“Do Porto, deslocaram-se à capital centanas de pessoas com a intenção de presenciarem o encontro e que deram uma grande animação à cidade nas primeiras horas da manhã”.
O encontro era o Sporting-FC Porto.
Dia 12 de maio de 1935.
A notícia prosseguia: “No fim e ao cabo venceu quem devia vencer, e o título de campeão é o justo prémio de uma acção árdua e valorosa. O jogo de grande emoção realizou-se no Lumiar, ante uma grande assistência. O FC do Porto, ao entrar em campo, recebe uma enorme ovação do público lisboeta. E alinha: Soares dos Reis; Avelino e Jerónimo; Nova, Álvaro Pereira e Carlos Pereira; Lopes Carneiro, Waldemar Mota, António Santos, Carlos Mesquita e Nunes. Como nota a destacar temos a ausência de Pinga, o conhecido internacional, que não alinha por doença”.
Pinga, o grande Pinga. Artur de Sousa. Madeirense do Funchal.
O FC Porto sagrava-se campeão. O primeiro campeão nacional na estreia da prova tal como a conhecemos hoje. Ou mais ou menos.
Apenas oito equipas na disputa do título. FC Porto em primeiro, como já vimos, 22 pontos em 14 jogos, dez vitórias, dois empates e duas derrotas, 43-19 em golos marcados e sofridos. Dois pontos de avanço sobre o segundo, o Sporting, três sobre o terceiro, o Benfica. Seguiram-se Belenenses, Vitória de Setúbal, União de Lisboa, Académico do Porto e Académica de Coimbra.
Uma semana antes, a selecção nacional conseguira um sensacional empate, frente à Espanha: 3-3.
No Lumiar também houve empate: 2-2. As derrotas portistas foram frente ao Benfica (0-3) e Vitória de Setúbal (0-1). Ambas fora.
Nesse tempo, os jornais escreviam relatos dos jogos. Como se os estivessem a narrar em direto.
Ora vejam: “Pertence a bola de saída ao Porto que desce sem hesitações, dando ocasião que Serrano intervenha com êxito, ainda que para canto. Nunes faz o corner do qual nada resulta”.
Emocionante, não.
Era uma espécie de rádio por escrito.
“Os leões, cheios de energia, jogam na metade portuense. Mourão é o homem do ataque sportinguista – conduz e remata. Da parte do Porto destingue-se António Santos pelo seu remate. Rui, incansável, não pára um momento, porém alguns dos seus passes saem tortos”.
O Sporting alinha assim no jogo do título: Dyson; Jurado e Serrano; Abelhinha, Rui e Faustino; Mourão, Vasco, Soeiro, Ferdinando e Lopes.
Golos. “O público, entusiasmado, grita: Viva o Sporting!”
24 minutos estão decorridos. Soeiro tem um rasgo, dá a bola a Ferdinando que remata de pronto. Soares dos Reis estica-se para a defesa mas a bola vai forte e colocada.
Abelhinha é um rapaz esforçado.
O seu nome diz tudo.
41 minutos: António Santos leva a bola para o meio terreno do Sporting, cede-a a Nunes que dispara para o empate.
Festa entre os portistas.
Serão campeões. Estão convictos disso e fazem os impossíveis para suster as últimas investidas contrárias da primeira parte.
“O empate verificado no fim do primeiro tempo não está em analogia com o domínio exercido sobre o Sporting. O Porto soube aproveitar muito bem a oportunidade que se lhe deparou – e é esse o seu mérito. Na defesa portuense têm brilhado, principalmente, Avelino e Soares dos Reis. Carlos Pereira é o melhor dos médios”.
Ao contrário do que acontecera no início do encontro, a equipa do FC Porto é recebida com certa hostilidade depois do intervalo.
Os adeptos do Sporting percebem que há uma vantagem psicológica grande da parte portista.
“Logo na primeira avançada, António Santos faz um passe ao extremo direito Lopes Carneiro e este, num remate forte e enviezado, marcou o segundo ponto sem dar tempo a Dyson para fazer a defesa”.
Ah! A vitória ali à mão de semear.
“Os portistas ganham tempo, demorando a bola. Estão no seu direito. Nestas emergências toda a táctica é admirável”.
O Sporting ataca, já num estilo meio desesperado, mais coração do que cabeça. Soeiro recebe a bola de Abelhinha e lança-se numa correria impressionante. Passa por dois adversários. Ninguém consegue pará-lo. É impossível domar a sua vontade férrea. Estamos à beirinha do final da partida. O seu golo define o resultado: 2-2.
“Na assistência há cenas de desordem, nas bancadas e nos peões. Entusiasmo. O jogo acaba empatado. E os portuenses saem do campo abraçados uns aos outros”.
Tinham bons motivos para isso. Eram campeões: os primeiros campeões nacionais. Haveria festa até às tantas.
“O Porto mostrou-se um grupo com homogeneidade e que merece o triunfo. Honra lhe seja! A defesa ganhou o encontro”.
Para os rapazes do norte isso pouco importava.