Depois de 2016, que já o tinha sido, veio 2017 fazer-se mais um ano e tanto para o cinema português, que, depois do prémio de melhor realização para João Pedro Rodrigues por “O Ornitólogo”, no ano passado, sai pela segunda edição consecutiva premiado do Festival de Locarno. E não apenas uma vez. “António e Catarina”, documentário de 40 minutos produzido e rodado em Portugal pela jovem realizadora romena Cristina Hanes venceu o maior prémio atribuído às curtas no festival suíço. Um novo Leopardo de Ouro para o cinema português, sete anos depois de ter sido atribuído a de Gabriel Abrantes, por “A History of Mutual Respect”.
Com produção da Terratreme, “António e Catarina”, que Cristina Hanes, de 26 anos, realizou em Portugal no âmbito de um mestrado integrado no programa trans-europeu DocNomads, com a Universidade Lusófona, é o encontro entre a realizadora e um homem 70 anos mais velho, de Trás-os-Montes, que será António neste filme que sai de Locarno com a maior distinção atribuída às curtas no mesmo ano em que, em fevereiro, Diogo Costa Amarante venceu o Urso de Ouro das curtas com o seu “Cidade Pequena” — que realizou sem apoios e com muito poucos meios, a fazer lembrar a forma como surgiu “Verão Danado”, filme de estreia de Pedro Cabeleira, única longa-metragem portuguesa em competição nesta edição, na secção Cineastas do Presente, dedicada a primeiras e segundas obras de longa-metragem, de onde voltou com uma menção especial.
Retrato da geração que é a sua naquele tempo entre o que foi a universidade e o que será a vida adulta que Pedro Cabeleira rodou logo à saída da Escola Superior de Teatro e Cinema, quase sem orçamento, com Leonor Teles (Urso de Ouro das curtas em Berlim no ano passado com “Balada de Um Batráquio”) como diretora de fotografia.
O filme que Pedro Cabeleira, que saltou o habitual degrau da curta para se atirar de cabeça para a longa-metragem, precisava de de fazer. “Queria ficar tranquilo comigo mesmo”, explicou ao i numa entrevista antes de partir para Locarno. “De pensar que se calhar daí a quatro anos podia até ter que voltar para o Entroncamento [onde nasceu] ou estar a trabalhar num café, mas que pelo menos tinha feito um filme.” E a ser um filme que fosse uma longa, não uma curta. “São formatos diferentes e sinto que a curta é um formato que não consigo desenhar tão bem, por isso não me interessava tanto.”
Na mesma secção em que competia “Verão Danado”, de onde saiu vencedor “Three Quarters”, do búlgaro Ilian Metev, também “Milla”, segunda longa-metragem da francesa Valérie Massadian, uma coprodução da portuguesa Terratreme, foi distinguida com o Prémio Especial do Júri. Na véspera, já uma outra coprodução da Terratreme, “Era Uma Vez Brasília”, de Adirley Queirós, tinha recebido uma menção especial do júri da secção Signs of Life.
E de prémios para filmes com um dedo português nesta 70.ª edição do festival suíço, que teve como grande vencedor do Leopardo de Ouro “Mrs. Fang”, o mais recente documentário do realizador chinês Wang Bing, não estamos ainda conversados, que foi para F. J. Ossang, cineasta em foco ainda na última edição das Curtas Vila do Conde, o Leopardo de Prata de melhor realização (no ano passado entregue a João Pedro Rodrigues e em 2014 a Pedro Costa, por “Cavalo Dinheiro”) pelo seu “9 Doigts”, parcialmente rodado nos Açores e coproduzido, numa participação minoritária, pela O Som e a Fúria.