Rui Rio está a alimentar a esperança de uma maioria absoluta… no PS. A expressão está proibida entre os socialistas – «pedi-la é meio caminho andado para a não ter» –, mas a forma errática e cheia de polémicas como Rio está a conduzir o PSD faz o PS acreditar que é possível chegar à maioria absoluta em 2019.
«Começa a parecer possível chegar à maioria», admite um alto dirigente do PS, que não afasta, apesar disso, nenhum cenário para o pós-legislativas. Nem sequer o de acordos com o PSD, caso António Costa não consiga uma maioria absoluta.
Acordos com o PSD?
«Ainda falta muito tempo, mas não podemos afastar nenhuma hipótese», sublinha a mesma fonte. É que se António Costa nem quer ouvir falar em bloco central, a verdade é que nas cúpulas do partido há quem encare a hipótese de entendimentos parlamentares com Rui Rio, repetindo a fórmula usada quando António Guterres era primeiro-ministro, e Marcelo Rebelo de Sousa líder da oposição.
Esse é um cenário que agrada à ala de centro-direita dentro do PS, mas que não convence os socialistas mais à esquerda, que acham que o caminho é continuar a negociar com BE e PCP.
«Há visões ideológicas e políticas que separam PS e PSD», vinca um destacado socialista, que vê nos partidos de esquerda os parceiros naturais do PS. E que não compra a ideia de que, caso não haja maioria em 2019, se encontre uma solução que exclua o PCP. «Estamos a trabalhar com os dois, BE e PCP», insiste a mesma fonte, que não vê motivos para descartar um dos parceiros, mesmo que no PS todos percebam que a forma como o PCP «faz política nas ruas» consegue causar mossa ao Governo.
Em qualquer caso, até ao final da legislatura não é de esperar qualquer aproximação do Governo ao PSD. «Temos uma solução que funciona, não vamos mudar de política nem de parceiros», assegura ao SOL um membro do Executivo, que regista como «positiva» a disponibilidade de Rio para dialogar em temas como a descentralização e os fundos comunitários, mas garante que isso não significa uma alteração na forma como o Governo se sustenta numa maioria de esquerda.
«É sempre bom ter um PSD que não se exclui dos debates que interessam ao país. Mas só estamos a falar nestes dois dossiês e ainda nem sequer conhecemos as ideias de Rui Rio. Essa abertura ao diálogo não muda nada», frisa o governante.
O Orçamento do Estado para 2019 é, por isso, para negociar à esquerda. Rui Rio avisou, aliás, esta semana que seria «muito difícil» o seu partido viabilizar um Orçamento deste Governo e no PS não se esperava outra coisa.
«Se contássemos com o PSD para aprovar o Orçamento, seria porque tínhamos mudado muito de política. O Orçamento era aprovado num dia e no dia a seguir caía o Governo», comenta outra fonte do PS.
OE2019 não está garantido
A dificuldade pode estar em encontrar um Orçamento que satisfaça as expectativas de BE e PCP e, ao mesmo tempo, consiga manter a trajetória orçamental de ajustamento.
João Galamba dizia ontem em entrevista ao Jornal Económico que «em 2018 e 2019 o país dispensa brilharetes orçamentais», numa declaração de defesa do aumento do investimento público que agrada aos parceiros da esquerda.
Há uma semana, uma fonte das Finanças declarava, contudo, ao Público que «Centeno não dá margem para aumentos da Função Pública» em 2019. A notícia gerou uma reação de Francisco Louçã que, num artigo de opinião no Expresso, veio avisar o Governo de que este tipo de retórica pode levar ao «falhanço do PS» e que dar como certo que BE e PCP aprovarão o Orçamento qualquer que ele seja pode «ser uma armadilha para o PS».
O mesmo aviso veio do PCP. «Com um Orçamento onde os traços de política de direita se acentuarem, temos um problema», alertou Jerónimo de Sousa, quarta-feira, em entrevista à RTP.
Os recados foram escutados com atenção no Governo. «Os Orçamentos têm de ser trabalhados com todos, PS, BE e PCP», afirma uma fonte do Executivo, que garante que o trabalho de diálogo à esquerda se mantém de forma contínua e não vai parar depois da aprovação do Orçamento de 2019. «Depois disso, ainda temos nove meses. Parece-me demasiado tempo para estar em campanha eleitoral. Queremos governar e contamos continuar a trabalhar com os parceiros à esquerda. Agora, percebemos que, nessa altura, as coisas podem ser mais tensas e as divergências ficarem mais acentuadas», observa a mesma fonte.
Continuar a negociar à esquerda
Para já, o Governo está empenhado em aprovar o pacote de alterações às leis do trabalho que foi apresentado na semana passada à concertação social, mesmo sabendo que não é certo que o PCP aprove a taxa que penaliza as empresas que abusem dos contratos a prazo em relação à média do seu setor. «Vamos ver. Essa é só uma medida e é uma medida que resulta já das conversas que tivemos à esquerda, que fizeram cair a ideia de mexer nas contribuições para a Segurança Social das empresas», diz o governante.
Antes dessa discussão haverá ainda o debate do Programa de Estabilidade, que será apresentado no dia 24 de abril no Parlamento. É aí que se perceberá se Mário Centeno vai corrigir a trajetória orçamental para metas ainda mais ambiciosas, como tudo leva a crer.
Em qualquer dos casos, a prioridade que o PS dá à descida do défice vai merecer críticas fortes do lado do BE e do PCP, que preferiam sacrificar esse «brilharete» em troca de um aumento no investimento público – nada que seja novo nesta solução de Governo. Bloquistas e comunistas deixarão claras as suas diferenças, mas nunca aceitarão votar o documento se o CDS voltar – como fez no ano passado – a tentar obrigar a que seja sujeito a votação. «Não haverá drama nenhum. Cada um tem as suas posições, mas isso já se sabe», afirma um dirigente do BE.
O regime de benefícios fiscais é outro dossiê que está a ser negociado à esquerda e que é apontado como um exemplo de que há mais medidas a acordar com BE e PCP para lá do que ficou firmado em 2015. As conversas sobre esta matéria estão em fase final de afinação e o Governo espera poder em breve apresentar um documento final consensualizado à esquerda.