Um casamento é um contrato que prevê a igualdade de deveres e direitos, mas as declarações do primeiro-ministro permitem antecipar que, muito dificilmente, a esquerda avance para esse patamar nas próximas eleições legislativas, e que um futuro Executivo socialista integre ministros do PCP ou do Bloco do Esquerda.
«O nível de compromisso que atingimos foi este, dá para sermos amigos, não dá para casar. O futuro constrói-se a cada momento, mas, agora, o grau de divergência em matérias essenciais que existe entre todos os partidos é conhecido, é evidente». A frase de António Costa, no início da semana, na TVI, não fez soar os alarmes à esquerda, mas confirmou as suspeitas de que o aprofundamento dos acordos à esquerda, pós-legislativas será um caminho, no mínimo, hercúleo.
O vice-presidente da Assembleia da República e deputado do Bloco de Esquerda, José Manuel Pureza, é cauteloso. « Já se percebeu que o Partido Socialista, cumprindo o acordo que foi celebrado com o Bloco de Esquerda, no essencial, não tem estado minimamente disponível para dar passos que vão no sentido de qualificar os serviços públicos, e passar de um programa de mínimos, de um acordo de mínimos para algo mais ambicioso. O Partido Socialista não tem estado minimamente disponível para isso, para a legislação de trabalho, o Serviço Nacional de Saúde, Escola Pública e por aí vamos».O deputado acrescenta ao SOL que a relação à esquerda não se pode medir por estados de alma. «Não é uma questão de afetos, nem uma questão de simpatia, nem uma questão de amizade e, portanto, do mundo dos estados de alma. O que estamos a discutir, é de facto a possibilidade, de existirem, ou não, resultados a que seja possível chegar, em função da relação de forças entre o Partido Socialista, o Bloco de Esquerda e o PCP». Dito de outra forma, tudo depende da força dos votos – e da vontade política – dos parceiros de esquerda.
Mas a vontade política do PCP parece ser bem diferente do Bloco. No final das jornadas do PCP, o líder parlamentar comunista, João Oliveira, assegurou aos jornalistas que a ideia de integrar um Governo do PS será «muito difícil». Por isso, para o PCP a questão está encerrada.
Entre os socialistas o tema não é pacífico. Há quem defenda que o PS deve aprofundar os acordos à esquerda com ministros do PCP ou do Bloco de Esquerda, mas a versão oficial subscreve a ideia de Costa. Carlos César reconheceu as dificuldades em integrar dirigentes comunistas ou do Bloco num Executivo socialista. «Colocar-se-ia a questão de saber se o PCP poderia ter a pasta da Defesa Nacional ou se o Bloco de Esquerda podia ter o lugar de ministro dos Negócios Estrangeiros. Isso implicava da parte desses partidos um compromisso que não existe neste momento. Mas a vida é assim, todos podem mudar», explicou o líder parlamentar esta semana.