As conversas que o PSD desenvolve neste momento com o Governo do Partido Socialista foram iniciadas já na anterior liderança social-democrata, de Pedro Passos Coelho.
As únicas áreas que a nova direção de Rui Rio tem negociado com o PS são, como é aliás assumido por toda a praça política, a descentralização e os fundos comunitários – sendo que o Executivo de António Costa não abdica e tem relembrado ao Parlamento que já no seu programa eleitoral havia firmado a intenção de aprovar grandes obras públicas por uma maioria de 2/3 na Assembleia da República.
A questão, todavia, é que nada disso começou em 2018.
Nem a descentralização, cujo ministro então responsável (Eduardo Cabrita) reuniu com deputados do PSD antes da mudança de direção ‘laranja’, nem os fundos comunitários, para os quais Passos Coelho mostrou disponibilidade para dialogar ainda antes das autárquicas, nem sequer as obras públicas, sobre as quais Passos afirmou a este jornal, em setembro do ano passado, que «o PSD não diz que não» a um «consenso».
Maria Luís Albuquerque, ex-vice-presidente de Passos Coelho, chegou até a reunir, sabe o SOL, com o ministro do Planeamento Pedro Marques, para discutirem a eventualidade e necessidade de um novo aeroporto no Montijo. «Se estava à espera que a Maria Luís fosse pôr isso nos jornais, está enganado», suspira fonte próxima da antiga Comissão Política Nacional do PSD. «O que não quer dizer que os dois partidos não falassem ou que a Oposição se recusasse reunir com o Governo, como é óbvio».
Sobre os fundos estruturais e o quadro comunitário, que o atual Governo pretende perspetivar numa lógica de agenda a dez anos, Passos, também no ano passado, afirmou igualmente a este jornal: «Se o Governo quer tomar decisões para além de 2020 e quer ouvir o PSD, eu acho isso correto – nós fizemos isso quanto estivemos no Governo; não fizemos este plano de infraestruturas nem o Portugal 20/20 sem consultar o Partido Socialista». O deputado socialista com que o Governo do PSD negociara é, hoje, membro do Governo do PS, relembrara também Passos, hoje de saída da política mais ativa.
A Comissão de acompanhamento sobre os fundos comunitários até 2030 – na tal lógica a dez anos – foi até viabilizada pelo PSD na Assembleia ainda durante a liderança de Passos Coelho – noutro exemplo que mostra que o diálogo entre os dois maiores partidos portugueses não ressuscitou porque, na verdade, não chegou a estar exatamente morto.
O próprio Rio, nas declarações que fez esta semana após almoço no Palácio de Belém, admitiu: «Falámos da descentralização e dos fundos comunitários. Aquilo que está em cima da mesa tem a ver com a passagem de competências para os municípios. O que está em cima da mesa já estava quando eu cheguei e é uma parte».
‘PSD esteve sempre disponível para consensos’
«Nós já relativamente à descentralização também propusemos uma comissão eventual, mas, na altura, o PS recusou», recorda, por sua vez, um ex-vice do grupo parlamentar do PSD. «A única diferença é que nós viabilizámos a comissão que o PS propôs mas eles recusaram viabilizar a que nós propúnhamos, precisamente sobre um tema que agora se diz consensual: a descentralização», prossegue.
O então líder do grupo parlamentar, Hugo Soares, diz mesmo ao SOL que «o PSD sempre esteve disponível para consensos», apesar de o PS ter recusado comissões parlamentares para debater a reforma do Estado ou da Segurança Social.
«Todas as reformas que nós temos dito que são importantes – reforma ao nível da Segurança Social, a reforma do Estado, uma reforma tributária para adiante, reformas importantes ao nível da Justiça, que nós não conseguimos fazer toda, por exemplo – o Governo tem dito que não», já lamentava Pedro Passos Coelho, no ano passado, em declarações ao SOL.
Berta Cabral, que era vice-presidente de bancada na altura, reuniu, por exemplo, com Eduardo Cabrita para procurar alcançar acordo na descentralização, a que recentemente o Presidente da República também apelou.
«Reunimos no âmbito parlamentar no início do processo. Depois, foram reuniões no âmbito do grupo de trabalho que coordenei e no âmbito da Comissão Parlamentar respetiva», relata a deputada. Na altura, continua, «o trabalho avançou todo». «Temos o relatório concluído desde meados do ano passado e está a aguardar a lei das finanças locais, que o Governo ainda não fez entrar no Parlamento».
Para Berta Cabral, em jeito de conclusão, tal «não se confunde com o plano atual» em que a direção do partido também tomou diligências (na pessoa do vice-presidente Álvaro Amaro) nesse sentido. «Estamos todos no mesmo cumprimento de onda. Quer o partido, quer o grupo parlamentar dizem – e sempre disseram que sem a dimensão financeira da descentralização [a lei das finanças locais] não podemos avançar com a descentralização. É aguardar a entrega da lei na Assembleia… E está mais do que na hora», considera. «Do ponto de vista teórico, o Governo está de acordo e o Parlamento está maioritariamente de acordo. Onde é necessário consenso é na Assembleia Nacional de Municípios», termina. Foi precisamente na AMN que Marcelo lançou o seu apelo no mês passado.
Menezes destrói direção de Rio
Em reação a Castro Almeida, vice-presidente de Rui Rio, se apresentar alegoricamente de «braço dado com o Governo» no que a fundos europeus diz respeito, o ministro Pedro Marques sorriu, mostrando ter os braços «ocupados» com os parceiros consumados do Governo, o PCP e o BE. A isto, Luís Filipe Menezes deixou críticas na sua página das redes sociais. «Vale a pena ver o filme abaixo até ao fim, porque não me lembro de ver o PSD alguma vez tão humilhado como nesse minuto e tal», comentou. «Há que arrepiar caminho…».