“O apoio russo à eleição de António Guterres teve afinal um preço muito elevado”. A tese foi levantada pelo deputado do PSD Duarte Marques (ver entrevista na página anterior) nas redes sociais e também pelo ex-secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Bruno Maçães.
Para os sociais-democratas, o facto de o governo português ter optado por não expulsar qualquer diplomata russo – não se associando assim à ação coordenada entre os Estados Unidos, a União Europeia e a NATO, em solidariedade com o ataque químico ocorrido no Reino Unido – deriva do apoio essencial que a Rússia deu para a eleição de António Guterres (ex-secretário-geral do atual partido de governo, o PS) como secretário-geral das Nações Unidas.
Maçães criticou mesmo o facto de “países como Portugal e a Áustria se oferecerem como ponte depois de um ataque químico [a tentativa de envenenamento do ex-espião Sergei Skripal] na Europa, em troca deste ou daquele favor de Moscovo”.
Geringonça soviética?
O eurodeputado Paulo Rangel, por outro lado, aponta as afinidades ideológicas do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda [Catarina Martins elogiou o governo por não alinhar “na escalada”] como catalisadoras da decisão do governo.
“A primeira coisa que me ocorre é que, sendo o governo sustentado por dois partidos que são contra a integração europeia, que são contra a integração de Portugal na NATO, o governo está a fazer jogo ideológico com uma matéria que é fundamental para a geopolítica portuguesa”, diz Rangel, à Rádio Renascença.
Miguel Pinto Luz, vice-presidente da Câmara de Cascais e ex-presidente da distrital do PSD de Lisboa, também apontou essa possibilidade. “É inconcebível a posição neutral de Portugal perante este tema. É inconcebível o governo português estar refém dos seus parceiros de coligação. Já sabíamos que em matéria de política doméstica o governo estava condicionado. Agora observamos que, no que diz respeito à política externa, Portugal está dependente das decisões do PCP e do Bloco de Esquerda”, publicou, na sua página oficial.
Hugo Soares, ex-líder parlamentar dos laranjas, relembrou, também nas redes sociais, a expulsão de diplomatas russos decidida por Francisco Sá Carneiro. “Quando a covardia política e a falta do ‘dever’ andam de braço dado com a conveniência (o mesmo é dizer PS, BE e PCP) é tão arejado e reconfortante lembrar a coragem e a determinação…”, atirou.
Até agora, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, tem preferido o limbo institucional no que ao seu discurso diz respeito. Tomou “boa nota”, mas nada fez. Agirá “sem precipitação” mas com autonomia, “com prudência” mas também com firmeza.
Um hino, portanto, à ambiguidade ou à diplomacia.
E oposição, não se faz?
Oficialmente, apesar das várias vozes citadas, o PSD ainda não tem posição sobre a temática. Rui Rio não disse uma palavra sobre o assunto e a atual direção de bancada, sabe o i, prefere esperar pelos eventuais esclarecimentos que a secretária de Estados para os Assuntos Europeus dará amanhã na comissão parlamentar respetiva.
Ao todo, 14 Estados-membros da União Europeia, incluindo a França, a Alemanha, o Reino Unido e a Espanha, os Estados Unidos, o Canadá, a Austrália e a NATO expulsaram esta semana diplomatas russos.