Tomás Taveira: ‘Acho o Siza uma grande arquiteto. O Souto Moura não é um arquiteto’

Não poupa elogios a Siza Vieira, mas não guardou nenhum para Souto Moura

O fim de décadas sem dar uma entrevista, Tomás Taveira aceitou receber o i no seu ateliê na Avenida da República e abrir a sua vida. Falou de tudo, mesmo dos episódios mais polémicos.

Não poupa elogios a Siza Vieira, mas o mesmo não se pode dizer das suas palavras sobre Souto Moura. Taveira descreve-se como um arquiteto barroco e um homem simples, garante que está longe de estar morto, mas reconhece que já nao tem tantos clientes.

Antes as coisas vinham ter consigo…

Antigamente tocava o telefone era um cliente. Há um bocado tocou o telefone e por acaso era um cliente. Mas não tenho muitos clientes. E depois só quero coisas grandes. Já não faço certos trabalhos. Aqui há tempos um tipo importante dizia-me: ‘Você põe-se nessa posição aristocrática’. E eu disse-lhe: ‘Você nunca conheceu Van Gogh, pois não?’. ‘Hã?!’. ‘Pergunto: conheceu Van Gogh?’. ‘Não’. ‘Se o tivesse conhecido ia-lhe pedir para pintar uma retrete?’. O gajo ficou ofendido. Eu sou modesto – esta entrevista é a entrevista de uma pessoa modesta, ou não?

Mas que está muito consciente do que vale…

Mas sou modesto! Não estou aqui a dizer que sou o maior. Mas tenho pena que não haja dez Taveiras. Muita pena, porque eu teria mais trabalho.

E Portugal saía a ganhar?

Não sei, mas acho que sim. Hoje li uma coisa n’A Bola. A propósito de o Braga estar em primeiro lugar e estar toda a gente entusiasmada. Vem lá uma noticiazinha, a dizer ‘o problema é que nós temos um estádio impossível, onde não se pode estar, onde não se pode jogar, muito bonito, mas…’. Chamam àquilo bonito? Se aquilo é bonito a madre Teresa de Calcutá é a miss mundo.

Na altura houve até elogios internacionais. Como explica isso?

Se eu quiser elogios também arranjo. O voleibol e o basquetebol eram desportos sem expressão. Porquê? Porque eram jogados ao ar livre. Um tipo fazia um lançamento e se entrasse era um milagre. O basquetebol transforma-se numa indústria quando fecham os pavilhões. Hoje todos os estádios estão a ser transformados em recintos suscetíveis de serem fechados. Só havia um, Gelsenkirchen. Agora há dez. O arquiteto não está em causa, mas o estádio de Braga é de analfabeto, de um indivíduo que nunca estudou o desporto. O estádio foi inaugurado num Portugal-Suécia. O nosso guarda-redes era o Ricardo. O Ibrahimovic remata à baliza, o Ricardo lança-se e a bola bate-lhe nas costas. Toda a gente notou mas ficou calada. Também ninguém disse que tinha sido frango – porque não tinha sido. Simplesmente veio uma rabanada e a bola desviou. Bateu-lhe nas costas! O pai de um amigo, que foi assistir a esse jogo, fugiu ao intervalo. ‘Porra, ia morrendo, estou aqui com uma pneumonia, um frio louco que eu apanhei’. Aquilo é Braga. Em parte nenhuma do mundo se fazia uma coisa daquelas. Aquilo é de um indivíduo que perdeu a noção do poder que tem.

Não há outras obras do Souto Moura de que goste?

Acho o Siza um grande arquiteto. O Souto Moura não é arquiteto.

 

Leia na íntegra a primeira parte da entrevista na edição impressa do i, já nas bancas. A segunda parte será publicada na edição de segunda-feira.