Muitos socialistas já leram as quase 600 páginas do livro de Cavaco Silva sobre os tempos que passou em Belém e dedicaram atenção especial às duras críticas feitas aos governos liderados por José Sócrates.
Cavaco não perdoa a Sócrates o “comportamento desleal e pouco sério”. Os socialistas, principalmente os mais próximos do ex-primeiro-ministro, garantem tratar-se de um ajuste de contas. “O livro revela um grande azedume pessoal de um Presidente mal resolvido e com grandes lapsos de memória”, diz, em declarações ao i, José Junqueiro. O ex-deputado socialista considera tratar-se de “um ajuste de contas” de “um Presidente que não se enxerga” e que “saiu da função com a mais baixa popularidade de sempre”.
O ex-governante aponta ainda o dedo a Cavaco por se ter esquecido de referir nas suas memórias “o papel” que teve no BPN. “Ele é um protagonista de tudo o que aconteceu no BPN. Basta reler as primeiras páginas dos jornais para perceber que ele se esqueceu disso.”
Sócrates não demorou muito tempo a reagir ao livro “Quinta-Feira e Outros Dias”. Quarenta e oito horas depois de Cavaco ter lançado a obra no Centro Cultural de Belém, o ex-primeiro-ministro respondeu-lhe com a acusação de que o ex-chefe do Estado “não tem moral para dar lições de lealdade institucional”.
Num artigo publicado no “Diário de Notícias”, Sócrates escreve que “pela primeira vez na história democrática do país ficou provado que um Presidente concebeu e executou uma conjura baseada numa história falsa, por forma a deitar abaixo um governo legítimo em funções”.
“Um precedente grave” No mesmo dia em que o ex-primeiro-ministro reagiu aos ataques do ex-Presidente, Renato Sampaio, deputado do PS, escreveu na sua página do Facebook que este livro é um “péssimo serviço à democracia”, porque Cavaco “criou um precedente grave ao revelar conversas entre o Presidente da República e o primeiro-ministro que deviam ficar na reserva das instituições”. O deputado socialista, próximo de Sócrates, acusa o ex-presidente de ter escrito as memórias movido pela “mesquinhez”.
Delação intriguista O presidente do PS, Carlos César, também não ignorou o facto político da semana. O líder do grupo parlamentar do PS considera que “o livro do antigo Presidente Cavaco Silva oscila entre o arrogo biográfico e a delação intriguista. E, como em todos os ajustes que se baseiam no rancor, a razão é toldada, a memória é traída e os factos são subvertidos”. César esteve no centro da primeira crise entre Belém e o governo, no verão de 2008, por causa do Estatuto Político Administrativo dos Açores e lembra que Cavaco “saiu com a maior impopularidade de sempre de um Presidente da República”.
São muitas e duras as críticas feitas a José Sócrates nas memórias do ex-chefe do Estado. “Pouco sério”, “desleal”, “fingido” e “uma pessoa em quem não se pode confiar” são algumas das características atribuídas ao ex-secretário-geral do PS.