Situado nos antípodas daquela ligeireza que leva alguns autores a publicarem quase tudo quanto escrevem, este romance instala-nos em zonas de desamparo.
Os núcleos narrativos que compõem a admirável trama de planos sobrepostos, indiferentes à seta dos encadeamentos cronológicos, organizam-se como uma peça musical: tema, refrão, ritmo, pausa, silêncio cumulativo e irradiante de mistério, contrapontos, modulações. Estas histórias cruzadas decorrem numa cidade grande, buliçosa, socialmente hostil, situada no coração daquela zona crepuscular que reflecte sobre a dolorosa existência do homem, nas suas múltiplas dimensões. Melancolicamente escurecida pelas figuras da perda e da ausência, não recusaria um letreiro luminoso que a ideia de felicidade, sempre despedaçada, faria acender, por instantes. Um romance que faz pensar na velha fórmula segundo a qual ‘Todos os romances felizes se parecem. Os infelizes não’. E esse um dos seus trunfos.