O Bloco de Esquerda ficou furioso com o governo pela decisão “unilateral” de alterar as metas do défice negociadas para 2018 no Programa de Estabilidade, onde constará um défice de 0,7% em 2018 em vez do que foi negociado no Orçamento de Estado – 1,1%. O valor de défice apontado para 2019 que deverá constar no Programa de Estabilidade é de 0,2%, segundo avançou o Eco na semana passada.
No texto publicado ontem no “Jornal de Notícias”, Mariana Mortágua deixou um aviso duro ao ministro das Finanças: “Não há governos de minoria absoluta”, escreveu, em título. A deputada insurge-se contra o facto do governo ter decidido “alterar unilateralmente as metas do défice negociadas para o Orçamento do Estado para 2018 e condicionar as negociações para 2019, afastando à partida aumentos salariais na Função Pública”. Segundo Mariana Mortágua, “é um mau prelúdio para as negociações do último Orçamento da legislatura”.
Já na segunda-feira à noite, a líder do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, mostrou o desagrado do partido com a mudança da meta do défice de 2018 para 0,7%, acusando o governo de não estar a cumprir os compromissos acordados com o seu partido. “O Bloco cumpriu sempre os compromissos políticos que negociou com o governo, foi claro sobre a necessidade da recuperação económica ser também recuperação dos serviços públicos. Achamos, por isso, preocupantes os sinais de que o governo quer alterar as metas que negociou connosco e as metas que basearam o nosso voto no Orçamento do Estado para 2018”.
Ontem, fonte do Bloco afirmou que o partido se encontra “à espera de ver o Plano de Estabilidade”, que será aprovado na reunião de Conselho de Ministros amanhã e entregue na sexta-feira na Assembleia da República, para tomar novas posições. Na noite de segunda-feira, Catarina Martins disse que tudo o que Bloco quer “é que os compromissos se mantenham” e afirmaou ser também preocupante que Mário Centeno “anuncie já limitações ao que será o Orçamento do Estado para 2019”, muito antes de “iniciar as negociações com a maioria parlamentar”.
Mariana Mortágua acusa o governo de estar a portar-se com “tiques de uma maioria absoluta” que não tem. Criticando o anúncio de Centeno de que “não haverá aumentos para os trabalhadores do Estado no próximo ano”, Mariana Mortágua escreve: “A Função Pública tem os salários congelados há uma década e não há regresso à normalidade sem atualização salarial. Não é aceitável que as escolhas sobre as prioridades orçamentais do próximo ano sejam objeto de vetos unilaterais antes de qualquer discussão e com os tiques de uma maioria absoluta que não existe”.
Mariana Mortágua vai mais longe e diz mesmo que a estabilidade da geringonça está a ser posta em causa pelo governo: “O governo do PS faz mal em pôr em causa a estabilidade da atual solução parlamentar, a maioria que impôs mudanças importantes no contexto de um governo minoritário. Estamos a um ano e meio das eleições e temos um Orçamento para executar e outro para negociar e votar”.
O alvo da esquerda à esquerda do PS é, mais do que Costa, o ministro das Finanças Mário Centeno, que esta semana publicou um artigo no diário “Público” a defender a máxima ortodoxia orçamental.
Em artigo no “Expresso Diário” ontem, Louçã, fundador do Bloco de Esquerda e seu primeiro líder, não tem contemplações com Mário Centeno, que vê como “um ministro que, quatro meses depois da aprovação do Orçamento, anuncia um programa plurianual em que revê as metas do défice para o ano corrente, que tanta polémica têm causado na maioria parlamentar e que anteriormente foram invocadas como limite para restringir a despesa na saúde (…) está a sobrepor o seu ilustre arbítrio às regras da convergência política e até da gestão razoável”. Louçã também acha que as posições de Centeno não contribuem para a estabilidade da maioria parlamentar: “Que o Natal e o défice sejam quando e o que um ministro quiser não parece nem salutar para o governo nem uma prenda aceitável para quem quer uma solução política de confiança”, afirma.
Na segunda-feira à noite, também Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP, num encontro com artistas e trabalhadores da Cultura, criticou Mário Centeno. “O governo clama pelo sucesso ao nível do défice, porque baixou mais do que o próprio governo perspetivou. Dito assim, parece um sucesso. Uma décima a mais significaria 200 milhões de euros – 25 milhões de euros para a Cultura são zero vírgula qualquer coisa. É uma opção”.
Segundo o secretário-geral do PCP, “é um posicionamento de um governo que aceita as imposições e os constrangimentos da União Europeia e do euro” – “Sucesso, diz o ministro das Finanças. Mas vai ter que explicar aos trabalhadores da administração Pública porque é que afirma que não há dinheiro para aumentos salariais de trabalhadores que estão há sete, nove anos sem quaisquer aumentos, aos homens e mulheres da Cultura, aos utentes do Serviço Nacional de Saúde… O sucesso é não ter resposta para questões estruturais que resolvem os problemas do país?”.