A guerra entre o governo e a EDP abriu uma nova etapa, com o primeiro-ministro a voltar a usar a palavra “hostil” para classificar a atuação da empresa liderada por António Mexia. “Só lamento a atitude hostil que a EDP tem mantido e que representa, aliás, uma alteração da política que tinha com o anterior governo”, afirmou António Costa em relação à decisão da empresa de não pagar a contribuição extraordinária sobre a energia (CESE) referente a 2017, num total de 69 milhões de euros.
A atitude mereceu do deputado do Bloco de Esquerda Jorge Costa um comentário irónico no Twitter: “Reconhecida pelo recuo do governo na contribuição das renováveis acordada com o Bloco, a EDP envia o seu raminho de rosas. Os donos do país são ricos e… mal-agradecidos”, numa alfinetada ao primeiro-ministro, que deu o dito por não dito no seu acordo com o BE e recuou no dia da votação do Orçamento do Estado quanto à criação da contribuição sobre os lucros excessivos das empresas de energia renovável.
Alta tensão A relação tensa entre governo e EDP não é de agora, apesar de ter ganho novos contornos a 29 de dezembro, após a elétrica ter anunciado o aumento da luz em 2,5% para os clientes do mercado livre a partir de 18 de janeiro. Nesse mesmo dia, a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) aconselhou os consumidores a consultar e comparar valores, usando os simuladores disponíveis, e a mudar para a oferta com condições de preço mais adequadas ao seu consumo.
No dia seguinte foi a vez de o governo pedir à entidade reguladora para fazer uma “análise e eventual proposta de atuação no caso de a situação referida corresponder a alguma ação concertada”, admitindo a possibilidade de proceder à revisão de normas legais ou regulamentares no sentido de os consumidores poderem beneficiar da descida das tarifas aprovadas para o próximo ano.
Ao mesmo tempo, pediu à Agência para a Energia (Adene) para desenvolver, com urgência, uma campanha de informação, pedindo ao regulador que transmita “quais os aspetos mais relevantes que devem ser comunicados aos consumidores para que tenham acesso sempre às tarifas mais baixas do mercado”.
Já em julho passado, o primeiro-ministro tinha referido as “manhas” da EDP na forma como este operador energético funciona no mercado, acusando também os reguladores do setor de darem cobertura à atuação da multinacional portuguesa.
Meses antes, o secretário de Estado da Energia, em várias entrevistas, tinha alertado para os preços altos que são cobrados em Portugal, chegando mesmo a dizer que os consumidores estavam a ser “atacados pelas empresas de energia” e que o governo não iria tolerar práticas comerciais agressivas.
Mexia arguido A investigação do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) à passagem dos contratos de aquisição de energia (CAE) para os custos de manutenção para o equilíbrio contratual (CMEC), em 2004 – contratos esses que garantem rendas anuais à EDP –, com Mexia a ser um dos arguidos, causou algum mal-estar.
A questão ganhou maiores contornos com a proposta de revisão por parte da ERSE até 2027. O Estado pagou à elétrica 2,5 mil milhões pelas centrais nos últimos dez anos, mas anunciou uma redução para 829 milhões de euros até 2027, cerca de 83 milhões anuais.
A proposta foi imediatamente contestada pela EDP, que apresentara anteriormente uma proposta de ajustamento final de 256 milhões de euros.
Rendas em tribunal Também o pagamento da contribuição extraordinária sobre a energia (CESE), criada em 2014 pelo governo de Passos Coelho, não tem sido pacífico, apesar de a EDP ter sido a última das três grandes energéticas – após a Galp e REN – a ir para tribunal contestar a CESE. A empresa liderada por António Mexia ainda pagou nos primeiros anos mas, em 2017, seguiu o exemplo das outras empresas.