preparar o tom do congresso de março com um endurecer de posições. “Nada une mais a tendência socialista entre si e a tendência socialista com a tendência social-democrata do que a rivalidade com a CGTP”, aponta um dirigente da central de Carlos Silva. De resto, a UGT quer afirmar–se, depois de perceber que a solução de governo à esquerda favorece o protagonismo da CGTP. Não passou ao lado da UGT o facto de, no 1.o de Maio do ano passado, Costa ter enviado a sua número dois no PS, Ana Catarina Mendes, às celebrações da CGTP, enquanto se fez representar junto de Carlos Silva pelo deputado Tiago Barbosa Ribeiro.
“Foi um sinal”, diz-se na central sindical. Hoje há uma greve de pessoal não docente convocada tanto por sindicatos da UGT como da CGTP, naquilo a que em linguagem das centrais se chama “unidade na ação”. Mas é um epifenómeno que dificilmente se repetirá nos próximos tempos.Há uma guerra em curso entre UGT e CGTP. As relações históricas sempre foram más, mas agora o clima azedou ao ponto de um dirigente da UGT garantir ao i que será impensável nos próximos tempos haver uma greve geral que junte as duas centrais sindicais.