Para uns, é a maior reforma europeia desde a criação do mercado único e da moeda única. Para outros, é uma antecâmara para um exército europeu. Consensual é que não é. Nem na direita, nem na esquerda.
O Governo tem-se fechado em copas sobre a posição portuguesa em relação à chamada Cooperação Estratégica Permanente de Defesa, embora admita ter participado na redação do projeto.
O Ministério da Defesa, contactado pelo SOL, nega que essa cooperação ou que o Fundo Europeu de Defesa representem uma iniciativa «direta ou indireta de criação de um exército comum europeu», seja a «curto, médio ou longo prazo». O gabinete do primeiro-ministro, por sua vez, remeteu para os Negócios Estrangeiros e o gabinete de Augusto Santos Silva foi mais explícito sobre uma iniciativa do que sobre a outra.
Em relação à Cooperação Estratégica Permanente, o MNE conta que «Portugal tem participado nos trabalhos de redação da notificação aos Estados-Membros sobre a Cooperação Estratégica Permanente na Defesa» e que só depois de este ser tornado público «o Governo estará em condições de tomar uma decisão sobre a posição portuguesa». O gabinete de Santos Silva aponta ainda às leis nacionais, que obrigam «a dita posição» a «consultas político-parlamentares» que, termina a resposta, «já se iniciaram no passado dia 17», ainda que até agora o PSD tenha criticado uma ausência de esclarecimento em torno destas questões.
O BE, por sua vez, confirma o respondido ao SOL pelo Executivo. A deputada Isabel Pires (BE) adianta: «A posição que o Governo nos deu sobre a Cooperação Estruturada Permanente é que não tem qualquer posição ainda sobre o assunto. Nós demos já indicação de qual é a nossa posição. Não vemos vantagens em entrar. Não é obrigatório que se entre porque qualquer Estado-membro pode a qualquer momento aderir ou não a este instrumento, mas não acreditamos que seja uma vantagem». O BE preferiria canalizar «esses esforços para mecanismos de Proteção Civil mais eficazes, em vez de canalizar esses investimentos para a Defesa e para a militarização».
E é precisamente aí que a divergência surge. Regressando ao esclarecimento recebido via Ministério dos Negócios Estrangeiros, o gabinete de Santos Silva assume que «o Fundo Europeu de Defesa é um bom instrumento para apoiar o investimento dos Estados-Membros, quer em investigação e desenvolvimento quer em equipamento de uso civil e militar», sendo que esse fundo está, na verdade, projetado para servir ou contribuir para a já referida Cooperação Estruturada Permanente.
Sobre o Fundo, a mesma deputada do BE riposta que faz parte de «mecanismos que têm surgido ultimamente», mas em que o BE mantém «a mesma posição: não se responde a crises humanitárias com maior militarização nem com maior reforço no armamento da União Europeia porque isso não vai resolver nenhum problema». Isabel Pires garante mesmo: «Nós vamo-nos manter contra a criação desse mecanismo».
BE e PCP são contra
No entanto, para o BE, e também para o PCP, o apoio à solução que sustenta o Governo minoritário do PS não é colocado em causa por estas diferenças de opinião, que já são antigas. Pires diz, ainda ao SOL, que «desde o início que essas matérias ficaram muito claras», não havendo «qualquer problema».
Até o eventual apoio do PSD a estas reformas – e um vago ressuscitar do ‘Bloco Central’ em matérias de Defesa – não é temido. «Nesse âmbito e nas escolhas europeias que são feitas, sempre houve acordo entre PS, PSD e CDS, portanto imagino que, dos debates que temos tido, se mantenha essa posição».
O presidente da Comissão Parlamentar de Defesa, Marco António Costa não destoa. «Apesar de desconhecer, em pormenor, os termos das negociações em curso, por falta de esclarecimento do Governo, na minha opinião será benéfico que Portugal esteja no pelotão da frente dos países que venham a integrar o grupo fundador da Cooperação Estruturada Permanente». Acerca do Fundo de Defesa, Marco António, também vice-presidente do PSD, acrescenta que será «indispensável para que a Europa desenvolva a sua indústria, nomeadamente a de duplo uso, e naturalmente que Portugal deve aproveitar as suas competências nestas áreas». O social-democrata não deixa de lembrar a Aliança Atlântica (NATO) como fundamental, considerando que «Portugal deve manter-se como membro pleno e ativo» na NATO, assim como «igualmente desenvolver uma política ativa de participação nos projetos de índole europeia».
Do lado do CDS, o eurodeputado Nuno Melo também destaca a Aliança Atlântica como protagonista. Também ao SOL, afirma que «o investimento e investigação europeia na área da Defesa, pensado em cooperação com a NATO, é uma coisa bem diferente de um exército europeu clássico em substituição da NATO». Para Melo, vice-presidente dos centristas, a «primeira hipótese é boa, por aumentar a própria eficácia de Portugal e outros países aliados na NATO, a par de oportunidades para universidades, empresas e criação de postos de trabalho».
Do lado do PCP, sem novidades, nem NATO, nem integração Europeia. Ao SOL, o deputado Jorge Machado afirma que «a elevação do projeto de integração europeia implica a perda de soberania nacional para transferi-la para o plano europeu» e isso é algo com que «o PCP não concorda».
«Desde logo na posição conjunta e nas negociações preliminares logo a seguir às eleições [legislativas] ficou muito claro que há matérias sobre as quais nós não temos acordo e uma delas é precisamente neste âmbito da Defesa», recorda o parlamentar comunista. «Sobre essa matéria ficou muito claro para nós que temos uma profunda divergência com o Partido Socialista e com o seu ministro [Azeredo Lopes]».
Jorge Machado revela mesmo que o PS sabe que aí «conta com o PSD e o CDS-PP» e não conta com o PCP. «É claro desde o início e vai continuar assim até ao final da legislatura», promete. Não sendo, portanto, a Europa ou a defesa europeia que anteciparão quaisquer eleições.