Sente-se ainda no ar o cheiro a festa. Animaram-se os salões, acorreram os interessados, e os convocados compareceram.
Houve circunstância, dispensaram-se as palavras.
Mas reconhecia-se nos participantes o gosto dos grandes dias.
Havia ministros novos.
E, dias depois, voltaram a juntar-se para os secretários de Estado.
A mesmíssima cena, o mesmo gáudio e a consabida ‘spes’.
É o tempo em que os ministros incham.
Uma remodelação não é apenas isto.
Uma remodelação é uma reabilitação.
A moda.
A reabilitação urbana que invade a cidade, reflete-se no Governo.
Um prédio a cair, ou devoluto, ou ferido de morte, ou inútil, ou abandonado é substituído por um novo corpo e uma nova imagem.
Percebe-se.
As coisas nem sempre correram bem em todo lado.
Há ausências desde o primeiro momento, há incompetências manifestas, há escravos do dever, há gente castigada e condenada, há de tudo um pouco. Há escombros.
O mais extraordinário é que a maioria das pessoas vê e o mais responsável por tudo isto finge ignorar.
Um ministro ausente é tímido e contido.
Um ministro incompetente é alguém que não é deste mundo.
Um ministro que deve e promete e adia e engrola é um inocente útil.
Um ministro poeta e diplomata é um extraterrestre.
O primeiro dos ministros é o treinador.
Mantém o que convém pelo tempo conveniente.
Não sofre. Descentraliza o sofrer.
E, num ato de perfeita abnegação, está com eles, fotografa-se com eles, declara a sua confiança.
Faz o que de melhor cabe ao político astuto e hábil e bem sucedido. É o cinismo personificado. O campeão.
Ele sabe, como muitos, que o tempo se esgota e os pobres tristes se afundam.
Mas, concede-lhes mais um tempo, recusa-lhes mais uma demissão, incentiva-os à desgraça mais profunda. Cava-lhes, uns metros abaixo, a sepultura.
Sensibilizados, agradecem e penam.
Até que o grande momento surge.
Ele também sabe que o momento é de ouro.
Agora ou nunca.
E, de um momento para o outro despede-se deles.
A hora exige um comprometimento partidário total.
Vai buscar os mais fiéis, os mais aparatchiks, os mais convenientes, os mais ambiciosos.
Vai buscar aqueles que sempre quiseram ser qualquer coisa e nunca conseguiram. O chefe de gabinete que ambicionava mais, o secretário que queria ser ministro, o troglodita que, nada sabendo de nada, queria ser secretário de Estado energético.
A cada um o seu desejo.
Ao país a sua incompetência.
O objetivo é ter um governo como uma equipa de combate, lançar às malvas os pruridos, ganhar eleições.
O orçamento está feito.
Os ministros importam pouco. Acomodam-se. Servem.
Como, nas palavras de um dos Pessoas, têm o grande objetivo na vida de chegar a horas ao emprego.
É por essas e por outras que aos ministros acontece, com rara velocidade, a mudança de estado.
Tão depressa incham como murcham.
Elementar, meu caro Watson.
Com estes ou outros, ninguém sabe o que nos tiram e todos julgam saber o que nos dão.
O jogo de sombras entre os impostos sobre o rendimento e os impostos indiretos funciona e anestesia.
Só falta que a esta esquerda negociadora aconteça o mesmo que aos ministros: murche.