António Costa teve de esperar dois anos para ganhar as eleições, mas fê-lo de maneira clara e inequívoca. Portugal tem um mapa cor de rosa e o primeiro-ministro não se esqueceu de lembrar isso no discurso de consagração: “O PS teve hoje a maior vitória eleitoral de toda a sua história.” E aproveitou para deixar o recado aos partidos que à esquerda procuraram nestas autárquicas uma maior solidez da sua posição negocial: “Este resultado reforça o PS”.
Foi a única alfinetada que se permitiu no discurso da vitória, no meio da euforia da militância, entusiasmada com uma noite de sonho: acentuado o papel do PS à esquerda, fragilizado o PSD à direita. Para uma noite de sonho só faltou que Manuel Pizarro conseguisse derrotar Rui Moreira no Porto ou, pelo menos, deixá-lo sem maioria absoluta. Mas o independente aproveitou muito bem o descalabro social-democrata para ir buscar à direita o que perdera à esquerda com o fim do apoio do PS.
Aos partidos à sua esquerda, estendeu o primeiro-ministro a sua mão de apaziguamento: “Há claramente um derrotado nestas eleições e é o PSD. Procurar outros derrotados é procurar disfarçar a leitura essencial que há a retirar destas eleições”.
Com as legislativas de 2015 ganhas agora em 2017, Costa permitiu-se ser ousado nas perspetivas: “Concretizaremos a maior reforma do Estado que o país teve desde 1976. O reforço das competências e dos meios das freguesias e dos municípios é condição para a melhoria das contas, para uma melhor resposta aos cidadãos e para um maior desenvolvimento de todo o território”.
Pode ser-se assim arrojado em noite de consagração quando o resultado final dava, com 97,96% das freguesias apuradas em todo o país, o PS com mais de 1,8 milhões de votos e 38,27%. O PSD sozinho conseguia apenas 784.975 votos e mais uns 600 e tal mil nas diferentes coligações. E com os socialistas a conseguir vitórias tão simbólicas como roubar Almada aos comunistas e conquistar ainda Alcochete na Área Metropolitana de Lisboa, manter Sintra e com maioria absoluta, reaver Beja; juntar-lhe o grande resultado de Fernando Medina em Lisboa que, tudo apontava à hora do fecho desta edição, dará para alcançar a maioria absoluta. Há ainda a salientar o facto de Paulo Cafôfo ter conseguido manter a Câmara do Funchal; a reconquista de Matosinhos – mesmo contra dois pesos-pesados do PS a liderarem movimentos independentes -, a manutenção e reforço da votação em Coimbra. Em suma, Costa não se pode queixar, os deuses autárquicos estiveram de feição.