Só no final do ano deverá haver novidades acerca de mudanças na legislação sobre a autodeterminação da identidade do género e a mudança de sexo. Depois da apresentação, esta semana, da proposta de lei do governo e de projetos do Bloco de Esquerda e do PAN, os deputados aprovaram por unanimidade a descida dos trabalhos à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, sem votação, por 90 dias.
Uma vez que, entretanto, os trabalhos parlamentares estão interrompidos até depois das autárquicas, sendo retomados a 3 de outubro, o dossiê poderá inclusive transitar para o próximo ano.
O tema divide as bancadas parlamentares. A proposta de lei do governo prevê que deixe de ser preciso um relatório médico para a mudança de sexo e nome no registo civil, admitindo que essa hipótese seja alargada a jovens a partir dos 16 anos. A legislação que veio permitir a alteração de sexo e de nome no registo sem necessidade de um processo judicial prévio vigora desde 2011, mas só concede esse direito a maiores de idade a quem tenha sido diagnosticada uma perturbação de identidade de género. Para esse efeito, os requerentes devem apresentar um relatório que comprove esse diagnóstico, elaborado por uma equipa multidisciplinar de sexologia clínica, o qual deve ser, pelo menos, assinado por um médico e um psicólogo.
A proposta do governo considera a atual legislação contrária ao modelo que se tem vindo a definir de “despatologização mental das pessoas cujo sexo atribuído à nascença é incongruente com a sua identidade de género”, mas também “redutora face à atual realidade social, a qual tem vindo a apontar para uma maior inclusão da diversidade de género e da diversidade das características sexuais das pessoas”. A proposta define, porém, que o pedido relativo a jovens entre os 16 e os 18 anos seja feito por parte dos representantes legais, devendo o conservador ouvir o menor.
O diploma prevê ainda uma decisão no prazo de oito dias a contar da data de apresentação do requerimento. O projeto do Bloco prevê o mesmo prazo e que também sejam os representantes legais dos jovens a fazer o pedido, mas reconhece que, em caso de recusa, o menor poderá intentar uma ação judicial. O projeto do PAN não prevê uma idade mínima para um menor de idade poder requerer a mudança do nome e sexo no registo civil, devendo ser representado pelos seus representantes legais ou pelo Ministério Público.
Quanto a intervenções cirúrgicas ou farmacológicas com vista a fazer corresponder o corpo à identidade de género, tanto a proposta do governo como a do Bloco admitem o alargamento dessa hipótese a menores, mediante consentimento expresso e esclarecido através dos seus representantes legais, admitindo o BE que, também neste caso, os jovens possam recorrer à justiça perante a recusa dos pais.
Pedidos no registo civil aumentam De acordo com dados fornecidos ao i pelo Ministério da Justiça, desde a entrada em vigor da lei sobre autodeterminação do género, em 2011, mudaram de sexo e nome no registo civil 217 homens e 268 mulheres, e os números têm vindo a aumentar desde 2015.
Este ano regista-se já um recorde de requerimentos validados e mais mudanças do que em todo o ano passado: o pedido foi reconhecido a 44 homens e 64 mulheres. Quantos aos tratamentos, são realizados no SNS em Coimbra e no S. João, e também a título particular. Uma tendência notada em Portugal é que, ao contrário das estatísticas mundiais, há mais pedidos por parte de mulheres, o que se verifica também nas mudanças de sexo e nome no registo civil.