Magistrados contra proposta de governo ameaçam avançar para greve

Nova versão da proposta da tutela para o estatuto dos magistrados prevê a progressão na carreira através de promoção e que os magistrados sejam escolhidos para os DIAP distritais pelos procuradores-coordenadores. Sindicato diz que foi apanhado “de surpresa” com nova versão do documento

Os magistrados estão contra a nova versão da proposta de alteração ao seu estatuto que foi desenhada pelo Ministério da Justiça e ameaçam desde já avançar para greve. Depois dos protestos dos guardas prisionais contra a alteração dos horários, cujas negociações com os sindicatos terminaram há dois dias, este promete ser o próximo braço-de-ferro entre Francisca Van Dunem e o setor.

De acordo com o presidente do sindicato dos magistrados do Ministério Público, António Ventinhas, são várias as normas que foram introduzidas “de surpresa” no documento da tutela que “violam claramente o paralelismo das magistraturas e atacam os direitos adquiridos”, sendo “inconstitucionais”.

Por isso, avisa Ventinhas ao i, os magistrados consideram a proposta de Francisca Van Dunem “inaceitável” e, caso o governo avance com a proposta nos precisos termos em que está, serão usados “todos os meios ao [seu] dispor para a travar e para a combater, designadamente a greve e outras formas de protesto”.

Em causa está uma nova versão, com data do mês passado, da proposta de lei que vem alterar o estatuto dos magistrados, que não sofre alterações profundas desde 1998.

Confrontado pelo i com o desagrado dos magistrados espelhado no parecer, o Ministério da Justiça diz que recebeu o documento do sindicato “ao início da tarde desta terça-feira [ontem] e vai proceder à sua análise cuidada, assim como de todos os pareceres que foram solicitados às várias entidades envolvidas”.

As críticas do sindicato Uma das normas introduzidas na proposta à última hora e que, de acordo com o parecer, é “inconstitucional” passa pela redução da remuneração de alguns magistrados. O documento do sindicato refere que a nova versão da tutela não só não prevê a subida de salários como prevê que os magistrados com a categoria de procurador da República sejam alvo de uma “diminuição da remuneração” caso “não tenham sido avaliados com uma nota de mérito de ‘Bom com distinção’, e possam perder o lugar e perder vencimento”, explicou Ventinhas.

Outra das críticas apontadas pelo sindicato à proposta da tutela passa pela alteração na colocação de magistrados nos Departamentos de Investigação e Ação Penal distritais. O ministério propõe que os magistrados passem a ser escolhidos para os DIAP “com base em indicações de caráter pessoal”, abrindo a porta a “punições encapotadas” por parte dos procuradores-coordenadores a magistrados com quem “tenham divergências”, alertou o presidente do sindicato. Até agora, os magistrados eram colocados nos DIAP distritais através de concursos.

É ainda criticado fortemente o modelo de progressão na carreira, que o ministério quer que passe a ser por via de promoção, substituindo o atual regime que tem como base a antiguidade e o mérito. O sindicato considera que a forma proposta pela tutela “acarretará no futuro problemas para a investigação criminal e funcionamento dos tribunais” pois, refere o documento, o modelo desenhado pela tutela “dará origem a injustiças durante o período transitório, bem como aumentará a instabilidade dos lugares de colocação dos magistrados”.

Também fica por garantir uma “verdadeira autonomia financeira” para o Ministério Público que, segundo as regras propostas, “continuará a ser uma magistratura de mão estendida em que permanentemente terá de mendigar meios para a prossecução das suas funções constitucionais”, lê-se no parecer.

A revisão do estatuto dos magistrados está a ser negociada há meses. No recente congresso do sindicato, que decorreu na Madeira, o vice-procurador-geral da República, Adriano Cunha, frisou que tem sido penoso gerir o Ministério Público devido à falta de meios e ao atraso na revisão do estatuto dos magistrados.